Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 26 de dezembro de 2010

Rapidinhas

Loteamento da Dilma

     Ficou pronto o loteamento da Dilma. Os lotes foram distribuídos para atender aos apadrinhados, aliados, aos interesses fisiológicos e corporativos. Nenhuma indicação de uma direção nova no governo do Brasil. Nenhuma pista de um rumo novo para a nação, de alguma iniciativa para melhorar a saúde, a educação ou o meio ambiente. Apenas uma festa entre amigos.
     Aqui em Brasília muito se vê e muito se comenta de que esse seria um Ministério de Transição. Nunca vi isso. Um governo assumir prestando contas ao que sai. Geralmente é o contrário. Enquanto isso a choldra comemora o consumo irresponsável, que elevou o país a quarto maior consumidor de automóveis do planeta. O aquecimento global? Coisa de gente chata. Vamos comemorar e consumir galera! Emprego novo, salários triplicados na esplanada e por todos os governos estaduais e municipais do Brasil. Feliz Brasil Novo!

Viva a Palestina

     Depois de Brasil, Uruguai e Bolívia, o Equador reconheceu a independência da Palestina nas suas fronteiras anteriores a 1967. Mais uma vitória para o povo palestino, oprimido por mais de 4 décadas de ocupação israelense-americana, que aos poucos vai tentando criar um fato consumado  com a construção ininterrupta de colônias israelenses nos territórios ocupados, para uma futura anexação ao Estado de Israel.
     Anexação de um país por outro é um termo que não se ouvia mais desde Hitler. Engraçado como a história dá voltas, não é mesmo?  
     Os próximos sul-americanos a reconhecerem a Palestina devem ser Paraguai e Chile, reafirmando a inserção soberana da América Latina na política internacional, abandonando a hegemonia norte-americana no setor. Mérito da integração econômica e política latino-americana que vai deixando para trás séculos de submissão e de dominação econômica para se alçar a território de importantes decisões mundiais.

A lição de Alencar

     É impressionante a capacidade de resistência do nosso atual vice-presidente, José de Alencar. Sua atitude positiva frente à doença que o acomete a tantos anos é a única explicação para sua incrível capacidade de reabilitação, que sempre surpreende os médicos.
     Sem dúvida uma lição para muita gente que vive se queixando de problemas e desiste ao primeiro sinal de dificuldades. Que sua atitude sirva para todos nós, brasileiros, nas nossas vidas, para que saibamos lidar com nossos dissabores e agradecer pelas oportunidades que temos, principalmente a oportunidade de ter uma vida e saber dar valor a ela.

Socialismo Ecológico

     Enrique Leff, um economista mexicano, apresenta, numa entrevista ao site OperaMundi, uma visão lúcida sobre a relação entre a economia e a destruição da natureza.
     Leia abaixo:

    
Histórias de outras vidas (35)

   Araripe

     O lugar? Araruama. O ano? Talvez 1956 ou 57.
     Pra quem não sabe, Araruama é um município no litoral norte do Estado do Rio, cuja sede se situa às margens de uma imensa lagoa salgada, do mesmo nome. Nessa época, a Lagoa de Araruama ainda era cheia de salinas, com seus diques rasos e seus cataventos.
     Passávamos dois ou três meses por ano por lá, nas férias de verão, enquanto meu pai permanecia trabalhando no Rio, indo ao nosso encontro nos finais de semana.
     Nossa casa ficava na saída para São Vicente, em meio a um coqueiral. Os constantes ventos nos livravam de qualquer praga de mosquitos e passávamos dias maravilhosos naquela pequena chácara, de mais ou menos um hectare, onde tínhamos um cavalo e uma charrete, que nos levava aos banhos na lagoa.
     Minha mãe tinha parentes por lá, uns primos, o que nos dava um suporte familiar naqueles dias em que ficávamos longe de meu pai.
     Pois justamente esses parentes é que nos apresentaram Araripe. Ele era engenheiro naval e trabalhava em Niterói, nos estaleiros que já haviam por lá. Os estaleiros fluminenses são muito antigos e tem uma tradição que remonta à época da colônia.
     Naquela época não havia a ponte Rio-Niterói e quem trabalhava do outro lado da baía de Guanabara, precisava morar por lá mesmo. De Niterói a Araruama eram apenas 80 Km, pela antiga rodovia Amaral Peixoto, uma faixa estreita de asfalto precário e esburacado.
     Araripe tinha uma casa de veraneio em Araruama, para onde, suponho, fugia nas suas folgas, já que naquela época Niterói não apresentava grandes atrativos. Mas não era uma casa qualquer.
      Sendo um solteirão, de cabelo cortado à escovinha, como se dizia, típico dos militares, ele se dedicava a inventar coisas, que até hoje me parecem incríveis, e que eram mais incríveis ainda para a época, no atraso em que vivíamos no Brasil.
     Foi com ele que andei pela primeira vez num fusca. Era um daqueles primeiros modelos importados no pós-guerra, com duas janelinhas traseiras. Nos mostrava orgulhoso o engenho alemão com motor traseiro refrigerado a ar: uma novidade.
     Foi nesse modelo antigo dos primeiros volkswagens, que fui visitar sua casa, com minha mãe e uma prima. Me lembro que era uma rua larga, de areia, como quase todas na cidade, e que ficava ao final, à direita. Paramos em frente a um galpão, que mais parecia um depósito. Ao entrarmos: surpresa! Não havia nada. Apenas um chão liso e vazio com um banheiro e uma cozinha. 
     Araripe então apontou para o teto, onde pudemos observar muitas coisas estranhas. Estruturas metálicas e engrenagens, junto com alguns painéis de madeira. Depois foi para uma parede, onde havia uma espécie de painel de controle e começou a apertar alguns botões.
     De início acionou os painéis de madeira, que para surpresa minha foram descendo e se inclinando até se tornarem as paredes internas da casa. Em minutos, o galpão vazio, tinha sala e quartos. Depois, acionando outros botões, começaram a brotar os móveis das paredes, camas e mesas com cadeiras, se desdobravam, como por encanto, e em minutos a casa estava mobiliada.
     Claro que os móveis eram todos presos entre si e não se podia arrastá-los.
     Araripe ria do nosso espanto. Depois acionou novamente os botões e os móveis se recolheram para dentro das paredes e as paredes subiram novamente, deixando o espaço vazio de antes.
     Parecia coisa de filme americano.
     Algum tempo depois ele resolveu fazer um carro. Desmontou um velho ford 1929 e remontou-o, com muitas partes novas fabricadas por ele mesmo, dando origem a uma especie de jipe, muito simpático. Mas aí teve um problema: na hora do emplacamento a prefeitura exigiu que ele declarasse a marca do veículo. Como ele mesmo era seu criador, inventou uma marca que não foi aceita. Então os técnicos do departamento de trânsito local, fazendo uma inspeção detalhada no veículo, concluíram que a maioria das peças era fabricada pela Ford, e que por isto, esta marca prevalecia. O jipinho foi registrado como um Ford e foi exigido que ele fosse identificado como tal. Não se conformando com essa decisão, Araripe inverteu as letras na dianteira e batizou o seu carrinho de DORF, com o qual circulava alegremente pela cidade.
     Em 1960, nos mudamos para Brasília e nunca mais soube dele, mas até hoje me lembro da sua capacidade inventiva e tecnológica, tão pouco estimulada no Brasil.
     Quamtos talentos como ele não se perderam e ainda se perdem por aí, num país ainda submetido a interesses estrangeiros, que não querem nossa emancipação tecnológica?
     Até hoje não temos uma marca nacional de automóveis. A única que tivemos, a Gurgel, fechou em 1986 e já fabricava carros elétricos que agora são apresentados como novidade por aqui.
     Quando teremos uma verdadeira política industrial que incentive a inovação e estimule a criação de marcas nacionais, ao invés de montar, sob licença, produtos desenvolvidos no exterior? Até lá, quantos Araripes viverão no anonimato por aí, brincando de fazer suas invenções em casa?

Boa segunda-feira à todos

Ricardo Stumpf Alves de Souza

    

domingo, 19 de dezembro de 2010

Rapidinhas


Presentimentos

     Não adianta. Já tentei ser otimista, falar de coisas boas, acreditar que o mundo vai melhorar, mas não consigo me livrar de um pressentimento ruim sobre 2011. Também já pensei muito sobre isso, tentando entender o porquê. Não se trata de nada pessoal nem familiar, é sobre o mundo mesmo e sobre o Brasil também.
     Será que só eu estou vendo que os governantes estão agindo de forma descoordenada de qualquer ideal, agindo em função de interesses imediatistas e mesquinhos? Vejam o governo Dilma, com todo respeito, mas dá a impressão de que esse ministério que está sendo formado exclusivamente sobre acordos políticos que não levam em conta o interesse da nação, mas apenas interesses particulares. Vejam os Estados Unidos, onde Obama mantém uma política externa contrária a tudo que prometeu, à serviço dos interesses das suas multinacionais enquanto a oposição se comporta irresponsavelmente, na base do quanto pior melhor. E a Europa? Governos conservadores destróem a economia, com suas políticas neoliberais e depois quem paga a conta são os trabalhadores, com cortes dos programas sociais. Na Itália um fanfarrão consegue se manter no poder corrompendo o parlamento, na Suécia um governo de direita, à serviço dos Estados Unidos, tenta calar o fundador do Wikileaks, contrariando os princípios da liberdade de expresão.
      Na Coréia do Sul, não cessam as manobras militares provocativas, determinadas por Hillary Clinton, outra irresponsável. Israel faz o que quer e se prepara para atacar o Irã, que corre para fazer sua bomba atômica enquanto apedreja mulheres.
     Não sei não, mas houve época em que haviam ideais. Hoje parece que a pequenez tomou conta dos governantes. Disso tudo não pode sair coisa boa.

Relatório macabro

     E por falar em irresponsabilidade, desde 1999, quando a OTAN interviu na ex-Iugoslávia para acabar com a tentativa de Milosevic de impedir que a província de Kosovo se separasse do país, já existiam muitas denúncias de que os combatentes kosovares eram criminosos, encobertos pelas forças do ocidente para ajudar a dividir o último país socialista da Europa.
     Milosevic foi levado a julgamento numa corte internacional e morreu misteriosamente na prisão (seu filho denuncia que foi assassinado) enquanto em abril de 2007, um ex-presidente finlandês, Marti Ahtisaari, enviado especial do Secretário Geral das Nações Unidas, com apoio de George W. Bush, aceitou irresponsavelmente a independência de Kosovo, reconhecida por pouquíssimos países, para jogar uma pá de cal sobre um povo que soube resisitir sozinho ao nazismo na segunda guerra mundial e foi o único que derrotou as tropas alemães sem a ajuda de ninguém.
     Agora, 10 anos depois, quando as primeiras eleições do novo "país" acontecem, surge o relatório da União Européia, do ex-magistrado suíço e atual parlamentar do Conselho da Europa Dick Marty, apontando o vencedor das eleições e líder dos kosovares, Hashim Thaci, como um criminoso que "engordava" prisioneiros em campos de concentração clandestinos, para depois assassiná-los e vender seus órgãos. Tudo isso sob o olhar complacente das forças da OTAN.
     O relatório está no site do jornal espanhol El País para quem quiser ler. Vejam abaixo:
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/elpais/2010/12/17/relatorio-macabro-detalha-trafico-de-orgaos-em-kosovo.jhtm

Orfandade

     Enquanto isso na aldeia, mais irresponsabilidade.
     O prefeito Márcio Farias, de Rio de Contas, ganhava R$12.000, descobriram agora (mais do que o presidente Lula), para administrar um município de 13.000 habitantes.
     Ele apoiou Geddel Vieira nas últimas eleições, que além de não ser eleito, perdeu qualquer poder político e levou o PMDB estadual a uma situação de quase desaparecimento.
     Agora Márcio está órfão politicamente, sem trânsito junto aos governos estadual e federal. Seu principal assessor político, João Souto, é sobrinho de Paulo Souto, ex-governador da Bahia, ligado ao grupo de Antonio Carlos Magalhães, o falecido oligarca que governou a Bahia com mão de ferro por décadas.
     Ambos, órfãos politicamente, tentam se manter no poder usando métodos arcaicos de perseguição e intimidação contra os adversários. Não aprenderam a lição de Lula de abraçar os desafetos e trazê-los para o seu lado. O resultado é um aumento dos ressentimentos, tanto da oposição que cresce cada vez mais, quanto do próprio governo que se sente perdido e não sabe como agir, a não ser perseguindo mais e mais a população, que já dá mostras de revolta e indignação.
     E dizer que este governo se iniciou sob o signo da esperança na renovação.

Histórias de outras vidas (34)

Duendes na estrada


     Pois é, amigos leitores, agora que vamos chegando no Natal, de repente me deu uma saudade enorme do meu pai, falecido em 2007.
     Foi no primeiro aniversário de Cecília, minha neta mais jovem, que me dei conta de como ele gostaria de te-la conhecido.
     É interessante como as pessoas nos fazem falta. Nunca fomos muito amigos, tivemos sempre muitas diferenças, mas após a sua morte, parece que todas elas desapareceram e só me lembro das coisas boas, dos bons momentos que vivemos juntos.
     Meu pai era um viajante por natureza. Desde que nos mudamos para Brasília, em setembro de 1960, não paramos mais de viajar, quase sempre de carro. Rodamos o Brasil todo e ele, junto com minha mãe, chegaram a se aventurar pela América do Sul, indo à Argentina (eu fui junto) em 1964, num Aero-willys, indo ao Paraguai de Fusca, em 1969 e indo ao Chile me visitar, quando eu morava lá, em 1973, num Opala 1969.
     Algumas dessas viagens pelo Brasil foram memoráveis, como a viagem à Bahia, em 1963, quando inauguraram a Rio-Bahia, ou a Belém do Pará, em 1966. num outro Fusca, fazendo 2.200 Km por uma Belém-Brasília ainda de terra. Nessas duas fomos, eu, ele e meu irmão.
     Mas além dessas epopéias pelo Brasil, ele fazia sempre uma pequena viagem para Corumbá de Goiás, onde tinha um loteamento. Acho que herdei sua tendência a mexer com terras, pois parece que elas correm para minha mão, mesmo que eu não queira.
     Corumbá é uma cidade histórica de Goiás,  tombada pelo Iphan, e que na época se resumia ao centro histórico. Hoje está cercada por bairros que não tem nada a ver com a arquitetura colonial formando uma outra cidade, estranha, feia e descaracterizada.
     Mas na década de 1960 ele ia muito à Corumbá, por uma estrada de terra que entrava em Alexânia, passava em Olhos D'água, um pequeno povoado que ainda não havia sido descoberto pelos hippies e onde velhas senhoras papudas (de bócio, uma doença causada pela falta de sal) nos olhavam pelas janelas. Depois seguíamos pela beira de riachos e matas lindas, onde às vezes parávamos para beber água e apreciar a paisagem.
     Nem minha mãe, nem meu irmão gostavam de ir com ele, então eu era o seu companheiro naquelas viagens de fim de semana.
     Seu carro na época era uma Kombi, daquelas que tinham uma janelinha pequena atrás, cinza e branca, com um enorme escudo da Volkswagen na frente. Tinha vidro duplo, o do motorista e o do passageiro.
     Não havia cinto de segurança e eu viajava na frente com ele, pelo meio daquelas estradinhas deliciosas.
     Mas foi no aniversário de minha neta que me veio à mente, não sei porque, uma imagem curiosa de uma daquelas viagens.
     No meio de uma pequena serra, entre árvores muito altas, de manhã cedo, quando íamos para Corumbá, duas pequenas figuras atravessaram correndo na nossa frente. Era um casal de velhos, talvez com 60 ou 70 anos, medindo no máximo 1,50m, que atravessaram com uma agilidade incomum para a idade que aparentavam. Não olharam para nós, nem nos saudaram, como era costume naquelas bandas, mas se meteram pra dentro de uns matos na beira da estrada, como se tivessem sido surpreendidos e não quisessem ser vistos.
     Meu pai viu aquilo e disse:
     _Que tipos estranhos!
     Eu, na ingenuidade dos meus 10 ou 11 anos, não entendi e perguntei porque ele os achara estranhos, já que todo povo daquela região sempre me parecia muito estranho. Sim, vocês não tem idéia do êrmo que era Goiás ao ser construída a nova capital no Planalto Central, e quanta gente vivia isolada por ali.
     Mas ele me respondeu uma coisa que me surpreendeu e que eu nunca esqueci:
     _Parecem duendes.
     Bem, eu não tinha a menor idéia do que fossem duendes e ele não quis mais falar no assunto, já que era agnóstico e não gostava de nada que tivesse a ver com religião ou superstições.
     Anos depois tentei falar com ele sobre o assunto mas ele desconversou.
     Hoje não sei se tivemos a oportunidade de ver duendes de verdade, numa região que ainda estava intocada pelo "progresso", ou se eram apenas pessoas baixinhas e arredias, que viviam isoladas e não gostavam do contato com aqueles forasteiros que começavam a se aventurar pelos seus domínios.
     Nunca saberei, mas naquele dia pude sentir um pouco da magia que existe nas matas e que inspiraram tantas histórias fantásticas no interior desse Brasil imenso.
     Foi muito bom me lembrar dele e desta história no primeiro aniversário de minha neta. Talvez um recado de que a presença dele não depende de um corpo físico e que juntos vivemos coisas que durarão para sempre na memória. Talvez também um recado de que o amor dos nossos próximos é o que dá sentido às nossas vidas e de que há coisas que a razão não explica.
     Boa segunda-feira e feliz Natal à todos.

     Ricardo Stumpf Alves de Souza

    

domingo, 12 de dezembro de 2010


Rapidinhas

Aldeia News

     Gente, que confusão está o governo de Rio de Contas.
     Além da inapetência do Prefeito para governar, o apetite pelo poder de algum de seus assessores criou uma tremenda confusão na eleição para a Presidência da Câmara de Vereadores que provocou um racha na já frágil coalizão do governo local. Como resultado, nosso Prefeito "poste" perdeu a maioria na casa e o pouco de apoio que ainda tinha na comunidade.
     Enquanto isso a cidade está suja, esburacada e, como sempre, segue sem propostas para seu futuro.
     O tal Plano Diretor Participativo caminha celeremente para a gaveta, lugar de todos os documentos do gênero elaborados por governos anti-democráticos, que vivem de perseguir opositores.
     Uma tristeza.


Viva Cecília

     Neste sábado tive a alegria de festejar o primeiro aniversário de minha neta Cecília, que cresce linda e saudável sob o olhar atento de sua mãe Micaele.
     Obrigado a todos os que compareceram ao seu aniversário e a todos os amigos que nos apoiaram neste primeiro ano difícil.
     A festa foi também uma despedida de Micaele de Rio de Contas, já que ano que vem vai para Vitória da Conquista cursar o último ano do ensino médio e se preparar para o vestibular de medicina.
     Que Deus abençoe as duas e abra seus caminhos nessa terra.




Uma revolução começou

Ainda sobre o Wikileaks, vale a pena ler o artigo de Heether Brooke, publicado originalmente no jornal inglês The Guardian e reproduzido pelo site OperaMundi.


"Muito da revolta governamental sobre os vazamentos não tem a ver com o conteúdo do que é revelado, mas com a audácia de quem rompe o que eram fortalezas invioláveis da autoridade. No passado, confiávamos nas autoridades. Se um governante nos dissesse que algo poderia prejudicar a segurança nacional, tomávamos a afirmação como verdade. Agora,os dados crus por trás desta crença estão se tornando públicos. O que percebemos de vazamentos sobre as despesas de parlamentares, ou a cumplicidade de governos com a tortura, é que quando os políticos falam sobre uma ameaça à “segurança nacional”, referem-se frequentemente à defesa de sua própria posição ameaçada."
 
Leia o artigo completo em: http://operamundi.uol.com.br/

Não deixem também de assistir ao vídeo com uma entrevista com Julian Assange, com legendas em português, no Blog do Gustavo, que está logo aqui ao lado.
Histórias de outras vidas (33)

O DESPERTADOR NO FORNO




     O ano? Entre 1977 e 1979.
     O lugar? Porto Alegre.
     Esse tempo fez parte de oito anos do meu primeiro casamento, com seus altos e baixos como em qualquer casamento, embora até hoje eu não ache que tenha vivido uma situação muito comum.
     Minha companheira era uma pessoa especialmente diferente, não porque tivesse qualidades ou defeitos excepcionais, mas porque tinha uma visão do mundo única e desconcertante.
     Para mim, um jovem de classe média, atormentado por uma família conservadora e arrivista, o casamento foi uma espécie de fuga para minha própria vida, mas o que eu não esperava era encontrar nessa convivência outros tipos de pressão que mudaram completamente minha maneira de ver o mundo, para o bem e para o mal.
    Invertendo minha expectativa de ajudá-la a superar uma situação de pobreza, ela me revelou um mundo de inteligência e perspicácia que nada tinha a ver com ter ou não dinheiro. Pelo contrário, me mostrou como minha formação me impedia de ver as coisas, me bitolava e me deixava preso a pressupostos.
     Nossos primeiros dois anos foram muito conturbados. Moramos um ano na Bélgica, depois fomos para Porto Alegre, onde ela perdeu um filho, enquanto eu penava em empregos sem futuro. Depois passei no vestibular da Federal para arquitetura, o que era considerado um luxo para a época, pois só os filhos das famílias mais ricas entravam na arquitetura da UFRGS.
     Em 1977 recebi um adiantamento de herança de meu pai e comprei um apartamento num conjunto habitacional, onde vivemos até bem. Éramos jovens e bonitos e tínhamos uma vida pela frente.
     Mas sua percepção das coisas era muito ligada ao subjetivo, bem diferente da formação objetiva que eu recebera, como jovem de classe média preparado para conquistar meu lugar na sociedade, embora já me alinhasse com as idéias de esquerda que rejeitavam aquele mundo
     Ao contrário, ela via o mundo sob outra ótica, separava as pessoas em legais e não legais. Tinha muito da visão hippie da década de 70, das comunidades onde vivera e olhava minhas aspirações profissionais com uma certa condescendência, como se eu não estivesse ainda pronto para entender o mundo e gastasse minhas energias com coisas inúteis.
     Nossas diferenças nos levaram a episódios violentos, onde eu a atormentava com minha insistência para que encontrasse um caminho profissional e abandonasse aquela descrença em tudo e, por outro lado, ela me pressionava para que eu abandonasse uma militância política que considerava coisa de burguês, o que para mim era de uma contradição incompreensível.
     Com o tempo, conseguimos convencer um ao outro. Realmente observei que a política estudantil era apenas uma espécie de laboratório onde as elites treinavam para exercer seu domínio sobre a sociedade (e vejo hoje que José Serra e José Dirceu são a prova cabal disso), embora isso não tirasse a importância do movimento estudantil em plena ditadura.
     Por outro lado, ela encontrou seu caminho profissional na informática, então nascente, onde conseguiu alcançar uma ótima posição, graças a seus próprios esforços.
     Foi, portanto, uma época de crescimento para ambos e um período que teria sido feliz, não fosse a perda de três filhos prematuros, paridos sempre aos seis meses e meio. Fosse hoje, com o avanço da medicina, talvez algum tivesse sobrevivido.
     Assim, vivíamos entre crises de crescimento e de puro sofrimento. Mas minha companheira tinha também outras características. Era mandona e não admitia ser contrariada, o que gerava grandes conflitos entre nós.
      Havia domingos em que não saía da cama. Resolvia ficar deitada o dia inteiro e me torturava pedindo coisas, exigindo mimos e não recebia ninguém. Aliás, não fazia a menor questão de esconder quando não gostava de uma pessoa. Às vezes, com visitas em casa, simplesmente ia se deitar e ficava me gritando que fosse dormir também, para mandar as visitas embora. Um vexame!
     Mas o pior era na hora de dormir. Eu não podia me mexer, porque senão ela se irritava e começava a reclamar. Tinha que ficar duro, o que não me deixava relaxar e aí quem não conseguia dormir era eu. Eram noites de tortura. Sexualmente até que nos dávamos bem, embora ela nunca tenha sido muito carinhosa, mas o problema era o sono. Não tolerava nenhum barulho.
     Houve uma vizinha no andar de cima que andava de salto alto durante à noite e ela transformou aquilo numa guerra. Me instava a ir lá e tomar satisfações, mas não queria ir porque senão ia acabar batendo nela e parando na polícia. A vida no simpático apartamento virou um inferno.
     Tinha mania de acordar muito cedo. Se entrava no trabalho às sete da manhã, gostava de chegar às seis e meia, para poder se arrumar. Assim, fazia questão de silêncio absoluto na hora de dormir, sempre alegando que tinha que acordar cedo porque era muito trabalhadora, batalhava sua vida e ajudava sua família, ao contrário de mim, que era um burguês.
     Muito bonito, mas eu não conseguia mais dormir e tinha minha própria sobrecarga de horários entre a faculdade e o trabalho. Misture isso com a dor da perda dos filhos e o desgaste em hospitais e médicos e tudo foi ficando muito estressante.
     Mas houve um episódio emblemático, uma espécie de gota d’água, que fez com que toda a situação saísse do controle. Era um grande despertador vermelho, que havíamos comprado na Bélgica e que quando fomos viver juntos era nosso único bem, por isso gostávamos dele, apesar de barulhento.
     Numa noite daquelas em que a cama virou um campo de batalha, ela se levantou irritada com o tic-tac do relógio, que não a deixava dormir. Colocou-o no quarto ao lado e voltou para a cama. Passados alguns minutos levantou-se novamente irritada, dizendo que ainda estava ouvindo e colocou-o na sala. Mais algum tempo e levantou de novo, cada vez mais irritada, porque ainda não conseguia dormir e colocou o relógio dentro do forno, na cozinha. Passados alguns minutos levantou-se novamente desesperada: ainda estou ouvindo, dizia.
     Enrolou então o relógio numa toalha e colocou-o novamente no forno, numa cozinha que ficava pelo menos a dez metros do nosso quarto.
     Ela conseguiu dormir aquela noite. Eu é que não consegui mais dormir ao lado dela e comecei a sonhar em ter minha vida de volta.

     Boa segunda-feira a todos.

     Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 5 de dezembro de 2010

Rapidinhas

              Festival de oportunismos

     Está de dar nojo a disputa por cargos no ministério Dilma, pelo que publicam os jornais.
     Políticos e partidos não tem o menor escrúpulo em reivindicar fatias do governo, argumentando que tem maior verbas, que vão movimentar não sei quantos bilhões de reais, que tem não sei quantos cargos bem remunerados disponíveis.
     E o Brasil gente? Alguém se lembra do Brasil? Alguém se lembra do interesse público?
     Depois ainda tem coragem de falar que são "republicanos". Uma ova! Oportunistas isto sim. Ainda tem alguns que advogam em causa própria, querendo permanecer no cargo, como o do esportes, Orlando Silva, abertamente de olho nos contratos milionários da copa. Coisa boa não pode ser. Outros promovem até campanha como o da Cultura, que está estimulando o movimento Fica Juca e arranjou uma rede nacional dia 02 de dezembro, pra dizer o que tinha feito no cargo. Pode? Outros são da cota de fulano ou da cota de siclano. Que história é essa de cota? 
     Que eu saiba os ministros tem de ser de confiança da Presidente que nós elegemos e não de quem os indica. Ainda tem o Lula, querendo indicar ministros para ficarem no cargo. O que ele quer, continuar governando?
     Nelson Jobim acaba de ser desmascarado pelo site Wikileaks, como um direittista safado, que sempre advogou à serviço dos interesses americanos por baixo do pano, contrariando a política externa do governo Lula. Vai ficar?
     E Fernando Haddad? Um burocrata que foi para o Ministério com Tarso Genro, quando este substituiu Cristóvão Buarque, demitido por telelefone, vocês lembram? Cristóvão era um idealista confuso, cheio de discursos bonitos que não sabia viabilizar nada, é verdade. Mas Tarso não tinha a menor vocação para a educação e saiu logo, deixando Haddad no seu lugar, para simplesmente ir tocando os programas, sem nenhuma idéia própria a respeito de como melhorar a educação brasileira, que continua a mesma merda de sempre.
     O INEP deveria passar a se chamar INEPcia, pela sua incapacidade de diagnosticar os problemas educacionais e indicar soluções, enquanto o MEC continua um elefante branco, com 200 mil funcionários, incapaz de atingir seus objetivos.
     De duas uma, ou Dilma vai se submeter a esta gente toda para daqui um tempo emplacar seu próprio ministério ou seu governo se arrisca a se desmoralizar desde o início, virando uma casa da mãe Joana, onde todo mundo manda, menos ela. A não ser que ela nos surpreenda desde já, com uma virada de mesa.

Viva Assange

     Gente, esse Julian Assange é mesmo um homem de coragem. Desmascarar os Estados Unidos desse jeito, divulgando seus documentos secretos no Wikileaks e viver se escondendo pelo mundo, não é fácil não. O mais triste de tudo que ele revelou é a submissão da justiça, dos países aliados dos americanos aos seus interesses, engavetando processos contra americanos em todo o mundo e agora forjando uma ordem de prisão por estupro contra ele, para persegui-lo. Esta é a democracia ocidental? Que horror! Pára esse mundo que eu quero descer!

Necrologia à cabo

     Pois é, pessoal. É impressionante a quantidade de cadáveres e assassinatos nos canais americanos de filmes da TV por assinatura. A SKY oferece uma verdadeira carnificina diariamente para deleite dos seus assinantes, com detalhes mórbidos de todos os tipos, como os da série CSI, onde cadáveres em putrefação são abundantes.
     Parece que aquele país realmente está doente.
     Eles só conseguem pensar em morte e só a a perspectiva da morte os excita e diverte. O Canal Brasil, na mesma SKY, só com filmes brasileiros, é uma espécie de oásis, um outro mundo onde a vida normal se desenvolve. Outro melhorzinho é o Telecine Cult, com filmes antigos, a maioria americanos mesmo. Como eles eram melhores!
     Não é saudosismo não, é real. Parece que eles estão se afundando numa espiral de violência, que os move como nação nas suas guerras pelo mundo. Não é à tôa que soldados americanos são julgados pelas barbaridades que cometem, atirando em cidadãos dos países infelizes ocupados por eles, só por diversão, ou torturando pessoas pelo mundo afora.
     Se a arte antecipa a vida, não sei o que nos aguarda, mas a queda do império americano ainda trará muitas desgraças ao mundo.

Sete Ilhas

     Depois de mais de 15 anos passando por Correntina, na Bahia, finalmente parei para conhecer as 7 Ilhas, formadas pelo Rio Correntina, que corre rápido e caudaloso, formando corredeiras incríveis. Em seus remansos se pode tomar banho e curtir a mata nativa.. É muito bonito. Um exemplo do que um município pequeno pode fazer para desenvolver o turismo preservando a natureza. 
Não deixem de conhecer.

    
Manifesto daltônico

     Pois é, queridos amigos, estou cansado de ouvir falar em inclusão e de continuar sendo discriminado por ser daltônico. Somos 10% da população mundial, mas ninguém se lembra de nós na hora de definir as cores de sinais de trânsito, botões de aparelhos e outras pequenas sinalizações que fazem a diferença no cotidiano de cada um.
     Estou cansado de chegar no exame de trânsito, de cinco em cinco anos, com medo de ser descoberto, como se fosse um criminoso. Tudo seria tão simples se os sinais de trânsito fossem azuis e amarelos ao invés de verdes e vermelhos. Porque a insistência nessas cores, justamente as que os daltônicos confundem?
     Vou pagar uma conta com cartão no supermercado e a caixa me avisa:
     _Aperte o botão verde.
     Que saco! Tenho que perguntar qual é o verde.
     Antes fazia isso envergonhado, como a esconder uma deficiência, hoje aviso logo:
     _Sou daltônico. Me mostre qual é o botão.
     Peço para usar o telefone celular de um amigo e ele me avisa:
      _Aperte o botão verde para falar.
     De novo tenho que perguntar.
     Estou cansado desta humilhação. Existe sinalização pra cegos, pra surdos, e todo tipo de preocupação em incluir deficientes físicos, mas nada para nós, que continuamos na "clandestinidade".
     Por isso queria convocar os outros 700 milhões de daltônicos do mundo a uma rebelião, se não para tomar o poder, porque seria muito difícil nos organizarmos num partido internacional (que não poderia ter uma bandeira vermelha daquelas revolucionárias), mas pelo menos para lutar para que parem de usar o verde e o vermelho como cores para sinalizar tudo. Que droga!
     Creio que nossa primeira ação armada deveria ser tomar o Detran, que é nosso principal inimigo. Chega de ter medo do Detran e dos seus exames de bolinhas para descobrir nosso daltonismo. Isso não nos impede de sermos excelentes motoristas, é apenas um estratagema montado para nos humilhar.
     Todos os motoristas daltônicos sabem que o vermelho fica em cima e o verde embaixo do sinal de trânsito. Agora inventaram de botar sinais deitados só para nos confundir. Tivemos que aprender a fazer ligações políticas na hora de dirigir: o vermelho está sempre à esquerda e o verde à direita. Que coisa mais cansativa!
     Queremos sinais de outras cores senhores donos do mundo. Não aceitamos mais sinalizações que não sejam claramente identificadas por nós.
     E eu que sou arquiteto? Quantas piadas. parece que eles pensam que a gente não vê cores e não é capaz de identificar a beleza do mundo.  Nós vemos cores sim senhor, apenas as vemos diferentes da maioria. Quem sabe nosso mundo não é mais bonito? Aprendi a lidar com cores nos meus projetos trabalhando com cores primárias, inclusive o vermelho, que eu vejo do meu jeito (não sei qual é o seu vermelho leitor), mas posso garantir que ele (o vermelho que eu vejo) é muito bonito. Apenas custo a achá-lo no meio do verde.
      _Está vendo aquela flor vermelha ali no meio do gramado?
      _Onde?
     É claro que existem graus de daltonismo, mas isso não impede ninguém de ser feliz e de achar o mundo bonito.
     O pior são as piadinhas, quando revelamos a nossa condição:
     _Que cor é a minha camisa? começam logo.
     Apontam para uma coisa qualquer amarela e lá vem:
     _Que cor você está vendo aquilo?
     Porre! Temos de explicar que só confundimos verde e vermelho e semitons.
     Pois é isso. Vamos sair das nossas tocas e acabar com essa injustiça.
     Queremos inclusão já!

     Boa segunda-feira a todos

     Ricardo Stumpf Alves de Souza



domingo, 28 de novembro de 2010

Rapidinhas

Hillary, a guerreira

     A política externa dos Estados Unidos continua nas mãos irresponsáveis de Hillary Clinton, que usa e abusa do seu poder para criar tensões pelo mundo afora, na tentativa de preservar a hegemonia do decadente império americano.
     Ao contrário da nova era de paz prometida por Obama, Clinton parece querer desautorizá-lo, mostrando que ela sim é que deveria estar governando, na medida em que se mostra "dura" contra os adversários.
     Na Coréia vem tentando reacender a guerra desde o afundamento de um barco sul-coreano, num incidente mal explicado. Agora a própria Coréia do Sul admite que iniciou os bombardeios, mas isso não sai em nenhum jornal da imprensa golpista, que insiste na versão americana de que a Coréia do Norte é que começou.
     Veja o que disse a agência inglesa Reuters, reproduzida pelo site Operamundi:

     Na terça-feira um militar sul-coreano reconheceu que a Coreia do Sul estava realizando exercícios militares e testes balísticos na ilha de Yeonpyeong antes do bombardeio da Coreia do Norte. “Estávamos realizando regularmente exercícios militares, mas nossos tiros foram direcionadas para o oeste, nao para o norte", afirmou um oficial militar sul-coreano ao escritório da agência de notícias britânica Reuters em Seul

     A Coréia do Norte não é flor que se cheire, mas quem está provocando é o sul, que não pára de fazer exercícios militares conjuntos com os Estados Unidos em águas disputadas pelos dois países.
     A indústria armamentista americana agradece.

Viva o Rio

     E por falar em guerra, a barra pesou no Rio de Janeiro, mas o governador Sergio Cabral parece mesmo decidido a retomar os territórios dominados a décadas pelos traficantes. A ocupação da Vila Cruzeiro foi emblemática, já que lá estava o principal reduto dos bandidos, junto com o Complexo do Alemão. Foi na Vila Cruzeiro que o jornalista Tim Lopes foi torturado e assassinado. A tomada desse território é uma vitória importante sobre o tráfico.
     O Brasil inteiro está apoiando a ofensiva militar no Rio para libertar a cidade dos traficantes. Os jornalistas da Globo então, estão tendo orgasmos ao vivo ao ver as tropas nas ruas. Saudades de 64?
     Só espero que esses traficantes expulsos não se espalhem pelo Brasil.

Casseta e Planeta: o fim

     Finalmente depois de 18 anos estamos livres do besteirol fascista da Globo.
     O programa cômico, que se notabilizou por suas piadas racistas e machistas que representavam todos os preconceitos da classe média carioca contra pobres, negros, gays e mulheres, havia se transformado numa espécie de "chapa branca" da emissora, com a velha formulinha de satirizar as novelas.
                                                                     Já vai tarde.
                                                                                                                                      
Prêmio Jabuti

     Outro que está cada vez menor é o Prêmio Jabuti de literatura. Premiar Chico Buarque é um tapa na cara de tantos autores nacionais muito melhores. Na verdade a premiação se tornou uma jogada de marketing das editoras, que usam gente famosa para alavancar suas vendas.
     Enquanto isso, a verdadeira inquietação literária vibra na internet e nas editoras alternativas.


Cidades sustentáveis V
(final)

A educação rural e o futuro das cidades

     Quando falamos de áreas urbanas, pensamos logo em metrópoles ou em cidades médias.
     As pequenas cidades ou as sedes dos distritos dos nossos municípios, no nosso imaginário não fazem parte do que chamamos cidades, mas do interior.
     Morar no interior pode ser sinônimo de romantismo ou de atraso, sinônimo de volta ao campo, recuperação do sentido perdido da natureza, das relações pessoais destruídas pela pressa das grandes cidades, mas também sinônimo de desemprego, baixa renda, dependência de pequenos poderes, do prefeito, do padre, do juiz, etc.
     Quando propomos para o futuro a diluição da ocupação da população sobre nosso território, com a pulverização das nossas grandes e orgulhosas cidades em pequenas comunidades sustentáveis, não estamos pensando em nenhuma volta ao campo, em nenhum romantismo, em nenhuma utopia regressiva, mas em avanços significativos, com resultados diretos na nossa qualidade de vida e no desenvolvimento das nossas potencialidades hunanas.
     Mas como construir essas comunidades diferenciadas a partir do que temos hoje, se todo o desenvolvimento industrial atrai os jovens para as grandes cidades, se toda infraestrutura necessária para se desenvolver está lá e se o agronegócio expulsa cada vez mais gente do interior?
     A mudança deve começar pela educação rural.
     Quando trabalhei no Programa de Apoio ao Dirigente Municipal de Educação, PRADIME, do MEC, fui encarregado de fazer um levantamento da infraestrutura das escolas em todo o Brasil, a partir de dados do INEP e fiquei surpreso com a precariedade das escolas rurais e a falta de programas nessa área.

     Os resultados da educação rural são sempre muito piores do que das escolas urbanas, em todo o país. Regiões com maior população rural, como o norte e o nordeste, tem indicadores piores na educação, justamente como reflexo da grande incidência de escolas rurais, o que gera conclusões equivocadas, dentre elas a de que a educação no nordeste é pior. Não é. A educação rural é pior e não há propostas para melhorá-la.
   
     Na verdade não há proposta nenhuma para melhorar a educação como um todo, o que existem são discursos, que falam em educação de qualidade, gestão disso e daquilo, mas nada muda e tudo fica na mesma, porque o sistema todo está errado. É a municipalização (e estadualização) que está errada. O sistema tinha que ser federalizado e a autonomia deveria ser das escolas (dirigidas pelas comunidades escolares) e não dos municípios ou dos estados.
     No interior, não há interesse em educar o povo. O município é um ente fraco e pobre, depende de verbas federais e não tem competencia para gerir, muito menos para propor.
     Uma das poucas propostas que surgiram nos últimos tempos, para a área rural é a das Escolas Família-Agrícolas (EFAs). Surgidas na França, em 1935, as EFAs se caracterizam pela Pedagogia da Alternância, que significa o ensino-aprendizado em espaços diferenciados e alternados.
     O Aluno alterna um período junto à família, onde observa as práticas agrícolas (convívio, trabalho, observação e pesquisa) com um período na escola (reflexão, questionamentos, análises, sínteses, aprofundamentos e generalizações) e retorna novamente à família, introduzindo o conhecimento adquirido.
     As EFAs tem sido muito bem sucedidas no Brasil (existem cerca de 180), abrindo novas perspectivas de produtividade para os pequenos produtores rurais, já que o poder público não fornece assistência técncia e extensão rural ao pequeno produtor, aumentando a produtividade e abrindo um futuro promissor à agricultura familiar, além de manter as famílias rurais unidas, na medida em que diminui muito o êxodo dos jovens para as cidades.
     Para fundar uma EFA, forma-se uma Associação de Pais e Alunos da Escola, com objetivo de representá-la juridicamente e conseguir os recursos para sua construção. Na Bahia, o Estado onde tem se difundido mais rapidamente essa proposta, existem 33 unidades, agregadas em duas associações (AECOFABA e REFAISA) e são apoiadas pelo Programa Estadual de Apoio Técnico-financeiro às Escolas Família Agrícola. Existe ainda uma associação nacional (UNEFAB).
     As EFAs atualmente são definidas como escolas públicas não estatais, mas nada impede que sejam assumidas e financiadas pelos governos.  Elas trabalham com alunos de 5a a 8a série do ensino fundamental, com o ensino médio e ainda como escola técnica em agropecuária.
     Dentre seus resultados mais significativos está o reforço do associativismo e a difusão da agricultura orgânica, à partir de conhecimentos sobre ecologia e manejo do solo.
     Em termos de urbanismo, o impacto das EFAS está na manutenção dos núcleos rurais, que podem crescer e se transformar nas futuras comunidades sustentáveis, antevistas por nós em artigos anteriores, em oposição ao contínuo crescimento das cidades.
     Reunindo agricultores em torno de novas práticas, essa nova forma de organização escolar pode ser o embrião de uma nova forma de ocupação do campo e de distribuição da população sobre o território, combatendo ao mesmo tempo o gigantismo das cidades, o uso de agrotóxicos e a formação de latifúndios exportadores, invertendo a lógica da urbanização desenfreada, cujo custo social é muito alto para a nação.
     Um tema muito interessante para planejadores urbanos, que poderiam projetar as primeiras comunidades sustentáveis em torno dessas escolas. Proposta interessante também para o Governo Federal repensar a educação e a ocupação territorial no Brasil, retomando a iniciativa do planejamento, hoje abandonado em detrimento do mercado.

Boa segunda- feira a todos

Ricardo Stumpf Alves de Souza
    
     
    

domingo, 21 de novembro de 2010

Cidades Sustentáveis IV

Mobilidade urbana

     Mobilidade urbana é a capacidade das pessoas circularem pela cidade. Ela tem um custo para os cidadãos e para as municipalidades. Tema obrigatório para a copa do mundo de 2014, a necessidade de dotar nossas cidades sedes de uma adequada mobilidade urbana, trouxe à tona décadas de erros e atrasos nesta área.
     Na verdade nem são erros, mas resultados de políticas equivocadas que visaram favorecer a venda de automóveis, em detrimento da racionalidade, resultando no caos atual, onde ruas e avenidas são sempre ampliadas a um custo elevado, mas não conseguem dar conta do volume de veículos despejados nelas diariamente pelas montadoras, tornando o trânsito inviável.
     Em cidades feitas para o automóvel, como Brasília, esse custo para o cidadão é altíssimo. Praticamente cada filho de uma família de classe média que começa a trabalhar ou fazer faculdade precisa comprar um carro, já que os transportes públicos, feitos principalmente por ônibus movidos a diesel, são lentos caros e sub-dimensionados. No caso de Brasília o metrô existente é insuficiente, com sua única linha atendendo apenas a parte sul do DF. As composições tem apenas quatro vagões (e as estações acompanharam o tamanho das composições, criando um problema para expandir o sistema).
     Em São Paulo, com a maior malha de metrôs, as linhas estão sempre correndo atrás do problema. Não se constrói novas linhas para induzir o crescimento da cidade, mas para atender regiões já saturadas.
     Para se ter uma idéia, em nenhuma capital brasileira os metrôs atendem aos aeroportos (apenas a algumas rodoviárias) o que demonstra uma visão elitista do transportes de massa. Na cabeça dos nossos planejadores os aeroportos foram feitos para quem tem alta renda e só anda de táxi.
     Dois erros: o primeiro é que metrô não é apenas para pobres, mas para que todo cidadão se locomova rapidamente pela cidade. O segundo foi pensar que o transporte aéreo nunca se popularizaria no Brasil.
     Só para se ter uma idéia de como os aeroportos eram elitizados, nossa primeira seleção campeã do mundo, em 1958, teve que sair por um portão dos fundos do aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, ao chegar da Suécia, porque não ficava bem jogadores de futebol passando por dentro do terminal.     
     Na emergência de ter que dotar de mobilidade urbana ao menos as cidades sedes da copa do mundo de 2014, há que se fazer escolhas rápidas.
     Hoje estão disponíveis os sistemas de metrôs, os corredores de ônibus (tradicionais ou articulados), os VLTs (veículos leves sobre trilhos- foto ao lado) e os VLPs (veículos leves sobre pneus).
         Os metrôs são mais caros (cerca de US$100 milhões por km) e geram maior transtorno para sua construção, mas quando subterrâneos tem a vantagem de não impactar a paisagem urbana. Os corredores de ônibus, já existentes em muitas cidades brasileiras, tem o inconveniente de usar veículos movidos a diesel, poluidores, provocando o estreitamento das vias existentes, que passam a ficar mais congestionadas. Seu custo também é alto (US$20 milhões por km). Se forem configurados como um sistema fechado, em que o passageiro paga apenas uma vez para ingressar e pode mudar de linha, chamam-se BRTs (Bus Rapid Transport). No Brasil o melhor e mais antigo exemplo é o de Curitiba. São Paulo construiu um BRT sobre via elevada, que é o Expresso Tiradentes, de custo alto e performance duvidosa.
     Os VLTs e os VLPs, exigem uma calha exclusiva, semelhante a dos corredores de ônibus, mas podem ter a calha suspensa. As calhas suspensas tem a vantagem de simplificar a intervenção urbana, diminuindo as desapropriações e o volume de obras (não há grandes escavações), e podem cruzar sobre avenidas existentes, parques, praças, rios e outros obstáculos.
      Brasília começou a construir um VLT ligando o aeroporto ao estádio e ao setor hoteleiro, mas a obra foi embargada pelo Tribunal de Contas e se tornou um esqueleto herdado do governo Arruda. O projeto, se fosse executado, implicaria na derrubada das árvores cinquentenárias da Av. W3, ao longo de 6 km. Só por isso já seria um absurdo.
O custo de um VLP suspenso, também conhecido como monotrilho, são relativamente menores que o do metrô (entre 37 e 50 milhões por Km). São Paulo se prepara para construir várias linhas suspensas de VLPs (ao lado).  
     Manaus está fazendo a licitação do seu primeiro transporte de massa, que será também um VLP, tipo monotrilho.
     O custo da passagem do VLP ou VLT varia entre a
passagem de ônibus e a de metrô, dependendo da sua capacidade de transportar mais ou menos passageiros. O metrô é mais caro mas transporta mais passageiros.
      Vários metrôs também tem trechos suspensos. Salvador está construindo um metrô cuja primeira etapa é quase toda sobre calha suspensa, mas pode se expandir com trechos subterrâneos. O que os diferencia é o tipo de trens. Metrôs tem aceleração e frenagem rápida e capacidade maior de transportar passageiros.
    A empresa canadense Bombardier, está propondo um VLT sobre calha suspensa, mais rápido e com maior capacidade, para São Paulo. Seria o primeiro desses sistemas a ser implantado no mundo.
          Todos esses sistemas podem e devem ser integrados a sistemas convencionais de trens e ônibus, configurando uma grande malha que atinja toda a cidade.
     O importante nessa corrida pela mobilidade urbana é que a mentalidade rodoviária seja suplantada pela do transporte coletivo de qualidade que funcione como uma restrição ao transporte individual, liberando os espaços públicos, hoje entulhados de carros, para os pedestres, os parques, as bicicletas e para a natureza.
     Perdem as montadoras, perde o modelo consumista, perdem os bancos que movimentam via crédito todo esse consumo, perdem os interesses imobiliários, mas ganha a racionalidade e a qualidade de vida.
     Mas tudo isso ainda são paliativos para mega-cidades que cresceram sem planejamento, ao sabor de interesses corporativos. O futuro estará em pequenas cidades planejadas, livres de automóveis, mais democráticas, funcionais e limpas.

Rapidinhas

Dia de Visita
     Atenção amantes do teatro e das artes plásticas: vai começar a mostra Dulcina de Teatro e Artes Plásticas, que ocorre duas vezes por ano, com trabalhos dos alunos da faculdade Dulcina de Moraes, em Brasília.
     Antes da estréia, porém, está em cartaz (último dia hoje, 21 de novembro às 20,00h.) um sucesso da penúltima mostra, agora em circuito comercial:  Dia de Visita, baseado em duas peças de Plínio Marcos que tratam sobre o sistema carcerário brasileiro: Barrela e Mancha Roxa.
     Encenado nos subterrâneos do Centro Comercial Conic, o público é tratado como se fosse uma turma que vai visitar um presídio, sendo recebido pelos "guardas" que os encaminham para as celas. Aí pode-se escolher entre as celas masculina e feminina, em corredores diferentes. Em frente às celas, pequenas arquibancadas para assistir aos espetáculos que se desenrolam atrás das grades. Ao final das encenações o público se dirige a outra cela e assiste ao outro espetáculo. Assim, as duas peças são encenadas duas vezes seguidas. Barrela (na cela masculina) é uma das primeiras peças escritas por Plínio Marcos e A Mancha Roxa (na feminina) a última.  
     Curiosamente as duas tratam do mesmo tema, o precário sistema carcerário brasileiro, embora o abordem sob foco diferente (violência sexual e DSTs nas prisões).
     Bom programa para nossos distraídos parlamentares que nunca se preocupam com o destino dos presos no Brasil. O espetáculo é chocante, na crueza do seu realismo, mas dá voz aos que nunca tem voz, especialidade do autor.
Dirigido por de Francis Wilker e Nei Cirqueira.
Produção; Cia Fábrica de Teatro/DF.




Um Terrível Equívoco


     Acabo de passar 6 anos e meio na selva colombiana junto com Ingrid Betencourt, lendo o impressionante relato do seu sequestro pelas Farc, a guerrilha colombiana, no livro Não há silêncio que não termine (Cia Das Letras, São Paulo - 2010).
     Venho sofrendo há dias com essa leitura pela qual eu ansiava desde que Ingrid fora solta. Já havia comprado um pequeno livro com a carta que ela escrevera à sua mãe desde o cativeiro, mas nada se compara a este tremendo panorama memorialista com que ela nos brinda, no seu excelente texto, para nos fazer cair na realidade da tragédia latino-americana.
     Minha primeira reação ao terminar de ler o livro foi me olhar no espelho e chorar envergonhado, me perguntando como pude apoiar as Farc, como pude ter simpatia por esse grupo capaz de cometer tantas desumanidades em nome de uma revolução que não faz mais sentido, embora sempre tenha me posicionado contra os sequestros?
     Que terrível equívoco! Agora entendo o silêncio dos cubanos, que há anos não apóiam mais esse movimento, que se desvirtuou para uma espécie de afirmação personalista de heróis do campo, sem ideologia maior que a própria grandeza que tentam construir.
     Pobres de nós, latino-americanos, espremidos entre o império norte-americano e nossas próprias incongruências absurdas.
     Nós brasileiros, que lutamos tanto pela democracia não podemos apoiar um movimento que se dá o direito de escolher indiscriminadamente pessoas que vai retirar da vida civil, inclusive crianças e idosos, submetendo-os à um submundo, uma vida de cão, que consiste em ser arrastados pela selva acorrentados pelo pescoço, sem nenhuma dignidade, para serem usados como moeda de troca.
     Nada justifica o que eles fazem, nem mesmo a indiferença da burguesia colombiana em relação à miséria do seu povo, principalmente nas áreas rurais, nem o horror dos paramiliatres e da corrupção, num país em que o tráfico de coca corrompeu até os revolucionários.
     Está na hora da Colômbia ter um governo democrático de esquerda que distribua suas riquezas e encerre de vez essa guerra absurda.
     Pensei que Ingrid fosse ser candidata a presidente da Colômbia nas últimas eleições. Mas como poderia voltar à vida pública sem antes tirar dos seus ombros essa imensa carga de sofrimento? É isso que ela acaba de fazer através do seu depoimento.
     É muito impressionante, não apenas pela descrição detalhada dos fatos, das experiências vividas, da maneira como as Farc se organizam, dos flagelos inflingidos aos prisioneiros, mas pelo olhar humano que soube descobrir as belezas ocultas, revelar as sombras, levantar os véus do que se passava em cada ser humano envolvido nessa trama terrível.
     Liberta pelas suas palavras, quem sabe Ingrid possa dar um jeito naquele país, que ninguém melhor do que ela conhece agora. Não deixem de ler.

Reencontro


     Convidado por Regina Reis, participei sábado, dia 20, do jantar de confraternização da turma de 1985, da faculdade Dulcina de Teatro, onde fui professor em 1984. Fiquei emocionado com a lembrança e a amizade dela e também com os reencontros calorosos no restaurante Le Jardim, no Clube de Golfe.       
     Muito bom ver os talentos que nasceram ali e floresceram, vindos agora de todo o Brasil, se reencontrando e traçando planos para o futuro. A Dulcina continua sendo a alma do teatro braziliense. Antes fomos assistir à peça Última Cena para Lorca, concepção e direção de André Amaro, no teatro Caleidoscópio.  Belíssimo espetáculo, de um rigor impressionante, tanto nas atuações quanto na parte musical, passando ao público toda a energia e a musicalidade do povo espanhol. Lindo!
No domingo mais reencontros num almoço no Beirute.

Boa segunda-feira a todos

Ricardo Stumpf Alves de Souza