Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 25 de abril de 2010

Histórias de outras vidas (8)

                                                        
                                A HORA DA PIADA

Era uma repartição pública em Brasília. Corria o ano de 2004. A sala pequena enjaulava 25 funcionários que não tinham muito o que fazer.
Na verdade eram duas seções dentro de uma sala, dividida ao meio por um corredor. Um chefe de cada lado, distribuindo tarefas e tratando de conter seus subordinados quando não havia muito serviço, o que era bem freqüente.
No final do corredor, a sala da diretora, uma mulher alta, dos seus 60 anos, tratava todos como se fossem crianças e esperava de todos uma fidelidade canina, pessoal mesmo, a ela, a grande benfeitora.
Os que haviam entrado no último concurso, gente pós-graduada, se espantava com aquele tipo de relação primitiva, difícil mesmo de ser contestada, de tão desrespeitosa: uma piração.
Os dias transcorriam sufocantes até que numa sexta-feira, os chefes haviam saído mais cedo e alguém contou uma piada. Todos riram e pareceu que pela primeira vez o ambiente se descontraiu. Alguém lembrou que já era tarde e podiam pedir uma pizza, e assim uma espécie de happening se instalou, com as pessoas se aproximando e conversando, pela primeira vez, subvertendo a ordem rígida da burocracia e da loucura inflada do ego da diretora, com seu implacável autoritarismo maternal que dominava havia muitos anos, parte daquela infeliz comunidade. Os antigos também gostaram da novidade, mas à toda hora iam até a porta, dar uma espiada para ver se ela não vinha no corredor.
Outras sextas-feiras se sucederam e aquela virou uma espécie de hora do relaxamento das tensões da semana. Até os chefes começaram a participar e um dia alguém sugeriu que todos contribuíssem para que toda semana fossem comprados salgados e refrigerantes, oficializando assim naquele horário um momento de congraçamento.
Um dos chefes, porém, zeloso de sua fidelidade à grande mãe, tratou de prestar-lhe conta do que estava acontecendo à revelia do seu controle e liderança.
Ao ouvir o relato do seu informante, a velha mãe-patroa calou-se, pensativa, mas logo recobrou seu insuperável senso prático e decidiu:
_Não há nada de errado no que eles estão fazendo. Acho que isso pode ser bom para o trabalho. Vamos aderir ao movimento deles e eu também vou colaborar com a pizza. Você fica encarregado de encomendar a cada funcionário uma piada, que deve ser escrita e depois de lida, cada qual na sua hora, deverá ser entregue a mim, para ser arquivada.
O chefe falou, mas ninguém acreditou muito, tão acostumados já estavam ao seu momento. Na sexta-feira, porém, lá estava ela, na hora certa.
A pizza chegou, aquele dia enriquecida com mais salgados e refrigerantes. Ela bateu palmas e fazendo todos se calarem, ordenou feliz:
Hora da piada!