Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Eles

A situação no nosso mundo não é das melhores. Estamos no fim de uma era e no limiar de outra.
A era que se finda é a das grandes nações armadas, dos exércitos, das guerras por interesses comerciais, do consumismo em escala planetária, da destruição do meio ambiente. É a era do capitalismo, com sua lógica implacável da acumulação e suas terríveis consequências, uma delas o imperialismo, que devasta e saqueia nações, impondo o terror em nome de um discurso cínico, baseado na democracia.
O final dessa era se aproxima, não porque ela seja injusta, porque outras eras de profunda injustiça foram muito mais longas, mas porque a ciência e a tecnologia não param de avançar, integrando os povos, que assim vão se tornando um só, e mostrando a todos que a natureza, que nos alimenta e dá vida, está sendo rapidamente destruída por esse modelo.
Mas toda era que se inicia, convive ainda com a que termina e isto é o que está acontecendo.
A integração dos povos se opõe ao nacionalismo imperial mas enquanto barreiras entre os povos caem, algumas nações ainda tentam reafirmar o velho modelo militarista.
Vejam a tragédia do Haiti. Enquanto o mundo se mobiliza na solidariedade àquele povo imensamente sofrido, a potência hegemônica decadente, tenta reafirmar o seu poder, se aproveitando covardemente da tragédia para ocupar um país indefeso.
Não há nenhuma justificativa para a ocupação militar que os Estados Unidos estão implementando no Haiti, enviando milhares de soldados, em flagrante desrespeito ao mandato da ONU, cuja liderança foi oficialmente entregue ao Brasil, e que já mantém tropas suficientes para controlar a situação.
Tudo é feito no maior desrespeito e arrogância, como se eles fossem os donos do mundo, desconsiderando fronteiras e soberanias.
Sem consultar ninguém ocuparam o aeroporto, o palácio presidencial, e resolveram agora "escoltar" os comboios da ONU.
Esta é a proposta de Barack Obama e de Hillary Clinton para a América Latina: a ocupação e a re-colonização do continente.
Começaram patrocinando disfarçadamente o golpe de estado em Honduras. Foi um teste, uma experiência com um novo modelo, um golpe civil, com apoio do Congresso e dos tribunais, controlados pelas mesmas famílias privilegiadas que dominam há muitos anos esses pequenos países, com apoio dos Estados Unidos.
Essa aliança de privilegiados latino-americanos com os interesses imperiais é antiga e nos mantém sempre no atraso e na submissão.
Quando as oligarquias daqui começaram a cair, nas décadas de 50 e 60, em plena guerra fria, os americanos não hesitaram em derrubar os governos eleitos e impor ditaduras militares que implantassem a ferro e fogo o capitalismo dependente que eles precisavam para dominar nossos mercados.
Agora as oligarquias estão novamente caindo, derrotadas nas urnas por políticos de esquerda, formados na luta contra as ditaduras, que mantém seus compromissos democráticos, mas afastam-se do modelo colonial obediente que eles pretendem impor eternamente a nós.
Desta vez, porém, o império não se disfarça mais atrás de um discurso democrático, usado no tempo da guerra fria para se contrapor ao comunismo, mas usa a guerra contra o narcotráfico e a guerra contra o terror, para justificar suas invasões e saques.
Já estão nas nossas fronteiras, com suas bases na Colômbia. provocam a China, vendendo mísseis para Taiwan. provocam a Coréria do Norte, patrocinando a agressividade da Coréia do Sul, provocam o Irã, armando até os dentes o governo genocida de Israel, estão abrindo frentes de guerra em todos os continentes, como se a guerra fosse a única atividade lucrativa que lhes resta, depois da debacle econômica e na medida em que vão sendo superados na ciência e na inovação tecnológica, por outros países.
Temo pela humanidade, com esse gigante ferido, querendo se afirmar diante do mundo.
Enquanto isso, no Brasil, o debate político se amesquinha, nas propostas tacanhas do Partido dos Trabalhadores (e das outras forças que o acompanham no poder), que não tem coragem de propor um modelo alternativo ao capitalismo, que seja democrático e auto-sustentável. Vivem numa neurose entre a necessidade de agradar os empresários que financiam suas campanhas (e com medo de serem desestabilizados por eles) e a nostalgia do socialismo autoritário, com seus partidos únicos e suas ditaduras burocráticas.
Do outro lado, a velha elite quer apenas continuar acumulando, sem um projeto nacional ou mesmo de integração com outros países, digno deste nome.
Marina Silva tem aparecido como a novidade, com a capacidade de superar o impasse filosófico, mas a tentação de se unir às forças conservadoras para buscar apoio contra os projetos da esquerda atual, podem comprometer definitivamente seu projeto político.
Na verdade, temos dois projetos no mundo, atualmente:
Um, conservador, visa manter e aprofundar a acumulação capitalista, através da aumento contínuo da produção, da competição entre as nações e da destruição do planeta, num ambiente de desigualdades sociais, miséria e guerras.
O outro, visa integrar os povos, construir uma economia dinâmica, porém regulada e submissa aos interesses sociais e ambientais dos povos, respeitando e valorizando a diversidade.
Não é uma luta fácil, porque trata-se de um princípio democrático contra um princípio autoritário.
O império tenta se manter através do domínio militar cada vez maior. Pretendem ocupar o mundo inteiro e dominá-lo militarmente. Mas terão recursos para tanto? No momento quem os desafia militarmente são os fundamentalistas muçulmanos, especialmente a Al Qaeda, que tem sido bem sucedida em mantê-los ocupados no oriente médio, nos dando um pouco de folga.
Mas parece que Barack Obama está disposto a encerrar essa trégua e a ocupação do Haiti é mais uma prova disso.
Nosso próximo presidente terá que lidar com esse enorme desafio.


Abraço a todos

Ricardo Stumpf