Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 28 de outubro de 2012

O Paiz
 
O céu muda de cor
 
     Como dizia Tancredo Neves: política é igual nuvem, a gente olha está de um jeito, a gente olha de novo e já mudou.
     O panorama político que emerge deste segundo turno tem como mudança principal, o fim da polarização entre PT e PSDB, com a ascensão de novos partidos no cenário nacional. Ao centro o PSB, que se afirma como alternativa ao PT, substituindo o PSDB, que vai se tornando um partido do norte-nordeste, com a eleição em Belém, Manaus, Maceió e Teresina, além de alguma cidades médias dispersas pelo país.
     O PSB vence em muitas capitais, como Belo Horizonte, Fortaleza, Recife, Aracajú, Porto Velho e Cuiabá, além de outras cidades importantes, como Campinas, Petrópolis e Duque de Caxias, algumas vezes disputando com o próprio PT, de quem é aliado no governo federal. A liderança de governador de Pernambuco, Eduardo Campos, cresce e se projeta a nível nacional, como possível sucessor de Dilma Roussef.
     A eleição de Haddad, em São Paulo, obra da engenharia política de Lula, fez com que o PT na capital paulista, voltasse a ser um símbolo de mudança, enterrando definitivamente a carreira de José Serra e fazendo perigar a permanência do PSDB no governo do Estado em 2014, principalmente com a força decorrente da incorporação do novo PSD, de Kassab, ao ministério do governo Dilma.
     Sem dúvida uma vitória expressiva. A vitória da renovação de quadros, que Lula soube fazer lá, mas o Partido em outros estados não soube ou não quis fazer, levando o eleitorado a considerar outras alternativas.
     Salvador é o retrato mais perfeito do desencanto. A eleição de ACM Neto é uma resposta direta à arrogância do Governador Jacques Wagner, diante da mais do que justa greve dos professores estaduais.   
     O governo do Estado assinou um acordo e não cumpriu, deixando que a greve se prolongasse por mais de 100 dias, sem ceder um milímetro.
     Wagner, um ex-sindicalista, não soube e não quis negociar. Pagou o preço nas urnas.
     O candidato do PT, Nelson Pellegrino, também foi uma péssima escolha. Mal visto até mesmo dentro da esquerda, Pellegrino que comandou, como líder do governo, a malfadada reforma da previdência no primeiro governo Lula, ameaçando de "excomunhão" quem votasse contra suas ordens, nunca foi um político expressivo, e não foi capaz de inspirar confiança no eleitorado.
     Sua maior bandeira de campanha foi o apoio de Lula e Dilma, além do impopular governador Wagner. Parecia que não era ele quem ia governar, mas Lula e Dilma.
     Conseguiu realizar a proeza de desentocar as cobras que estavam adormecidas, dando espaço para o carlismo voltar à cena política baiana e jogando a capital nos braços do setor mais atrasado da política brasileira.
     A capital da Bahia, que já vive um caos urbano provocado pela incompetência de sucessivos governantes populistas, deve entrar numa crise mais profunda, que vai se agravar mais ainda na eleição de 2014, se o PT local não souber se renovar e continuar prisioneiro da arrogância das direções partidárias incompetentes que o lideram atualmente.
     Quem sabe, surja uma nova força para substituir o PT, que soube se desgastar tão rapidamente no governo do Estado, mudando mais uma vez a cor do céu.
     A única vitória expressiva do PT no Estado ocorreu em Vitória da Conquista, onde Guilherme Menezes conseguiu sobreviver apesar do desgaste de 16 anos liderando o processo político da cidade.
Mas ele, como liderança já está desgastado, não tem mais futuro.
     Na esquerda temos a consolidação do PSOL como alternativa ao PT e a outros partidos de esquerda, pertencentes à base aliada, como o PCdo B, cujas derrotas em Manaus e Porto Alegre o relegam a um segundo plano.
     Note-se que o Psol, apesar de ter eleito apenas um prefeito de capital, em Macapá, teve um resultado expressivo em Belém, correndo por fora. O Pará, que já foi governado pelo PT (Julia Carepa), parece ter virado a página. Seu eleitorado de esquerda quer novas alternativas, desencantado com os governos petistas.
     O espaço está aberto. Tomara que nuvens carregadas de novas lideranças, façam chover gente de visão, para alavancar o desenvolvimento do Brasil.
Rapidinhas
  
 A tragédia dos Guaranis Kaiowás
     Os índios Guaranis-Kaiowás, do Mato Grosso do Sul cansaram de serem despejados de suas terras ancestrais, pelo agronegócio, que age com a cumplicidade da justiça dos não-índios.
     Numa carta tornada pública, expuseram suas razões e os motivos para o aumento absurdo de suicídios, principalmente entre os jovens da tribo, que não veem perspectivas de continuar vivendo como índios, fora de suas terras.
     A carta, em princípio, foi entendida como uma ameaça de suicídio coletivo da comunidade, acampada na beira do Rio Hovy, no município de Iguatemi. Depois os próprios índios desmentiram este entendimento, mas reforçaram com dados impressionantes a onda de suicídios: 863índígenas, desde 1986. Abaixo transcrevo um trecho da carta-testamento dos Guaranis-Kaiowás, que comoveu o Brasil.
     " Não temos e nem teremos perspectiva de vida digna e justa tanto aqui, na margem do rio, quanto longe daqui. Concluímos que vamos morrer todos. Estamos sem assistência, isolados, cercados de pistoleiros, e resistimos até hoje (...) Comemos uma vez por dia."
      "Pedimos ao Governo e à Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas decretar nossa morte coletiva e enterrar todos nós aqui. Pedimos para decretar nossa extinção/dizimação total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar nossos corpos. Este é o nosso pedido aos juízes federais."
 
     Uma tragédia que precisa ser interrompida imediatamente, com a restituição das terras imemoriais, pertencentes a esta tribo, na reserva de Dourados.

 
Stop
     Pôxa, perdemos Regina Dourado.
     Não me esqueço dela naquela novela da Globo, Explode Coração, em que ela contracenava com aquele ator engraçadíssimo, Rogério Cardoso, que fazia o Salgadinho, e ela dizia Stop Salgadinho!
     Que simpatia. Que atriz excelente. Que delícia ver ela na Globo imitando o sotaque carioca, invertendo a lógica habitual da emissora que coloca atores cariocas tentando imitar um sotaque baiano que nem existe (pelo menos não do jeito que eles fazem).
     Um dia fui a Salvador e subi com ela num elevador. Quando paramos no andar que ela ia descer, me deu vontade de dizer: stop! Mas fiquei com vergonha e me calei.
     A timidez faz a gente perder tantas oportunidades. Não quis importuná-la, mas tive vontade de abraçá-la e agradecer os bons momentos que ela me proporcionou na TV. Perdi a chance.
     Mas agradeço aqui. Obrigado Regina!
 
Eleições em Israel
     O atual primeiro ministro israelense, Benjamin Netanyahu convocou eleições antecipadas e se aliou com a extrema direita do ministro da defesa, Avigdor Lieberman, aquele mesmo que se recusou a receber Lula, alegando que ele era "de esquerda".
     Lula estava em visita oficial ao país como presidente do Brasil e não recebê-lo foi considerado um ato hostil ao nosso país, por parte de uma autoridade. Isso dá uma idéia do que são esses ultra-direitistas que estão no governo de Israel, país que foi fundado por socialistas, em 1948.
     Netanyahu, vive acusando o Irã de estar prestes a ter armas atômicas (enquanto se recusa a discutir a existência de bombas atômicas que eles possuem "secretamente"), incitando os Estados Unidos a atacar o país dos Aiatolás, como uma forma de encobrir sua política de anexação e genocídio na Palestina.
     Agora mesmo anunciam a construção de mais 700 casas na Cisjordânia ocupada, enquanto uma pesquisa feita por um instituto de opinião de lá, revela que a maioria dos israelenses é a favor de estabelecer um regime de apartheid contra os árabes que vivem no país.
     Pra quem não sabe, o apartheid era o regime de segregação racial usado na África do Sul (com apoio de Israel e dos Estados Unidos) contra os negros de lá.
     Agora me digam, que futuro pode ter um país que baseia sua existência no racismo e no exterminío de outro povo?
     É hora do povo israelense compreender que precisa mudar, derrotando essa política expansionista suicida e elegendo um governo que dialogue com os palestinos, aceitando a solução de dois Estados e buscando um acordo de paz definitivo com os árabes.
 
Poesia da Semana
 
Ofertas de Aninha
(Aos moços)
 
Eu sou aquela mulher
a quem o tempo
muito ensinou.
Ensinou a amar a vida.
Não desistir da luta.
Recomeçar na derrota.
Renunciar a palavras e pensamentos negativos.
Acreditar nos valores humanos.
Ser otimista.
 
Creio numa força imanente
que vai ligando a família humana
numa corrente luminosa
de fraternidade universal.
Creio na solidariedade humana.
Creio na superação dos erros
e angústias do presente.
 
Acredito nos moços.
Exalto sua confiança,
generosidade e idealismo.
Creio nos milagres da ciência
e na descoberta de uma profilaxia
futura dos erros e violências
do presente.
 
Aprendi que mais vale lutar
do que recolher dinheiro fácil.
Antes acreditar do que duvidar.
 
Cora Coralina (Vintém de Cobre)


 
Notícias tristes
      Muito ruins as notícias sobre o aumento da violência em várias cidades brasileiras, especialmente em São Paulo, onde parece quer o PCC passou a matar indiscriminadamente pessoas que estejam na rua. São vários casos semelhantes, em que dois tripulantes de uma moto passam atirando em pessoas que estão na rua, em bares ou no trânsito. Isto já não é mais violência de bandidos, mas sim terrorismo.
      O objetivo do terrorismo é matar inocentes para aterrorizar a população, que assim se torna mais dócil aos desejos dos que querem dominar a cidade (ou o país).
Em um dos casos, o bandido chegou a rir da morte de uma jovem de 16 anos que ele acabara de balear, fazendo ainda um comentário sarcástico: quem mandou ela reagir?
      Este é o objetivo do terror, impedir a reação das pessoas, que devem se entregar inertes aos seus caprichos.
      Em outro caso extremamente doloroso, ocorrido em Minas, um bandido matou uma menina de 11 anos, para roubar o carro onde ela seguia com a mãe. A mulher já tinha descido do carro e entregue as chaves, e mandou que a filha descesse, antes que ele saísse com o carro. O assassino então disparou friamente na criança, sem nenhuma necessidade.
 
     O que dizer a esta mãe (foto acima) que viu sua filha ser morta na sua frente?
     Na entrevista que deu a TV, declarou simplesmente: ele podia ter me levado..., mostrando sua disposição de se sacrificar em lugar da filha. Como eu gostaria de abraçá-la e chorar com ela a sua dor, que no fundo é a dor de todos nós brasileiros, acuados por esses fascínoras, enquanto seguimos prisioneiros de uma concepção liberal de justiça que está nos levando ao caos.
 
     Por isso, acho que em certos casos a pena de morte deveria valer no Brasil e a idade penal deveria ser reduzida, não apenas para 16 anos, mas acho que deveria haver uma responsabilidade crescente, à medida em que a idade vai aumentando.
      O que não é possível é continuar considerando assassinos de 17 anos como se fossem criancinhas inocentes, cuja pena vai no máximo até 3 anos e depois saem matando novamente, como tem acontecido seguidamente.
      Precisamos de leis mais duras. O que fazer com um sujeito desses que mata uma criança pra se divertir? A pena de morte no Brasil já foi decretada há muito tempo...pelos bandidos. Eles podem nos matar à vontade, enquanto que a nós só nos resta chorar e ficar pedindo paz inutilmente.
      No caso de São Paulo a questão é mais urgente e difícil, porque se trata de um desafio claro ao poder constituído, ou seja, ao governo do Estado. Mas aquelas múmias do PSDB que estão no governo há décadas, continuam achando que se responde a este desafio colocando mais policiais nas ruas e aumentando a repressão. É uma política falida, que só leva a polícia a se tornar cada vez mais violenta, atingindo mais ainda o cidadão, especialmente os pobres nas periferias.
      A polícia paulista é a que mais mata no mundo, e a segurança está cada vez pior.
      O exemplo a ser seguido é o do Rio de janeiro, que investiu em prevenção e informação.
      É a polícia secreta, infiltrada nas quadrilhas, o uso de mapeamentos e instrumentos de escuta e espionagem, que permite ao governo do Rio acuar os bandidos, expulsando-os de seus territórios, numa série de sucessos que tem conseguido derrotar os cartéis do tráfico que haviam dominado a cidade.
      Enquanto isso, o Secretário de Segurança de São Paulo diz numa entrevista que os ataques não estão relacionados, que é tudo apenas uma coincidência. Uma piadinha sinistra, para tapar o sol com a peneira.
      Em qualquer lugar civilizado do mundo, esse sujeito já teria pedido demissão.

domingo, 21 de outubro de 2012

O Paiz
 
Leviandovski
 
 
     Prezados leitores, juro que tentei evitar este assunto, para não me meter a julgar quem está habilitado a nos julgar, na mais alta corte do Estado brasileiro. Mas a atitude do revisor do mensalão, Ricardo Lewandowski, causa a mais profunda estranheza.
     Não é possível que um juiz de tão alta corte, confrontado com todas as acusações feitas pela Ministério Público e pelo relator do processo, Ministro Joaquim Barbosa, absolva todos os acusados, alegando que formação de quadrilha só existe quando é uma coisa permanente.
     Então um grupo de pessoas não pode se articular em torno de uma quadrilha para praticar crimes durante certo tempo e depois simplesmente viver do dinheiro auferido, devidamente lavado, sem precisar cometer novos ilícitos?
     E isso não seria uma quadrilha?
     Os filmes estão cheios de histórias como essa, onde os criminosos depois de conseguirem enriquecer vão viver em paraísos tropicais, usufruindo de sua fortuna, enquanto posam de cidadãos honestos.
     Segundo o ministro, então, nenhum deles seria um quadrilheiro porque abandonou o crime, passando apenas a viver dos seus frutos?
     Muito suspeita a atitude deste ministro, inclusive voltando atrás e absolvendo quem ele próprio já havia condenado.
     Isso me lembra a frase de Eliana Calmom, a Corregedora da Justiça, que disse que no judiciário brasileiro haviam bandidos de toga.  
     A impressão que dá é que o dinheiro do mensalão continua correndo por trás do julgamento, corrompendo inclusive membros da mais alta corte do país e levando ao descrédito os brasileiros, que já estavam começando a crer que havia justiça também para os ricos e poderosos neste país.
     Mais que uma leviandade, um escândalo!
 

Rapidinhas

Reta final


     Aproxima-se o desfecho das eleições municipais, com o PT jogando pesado com a presença de suas maiores estrelas, Dilma e Lula, nos principais colégios eleitorais do pais, onde procura enterrar de vez os partidos de direita que ainda lhe fazem oposição: DEM e PSDB, principalmente em São Paulo, onde Lula apostou todas as suas fichas, Salvador e Manaus.
     Em São Paulo parece que a estratégia vai sendo bem sucedida, já que lá Lula teve o cuidado de interferir desde o início com a escolha de um candidato retirado de sua própria equipe, como forma de renovar a política local cansada de ter que escolher sempre entre membros burocráticos da cúpula local do Partido.
     Em Salvador o cuidado não foi tanto, e o candidato Pelegrino tem suado para vencer o herdeiro do carlismo, também conhecido como grampinho. Na verdade, nenhum dos dois candidatos está à altura da importância da cidade e dos problemas que ela enfrenta, depois de uma série funesta de administrações populistas.
     O mesmo ocorre em Manaus, onde a gaúcha Vanessa Graziotin tem grandes dificuldades em vencer Arthur Virgílio Neto. Talvez por ser do PCdoB, enfrenta maiores resistências dentro do PT e na própria população, e também por uma certa dose de arrogância pessoal.
     O Ibope tem dado vantagem à direita em Salvador e Manaus, mas este instituto tem funcionado mais como formador de opinião do que como pesquisador eleitoral, já que tradicionalmente tem errado feio, ao menos na capital baiana.
     Deveria ser investigado pelo Ministério Público por suas constantes tentativas de manipular as eleições.
     
Ventos de paz


     A semana termina com possibilidades concretas de negociações de paz na Colômbia e na Síria.
     Na Colômbia uma corajosa mesa de negociações já foi montada em Oslo, na Noruega, entre as Farc e o governo do presidente Santos. Depois de 48 anos de guerrilhas (desde 1964), as Farc, movimento guerrilheiro surgido entre os camponeses para reivindicar justiça social, se dispõem a negociar.
     Sua principal reivindição é a reforma agrária, a que o governo incrivelmente ainda resiste. Talvez seja o último país da América do Sul que ainda não fez a sua.
     A desmoralização deste movimento, com seu envolvimento com o tráfico de drogas e o sequestro de civis, fez com que perdesse sua representatividade junto ao povo colombiano.
     O mesmo pode-se dizer do governo, principalmente no período de Álvaro Uribe, que se envolveu até o pescoço com paramilitares criminosos e também com traficantes de drogas.
     Agora, sob novas lideranças, governo e Farc parecem cansados de um teatro que não convence mais ninguém. Oxalá consigam um acordo que acabe com esta guerra, cada vez mais inútil.
     Na Síria o impasse militar e a ameaça de expansão do conflito para os países vizinhos, parece estar levando o ditador a jogar a toalha e aceitar uma negociação para uma saída honrosa.
     A única reivindicação por lá é a democracia, aceita por todos, menos pela família do ditador, que domina o país há 40 anos.
     Hora de sair e parar de matar seu próprio povo.
     Esse sujeito deveria estar sentado no Tribunal Penal Internacional. Mas se o preço para se livrar dele for deixá-lo livre, melhor assim. Afinal neste tribunal também deveriam estar sentados o ex-presidente americano George Bush e o ex-primeiro Ministro britânico Tony Blair, que começaram inutilmente a guerra do iraque que matou mais de 200.000 civis, mas ninguém fala nisso. Parece que este tribunal foi criado apenas para o terceiro mundo.
     Ainda uma boa notícia foi a liberação das viagens para os cidadãos cubanos que queiram ir para o exterior. Essa era uma das exigências dos Estados Unidos para suspender o absurdo bloqueio contra Cuba que vigora há 50 anos.
    
 
Ventos de guerra
 
 
    Por outro lado, o primeiro ministro fascista de Israel, Benjamin Netanyahu conseguiu atrair os Estados Unidos para um exercício militar conjunto, no oriente médio. Pode ser um ensaio para uma possível invasão do Irã. Aí sim teremos guerra da grossa, com milhões de mortos, capaz de envolver o mundo inteiro.
     Que os anjos iluminem as mentes desses homens para que parem com esses conflitos, que só beneficiam os mercadores de armas.

Poesia da Semana

     Deixo para vocês, como poesia da semana, esta obra prima de Horacio Sanguineti: o tango Nada, de 1944, cantando por Mercedes Sosa e Maria Graña.
     A letra original em espanhol foi traduzida por mim, portanto perdoem algum equívoco.
     Na verdade fiquei muito em dúvida com o termo yuyal, para o qual não achei uma definição segura e traduzi por quintal.
     Se alguém souber seu significado preciso por favor me corrija.
     Para ouvir a gravação, acessem o link ao final.
 
 
Nada

He llegado hasta tu casa...                           Eu cheguei até tua casa
Yo no sé cómo he podido                             Não sei como consegui 
Si me han dicho que no estás,                     Se me disseram que não estás
Que ya nunca volverás...                              E que nunca voltarás
Si me han dicho que te has ido                    Se me disseram que te foste
Cuánta nieve hay en mi alma!                      Quanta neve há em minha alma
¡qué silencio hay en tu puerta!                     Que silêncio há em tua porta
Al llegar hasta el umbral,                              Ao chegar até o umbral
Un candado de dolor                                    Um cadeado de dor
Me detuvo el corazón.                                  Me deteve o coração
Nada, nada queda en tu casa natal...           Nada, nada, resta em tua casa natal
Solo telarañas que teje el yuyal.                   Só teias de aranhas que tecem o quintal
El rosal tampoco existe                                 O roseiral tampouco existe
Y es seguro que se ha muerto al irte tú...     E com certeza morreu quando te foste
¡ todo es una cruz ¡                                       Tudo é um cruz
Nada, nada más que tristeza y quietud.        Nada, nada mais que tristeza e quietude
Nadie que me diga si vives aún...                 Ninguém que me diga se vives ainda
¿dónde estas, para decirte                           Onde estás para dizer-te
Que hoy he vuelto arrepentido a buscar       Que hoje volto arrependido para buscar
tu  Amor?                                                       Teu amor?
Ya me alejo de tu casa                                  Já me afasto de tua casa
Y me voy yo ni sé donde..                             E me vou nem sei pra onde
Sin querer te digo adiós                                Sem querer te digo adeus 
Y hasta el eco de tu voz                                E até o eco de tua voz
De la nada me responde.                              Do nada me responde
En la cruz de tu candado                               Na cruz do teu cadeado
Por tu pena yo he rezado                              Por tua perda eu rezei
Y ha rodado en tu portón                               E há girado em teu portão 
Una lágrima hecha flor                                  Uma lágrima feita flor
De mi pobre corazón.                                    Do meu pobre coração
Nada, nada queda en tu casa natal...           Nada, nada, resta em tua casa natal
Solo telarañas que teje el yuyal.                   Só teias de aranha que tecem o quintal
El rosal tampoco existe                                 O roseiral tampouco existe
Y es seguro que se ha muerto al irte tú...     E com certeza morreu quando te foste
¡ todo es una cruz ¡                                       Tudo é uma cruz
Nada, nada más que tristeza y quietud.        Nada, nada mais que tristeza e quietude
Nadie que me diga si vives aún...                 Ninguém que me diga se vives ainda
¿dónde estas, para decirte                           Onde estás para dizer-te
Que hoy he vuelto arrepentido a buscar      Que hoje volto arrependido para buscar
Tu amor?                                                      Teu amor?
He llegado hasta tu casa….                          Eu cheguei até tua casa...
http://www.radio.uol.com.br/#/letras-e-musicas/mercedes-sosa/nada/2274222

Carros elétricos
 
     É uma pena que o novo regime automotivo lançado pelo governo, para promover a inovação e o desenvolvimento tecnológico dos veículos fabricados no Brasil, tenha deixado de lado os automóveis elétricos, que poderiam ter sido agraciados com descontos no IPI.
     Os veículos elétricos, não servem ainda para substituir os carros de passeio, por causa da sua pequena autonomia, mas podem substituir muito bem os utilizados dentro das cidades, como taxis, carros de serviços, ônibus, ambulâncias, etc, que não costumam rodar muito por dia.
     Ao contrário do que se pensa, esses veículos não são novidades no Brasil e já foram fabricados em série aqui, pela Gurgel, fabricante brasileira que fechou as portas na década de 80. Era o Itaipu, furgão elétrico lançado em 1973, e que foi muito utlilizado como carro de entregas e serviços por aqui (foto abaixo). Sua maior característica era o silêncio, o que inclusive motivou alguns atropelamentos de pedestres, que não ouviam o carro se aproximar.
 
 
     Numa época em que ainda não se falava em inovação, Amaral Gurgel, o engenheiro que fundou a fábrica com o nome dele, já fazia pesquisas na área e procurava lançar carros mais econômicos e versáteis.
     É verdade que a Gurgel pecava pelo design tosco dos seus carros e por alguns caprichos do seu dono, que se recusou a fabricar motores a álcool, achando que o programa do governo não daria certo. Ele se considerava um novo Henry Ford, mas lhe faltavam qualidades para isso. Tentou repetir uma história de sucesso, mas os tempos já eram outros. Acabou falindo e lá se foi nossa única fabricante legitimamente brasileira de veículos leves.
     Restou a Agrale, que só fabrica caminhões pequenos.
     Agora os carros elétricos estão de volta, na sua forma pura, movidos à bateria, ou na forma de híbridos, com dois motores, um à explosão e outro elétrico. O motor a explosão (gasolina) alimenta as baterias do elétrico até que este possa rodar sozinho. Então o elétrico entra em cena e o motor a gasolina se desliga automaticamente.
À esquerda o Nissan Leaf, totalmente elétrico. À direita o Fusion, híbrido da Ford.
     Seria muito importante que o regime automotivo do governo estimulasse pesquisas nessa área, para que não fiquemos na dependência de tecnologia estrangeira novamente, nós que fomos pioneiros neste tipo de veículo, estabelecendo incentivos para a produção brasileira.
     Ainda é tempo de mudar. O meio ambiente agradece.
     

domingo, 14 de outubro de 2012

O Paiz
 
 
Mensalões
 
 
     O julgamento do núcleo político do mensalão do PT não surpreendeu ninguém. Todos já haviam entendido que o grande esquema de compra de apoio ao governo Lula, organizado por José Dirceu, havia transformado nosso Congresso Nacional num grande balcão de negócios, repetindo em nível federal o que é comum em Câmaras Municipais pelo país afora, especialmente nas pequenas cidades.
     Na verdade um dos objetivos de Dirceu era realmente desmoralizar o Congresso e os partidos que ele chama de burgueses mostrando que eles trabalham apenas em prol dos seus próprios interesses.
     Não contava, porém, com a tradição da Câmara brasileira, que já abrigou grandes nomes em grandes batalhas pelos direitos do povo. Quis achincalhar o poder constituído, no intuito de destruí-lo, mas calculou mal e quem saiu destruído foi ele.
     O mais impressionante neste caso é que, ao contrário dos outros partidos, o PT não expulsou nenhum dos que foram condenados, pelo contrário, ainda insiste em que a Corte Suprema errou, como disse José Genoíno e recebe com aplausos um criminoso condenado, numa reunião partidária.
     O desempenho do PT no primeiro turno das eleições provou que as figuras de Lula e Dilma continuam descoladas dos aventureiros que quase afundaram um projeto político que vem dando certo. A insistência em defender os criminosos é que vai minando sua credibilidade. Porque será? Terão medo que os condenados abram a boca e comprometam mais gente do Partido, e por isso lhes fazem esses afagos?
     A tentativa de José Serra de usar este caso no segundo turno das eleições municipais paulistanas, não vai funcionar, já que o próximo caso a ser julgado pelo STF é o chamado mensalão mineiro, que não passa de uma cópia do petista, só que a nível estadual envolvendo o PSDB de Eduardo Azeredo, então governador de Minas, na compra de apoio de parlamentares estaduais.
     No Distrito Federal já tivemos o mensalão do DEM, que resultou na prisão e destituição do então governador Roberto Arruda. Assim, também ACM Neto, no segundo turno da eleição em Salvador, não poderá alegar que o mensalão é uma prática exclusiva do PT.
     A eleição de Joaquim Barbosa como presidente do STF, abre perspectivas ótimas de que essas práticas corruptoras sejam efetivamente punidos e extintas no Brasil, moralizando a atividade política. Junto com a lei da ficha limpa, temos dois avanços importantes no aperfeiçoamento da nossa democracia, que devem jogar no limbo uma boa parcela dos corruptos e aventureiros.
     Esperamos que todos eles sejam condenados a penas muito duras, para que sirvam de exemplo aos que ainda acreditam na impunidade para transgredir e enlamear nosso sistema político.
     Seria importante que a justiça aperfeiçoasse seus procedimentos, dando a eles a agilidade necessária para punir também os transgressores municipais, esses muito mais numerosos e difíceis de serem apanhados nas malhas da lei.
Rapidinhas
 
Solidariedade e egoísmo
 
 
     Duas propagandas me chamaram a atenção na televisão: uma de um presunto, em que um sujeito vai comer um sanduíche e quando percebe que sua mulher também quer, vai se virando de costas para impedir que ela coma. A idéia é que ele não compartilhe seu sanduíche com sua própria companheira.
     Em outra, semelhante, da cadeia de lanchonetes Bob's, um adolescente vê uma moça se aproximando, fica todo animado com a possibilidade do encontro, mas depois pensa na possibilidade dela querer um pouco do milk shake que ele está tomando. Então arranca a camisa numa atitude agressiva para espantar a jovem.
     As duas passam a idéia de não compartilhar alimentos com pessoas próximas. Aliás a do milk shake, ainda posta um endereço intitulado incompartilhável.com.
     Tudo muito triste.
     Propaganda explícita de atitudes egoístas como se fossem engraçadas, ou espertas.
     Esses estímulos, que o capitalismo lança a todo instante para a população, são responsáveis pelo crescimento da violência e da intolerância entre as pessoas.
      Que diferença, na minha pequena Rio de Contas. Outro dia fui comer um pastel na lanchonete de Nem, e um senhor ao meu lado se sentiu constrangido por tomar uma Coca-Cola sozinho.
     _O senhor está servido? me perguntou ele, quando eu já ia pagar minha conta.
     Agradeci feliz, certo de que o mundo ainda tinha jeito.
 

Ruas vazias
 
     E por falar em propaganda, já perceberam como os anúncios de automóveis apresentam sempre um modelo novo andando por ruas vazias?
     Que delícia dirigir um desses modelos por uma São Paulo sem ninguém nas ruas!
     Acho que eles devem filmar essas propagandas as cinco horas da manhã, porque a realidade é que enfrentar centenas de quilômetros de engarrafamentos não é agradável em automóvel nenhum. Muito melhor andar de metrô, que apesar de cheio, pelo menos anda.
 
 Pobre Democracia
 
 
     Democracia ainda é um sonho distante nas cidades do interior brasileiro.
     Após os resultados as agressões contra os perdedores se intensificam. Soltam-se foguetes de madrugada na porta de pessoas que votaram no candidato perdedor, carros de som se vangloriam da vitória e convidam os que votaram no eleito para comemorar, como se ele (ou ela) fosse governar apenas para os seus eleitores e tem gente comemorando com um até 2018! Que eu saiba o mandato de prefeitos é de quatro anos, portanto o certo seria até 2016! Será que não sabem fazer contas?
     Mas a julgar pela disposição do TSE de limpar a pauta nos processos contra candidatos, muitos eleitos prometem não chegarem até lá.
     Pior do que isso, pessoas civilizadas e educadas, continuam postando provocações na internet, gente que antes se cumprimentava educadamente, se olha como se fossem inimigos, parentes deixam de se falar, enfim, o que devia ser apenas uma escolha de governantes vira uma guerra sem fim, que atormenta os perdedores de hoje e atemoriza os vencedores, por medo de serem também hostilizados amanhã, se um dia vierem a perder, o que é muito normal numa democracia onde há alternância no poder.
     O nome disso é falta de formação democrática.
     Em lugares civilizados os candidatos se cumprimentam após as eleições, desejam bom governo aos vencedores e a vida segue normal.    
     De que adiantam as lições sobre democracia na escola, ou as propagandas do TSE dizendo que a eleição é uma escolha democrática de governantes, se grande parte da população age desta forma? Que exemplo é dado aos futuros cidadãos, às crianças brasileiras por adultos que tomam essas atitudes?
     Afinal não fingimos (pelo menos) acreditar que a liberdade, a responsabilidade e a tolerância são elementos fundamentais para construir uma verdadeira democracia?
     O exemplo começa em casa!
     A eleição acabou e pronto. Parabéns aos vencedores, que façam alguma coisa pelo bem da sua cidade e vamos trabalhar minha gente.
 
    Poesia da Semana
 
Outubro

 
Trago a nova: eu mudo
lento, e é tudo
Sinto ser assim
por estações: aos turnos
 
Posso voltar
Ao ponto de partida
Mas luto
 
Sei que vem outubro
Flores, fruto de seiva
romperão no mundo
(Trabalho duro:
sugar de pedras,
rasgar os caules,
colher ar puro)
 
Lento e bruto
Eu mudo
Sei que vem
Outubro
 
Nei Duclós

 

 

Europa: a crise é um golpe
 
       Cada vez mais vai ficando claro que a crise na zona do euro é um golpe perpetrado pelo FMI, Banco Central Europeu e União Européia, capitaneado pelo governo conservador da Alemanha, liderado por Angela Merkel, para destruir as conquistas dos trabalhadores europeus e transferir renda dos mais pobres para os mais ricos.
       Nada justifica jogar na miséria grande parte da população para salvar bancos que especularam irresponsavelmente, injetando neles bilhões de euros às custas da vida de povos que tinham um bom nível de vida.
     O empobrecimento da população e a retirada de seus direitos trabalhistas, beneficiando os bancos é uma brutal trasnferência de renda, planejada pelos conservadores, também, para quebrar o poder dos sindicatos, que já preparam uma greve internacional em todo o bloco.
     O primeiro país a sofrer com a crise, desencadeada nos Estados Unidos, foi a Islândia, que não seguiu nenhuma das recomendações do FMI e já se recupera satisfatoriamente, sem prejudicar seu próprio povo.
     Veja, abaixo, artigo de Salim Lamrani transcrito do site Opera Mundi.
 

Islândia mostrou o caminho ao rechaçar a austeridade

País nórdico recusou receituário do FMI, deixou bancos quebrarem e condenou os responsáveis pela crise
     Quando, em setembro de 2008, a crise econômica e financeira atingiu a Islândia – pequeno arquipélago no norte da Europa, com uma população de 320 mil habitantes –, o impacto foi desastroso, tal como no resto do continente. A especulação financeira levou os três principais bancos à falência, de modo que seus ativos representavam uma soma dez vezes superior ao PIB do país, com uma perda líquida de 85 bilhões de dólares. A taxa de desemprego se multiplicou por nove entre 2008 e 2010, ao passo que, antes, o país gozava de pleno emprego.
     A dívida da Islândia representou 900% do PIB e a moeda nacional se desvalorizou 80% em relação ao euro. O país caiu em uma profunda recessão, com uma diminuição do PIB em 11% em dois anos.
     Em 2009, quando o governo quis aplicar as medidas de austeridade exigidas pelo FMI em troca de uma ajuda financeira de 2,1 bilhões de euros, uma forte mobilização popular o obrigou a renunciar. Nas eleições antecipadas, a esquerda ganhou a maioria absoluta no Parlamento.
     No entanto, o novo poder adotou a lei Icesave – cujo nombre provém do banco online que quebrou e cujos correntistas eram, na maioria, holandeses e britânicos – com a finalidade de reembolsar os clientes estrangeiros. Essa legislação obrigava os islandeses a reembolsar uma dívida de 3,5 bilhões de euros (40% de seu PIB) – nove mil euros por habitante – em quinze anos e com uma taxa de juros de 5%. Diante dos novos protestos populares, o presidente se recusou a assinar o texto parlamentar e o submeteu a um referendo. Em março de 2010, 93% dos islandeses rechaçaram a lei sobre o reembolso das perdas do Icesave. Quando foi submetida novamente a referendo em abril de 2011, 63% dos cidadãos voltaram a rechaçá-la.
     Uma nova Constituição, redigida por uma Assembleia Constituinte de 25 cidadãos eleitos por sufrágio universal entre 522 candidatos, composta por nove capítulos e 114 artigos, foi adotada em 2011. Ela prevê o direito à informação, com acesso público aos documentos oficiais (Artigo 15), a criação de uma Comissão de Controle da Responsabilidade do Governo (Artigo 63), o direito à consulta direta (Artigo 65) – 10% dos eleitores podem pedir um referendo sobre as leis votadas pelo Parlamento –, assim como a nomeação do primeiro-ministro pelo Parlamento.
     Assim, ao contrário das outras nações da União Europeia na mesma situação, que aplicaram escrupulosamente as recomendações do FMI que exigiam medidas de austeridade severas, como na Grécia, Irlanda, Itália ou Espanha, a Islândia escolheu uma via alternativa. Quando, em 2008, os três principais bancos do país – Glitnir, Landsbankinn e Kaupthing – desmoronaram, o Estado islandês se negou a injetar neles fundos públicos, tal como havia feito o resto da Europa. Em vez disso, realizou sua nacionalização.
     Do mesmo modo, os bancos privados tiveram que cancelar todos os créditos com taxas variáveis que superavam 110% do valor dos bens imobiliários, o que evitou uma crise de subprime, como nos Estados Unidos. Por outro lado, a Corte Suprema declarou ilegais todos os empréstimos ajustados a divisas estrangeiras que foram outorgados a particulares, obrigado assim os bancos a renunciarem a seus créditos em benefício da população.
     Quanto aos responsáveis pelo desastre – os banqueiros especuladores que provocaram o desmoronamento do sistema financeiro islandês –, não se beneficiaram da mansidão que se mostrou diante deles no resto da Europa, onde foram sistematicamente absolvidos. Com efeito, Olafur Thor Hauksson, Procurador Especial nomeado pelo Parlamento, os perseguiu e prendeu, inclusive ao ex-primeiro-ministro Geir Haarde.
     Os resultados da política econômica e social islandesa têm sido espetaculares. Enquanto a União Europeia se encontra em plena recessão, a Islândia se beneficiou de uma taxa de crescimento de 2,1% em 2011 e prevê uma taxa de 2,7% para 2012, além de uma taxa de desemprego de 6%. O país até se deu ao luxo de realizar o reembolso antecipado de suas dívidas ao FMI.
     O presidente islandês Olafur Grímsson explicou este milagre econômico: “A diferença é que, na Islândia, deixamos os bancos quebrarem. Eram instituições privadas. Não injetamos dinheiro para salvá-las. O Estado não tem por que assumir essa responsabilidade”.
     Agindo contra qualquer prognóstico, o FMI saudou a política do governo islandês – o qual aplicou medidas totalmente contrárias às que o Fundo preconiza –, que permitiu preservar “o precioso modelo nórdico de proteção social”. De fato, a Islândia dispõe de um índice de desenvolvimento humano bastante elevado. “O FMI declara que o plano de resgate ao modo islandês oferece lições nos tempos de crise”. A instituição acrescenta que “o fato de que a Islândia tenha conseguido preservar o bem-estar social das unidades familiares e conseguir uma consolidação fiscal de grande envergadura é uma das maiores conquistas do programa e do
Salim Lamrani
 governo islandês”.
     No entanto, o FMI omitiu omitiu a informação de que esses resultados só foram possíveis porque a Islândia rechaçou sua terapia de choque neoliberal e elaborou um programa de estímulo econômico alternativo e eficiente.
     O caso da Islândia demonstra que existe uma alternativa crível às políticas de austeridade que são aplicadas na Europa. Estas, além de serem economicamente ineficientes, são politicamente custosas e socialmente insustentáveis. Ao escolher colocar o interesse geral acima do interesse dos mercados, a Islândia mostra o caminho ao resto do continente para escapar do beco sem saída.
      Num momento como este, em que a União Européia investe contra a democracia e as conquistas sociais, a outorga do prêmio Nobel da Paz a UE, é no mínimo uma ironia e apenas confirma a tendência direitista dos que decidem sobre esta premiação. Uma lástima.
 

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O Paiz
 
 
Dobrando a esquina
 
 
     Os últimos redutos da direita no Brasil, estão sitiados pelos partidos da base governista.
     Principalmente São Paulo e Salvador, tornaram-se disputas ferrenhas, onde ainda há uma polarização ideológica entre direita e esquerda. Pode-se acrescentar ainda Manaus, onde um dos maiores adversários dos governos do PT e desafeto pessoal do ex-presidente Lula, Arthur Virgílio Neto, vai para o segundo turno com a deputada Vanessa Graziotin, do PCdoB.
     Lula e Dilma devem jogar todo o peso de sua influência nessas eleições, para jogar uma pá de cal sobre as últimas lideranças neoliberais brasileiras, avançando para a extinção dos partidos que representam as idéias neoliberais no Brasil, PSDB e DEM.
     De resto houve uma mistura tão grande na chamada "base aliada", que gente que ontem era inimiga jurada, hoje faz aliança alegremente sob a bandeira da tal base governista. Não dá mais pra identificar ideologias.
     Na verdade a estratégia do PT, e mais especificamente de Lula, que vem se revelando um grande estrategista político, é justamente diluir os adversários dentro de uma imensa base sem ideologia definida, enquanto fortalece sua sigla partidária, e vai levando ao desespero os que ainda insistem em fazer oposição às suas bem sucedidas políticas de desenvolvimento com distribuição de renda.
     Com isso, a conjuntura política do Brasil parece estar dobrando uma esquina, deixando para trás a velha rivalidade entre partidos de esquerda e direita, e enveredando por novas demandas da sociedade, que agora exige um aperfeiçoamento democrático, focando suas exigências no combate à corrupção, a criminalidade, lutando pela inclusão de setores antes discriminados da sociedade, pela igualdade de gênero e raça, pelo fim da pobreza, pelo funcionamento rápido e equânime da justiça, pelo aperfeiçoamento do sistema de ensino voltado para a criatividade e a inovação, que tanto nos faz falta para atingirmos um patamar de país desenvolvido.
     O ataque frontal aos últimos bastiões da direita, é necessário para virar esta página e permitir ao país se postular novos objetivos, se quisermos alcançar as metas de desenvolvimento anunciadas e desejadas por todos nós.
     Dentro dessa nova realidade vem se destacando o PSOL, que tem sabido incorporar toda essa ânsia de aperfeiçoamento democrático com a construção de uma sociedade mais complexa e mais voltada para o conhecimento. Seus candidatos passaram a representar aquilo que o PT representou no passado, uma alternativa de futuro, e já vem disputando posições em cidades importantes, onde a geléia geral da tal base aliada já vai perdendo o sentido, por não ter mais nada de novo a propor.
     Assim, enquanto o PT vai cumprindo seu papel histórico de virar uma página da política brasileira, deixando de ser uma antítese ao poder da direita e passando a ser uma síntese de tudo que sobrou, novas teses vão se formando, dentro do processo dialético da civilização brasileira, que caminha a passos largos para recuperar o tempo perdido e ocupar seu lugar num mundo que muda rapidamente.
        
     
Rapidinhas
 
Eleições em Rio de Contas geram impasse
 
 
     A vitória do atual prefeito em Rio de Contas, pela estreita margem de 3% só aprofundou a divisão na cidade.
    Nem mudança, nem aceitação da continuidade.
    Rio de Contas amanheceu mais dividida do que já estava, prenunciando dias difíceis para uma administração que já era rejeitada por grande parte dos eleitores.
     O desafiante, Dr. Cristiano, cometeu alguns erros graves no final da campanha, colocando pessoas cromprometidas com o passado coronelista da cidade para falar no palanque, gente que não era candidata a nada e que só representava o passado e que assustou um pouco um eleitorado que pedia por mudanças.
     As confusões entre o PT local e o PT estadual, fizeram com que a eleição de vereadores permanecesse indefinida, até que a justiça resolva a questão, sobre se os candidatos do PT pertencem à chapa do 55 ou do 12. Enquanto isso, permanece o impasse sobre quem serão os representantes eleitos.
Guerra e paz
 
 
 
     Enquanto o mundo parece continuar apostando na guerra para resolver seus problemas, o Brasil insiste numa política de paz, que já é tradicional na nossa diplomacia.
     Agora mesmo, Síria e Turquia estão às portas de uma nova guerra, que só vai levar morte, destruição e sofrimento para seus países, enquanto Brasil, Uruguai e África, por iniciativa brasileira, tentam reativar a Zona de Paz do Atlântico Sul, uma proposta para manter afastado de nós esse flagelo primitivo, que significa tentar resolver as diferenças pela violência.
     Os países belicistas, acusam a política brasileira de ficar em cima do muro, quando se trata de conflitos internacionais, mas nossa história prova que temos razão.
     Agora mesmo o presidente Santos, da Colômbia, se rendeu ao nosso pragmatismo e resolveu abrir negociações com as FARC, grupo guerrilheiro que mantém aquele país em estado de guerra há 50 anos.
     Esperamos que as negociações sejam bem-sucedidas e que a paz desça definitivamente sobre nosso continente, que precisa canalizar suas energias para o crescimento e o progresso sustentável.
    
Poesia da Semana
 
        TABACARIA
    Não sou nada.
    Nunca serei nada.
    Não posso querer ser nada.
    À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
    Janelas do meu quarto,
    Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
    (E se soubessem quem é, o que saberiam?),
    Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
    Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
    Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
    Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
    Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
    Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
    Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
    Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
    E não tivesse mais irmandade com as coisas
    Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
    A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
    De dentro da minha cabeça,
    E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
    Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
    Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
    À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
    E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
    Falhei em tudo.
    Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
    A aprendizagem que me deram,
    Desci dela pela janela das traseiras da casa.
    Fui até ao campo com grandes propósitos.
    Mas lá encontrei só ervas e árvores,
    E quando havia gente era igual à outra.
    Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?
    Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
    Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
    E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
    Gênio? Neste momento
    Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
    E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
    Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
    Não, não creio em mim.
    Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
    Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
    Não, nem em mim...
    Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
    Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
    Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
    Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
    E quem sabe se realizáveis,
    Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
    O mundo é para quem nasce para o conquistar
    E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
    Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
    Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
    Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
    Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
    Ainda que não more nela;
    Serei sempre o que não nasceu para isso;
    Serei sempre só o que tinha qualidades;
    Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
    E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
    E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
    Crer em mim? Não, nem em nada.
    Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
    O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
    E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
    Escravos cardíacos das estrelas,
    Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
    Mas acordamos e ele é opaco,
    Levantamo-nos e ele é alheio,
    Saímos de casa e ele é a terra inteira,
    Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
    (Come chocolates, pequena;
    Come chocolates!
    Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
    Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
    Come, pequena suja, come!
    Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
    Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
    Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
    Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
    A caligrafia rápida destes versos,
    Pórtico partido para o Impossível.
    Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
    Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
    A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
    E fico em casa sem camisa.
    (Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
    Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
    Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
    Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
    Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
    Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
    Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
    Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
    Meu coração é um balde despejado.
    Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
    A mim mesmo e não encontro nada.
    Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
    Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
    Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
    Vejo os cães que também existem,
    E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
    E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
    Vivi, estudei, amei e até cri,
    E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
    Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
    E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
    (Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
    Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
    E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
    Fiz de mim o que não soube
    E o que podia fazer de mim não o fiz.
    O dominó que vesti era errado.
    Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
    Quando quis tirar a máscara,
    Estava pegada à cara.
    Quando a tirei e me vi ao espelho,
    Já tinha envelhecido.
    Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
    Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
    Como um cão tolerado pela gerência
    Por ser inofensivo
    E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
    Essência musical dos meus versos inúteis,
    Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
    E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
    Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
    Como um tapete em que um bêbado tropeça
    Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
    Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
    Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
    E com o desconforto da alma mal-entendendo.
    Ele morrerá e eu morrerei.
    Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
    A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
    Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
    E a língua em que foram escritos os versos.
    Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
    Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
    Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
    Sempre uma coisa defronte da outra,
    Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
    Sempre o impossível tão estúpido como o real,
    Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
    Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
    Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
    E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
    Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
    E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
    Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
    E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
    Sigo o fumo como uma rota própria,
    E gozo, num momento sensitivo e competente,
    A libertação de todas as especulações
    E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
    Depois deito-me para trás na cadeira
    E continuo fumando.
    Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
    (Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
    Talvez fosse feliz.)
    Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
    O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
    Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
    (O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
    Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
    Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
    Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
Fernando Pessoa