Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 12 de setembro de 2010

Rapidinhas

Nosso lar    

No Rio, esta semana, fui assistir ao filme Nosso lar, baseado no livro de Chico Xavier, psicografado a partir das revelações do espírito André Luiz.
     O filme conta a história de André, um médico brasileiro e relata o que acontece com ele após a sua morte até chegar em Nosso lar, uma cidade espiritual que flutua sobe a Terra. Mostra não apenas a cidade, com seus edifícios e espaços abertos, como explica o seu funcionamento e como se dá a recuperação dos que morrem, a vida e o aprendizado na cidade nas alturas e o processo de decisão para reencarnar novamente, deixando bem clara a filosofia espírita do aprendizado, da tolerância e da consciência evolutiva.
     A história se passa no início do século XX e uma cena muito emocionante é a chegada dos judeus, mortos na segunda guerra, à cidade.
     Tudo muito bonito: história, fotografia, efeitos especiais, trilha sonora.
     Vale a pena, mesmo para quem não é espírita. É uma superprodução brasileira e as filas estão imensas. Aliás há muitos anos eu não via fila em cinemas tradicionais (como no Roxy em copacabana, onde fui assistir). Ingresso na fila e só para o dia seguinte.
     Veja entrevista com o diretor e trailer do filme, clicando nos links abaixo:
http://cinema.uol.com.br/ultnot/2010/09/01/temos-o-direito-de-falar-de-tudo-no-cinema-inclusive-no-que-acontece-depois-da-vida-diz-o-diretor-de-nosso-lar.jhtm
http://paginadocinema.com.br/reportagens/index/95

Nosso 11 de setembro

     Pois é amigos, escrevo na véspera do 11 de setembro e estou me preparando para uma enxurrada de imagens do ataque terrorista ao World Trade Center em Nova Iorque. Certamente vão mostrar as imagens de sofrimento de todos os que morreram e dos habitantes da capital financeira do império americano, atingida no seu coração pelos fanáticos islâmicos.
     É claro que não vão mostrar as vítimas civis dos bombardeios americanos no Iraque, no Afeganistão, no Paquistão, na Palestina e em tantos países que os americanos e seus aliados estão sempre atacando e bombardeando.
     Não apoio os terroristas que derubaram as torres gêmeas, porque sou contra qualquer tipo de terrorismo (ataques a civis inocentes), mas para mim 11 de setembro é dia de lembrar outro atraque terrrorista, este perpetrado pelos americanos, que patrocinaram o golpe no Chile e o assassinato do seu presidente constitucional, Salvador Allende, atingindo em cheio o coração da democracia latino-americana.
     Aqui se faz, aqui se paga.
     Para quem quiser saber mais, sobre o 11 de setembro, vale a pena ler o artigo Setembro se chama Allende, (em espanhol) do historiador e jornalista chileno, Mário Amorós, clicando no link abaixo.
http://www.diarioreddigital.cl/index.php?option=com_content&view=article&id=1222:septiembre-se-llama-allende&catid=40:opinion&Itemid=61

Virada em Brasília

       Finalmente parece que Brasília vai ter um governador à sua altura.
       O baiano Agnelo Queiroz, médico, radicado em Brasília há muitos anos, passou nas pesquisas o eterno candidato Joaquim Roriz, ficha suja que insiste em se manter na campanha, apesar de sua candidatura ter sido recusada pelo TRE e pelo TSE. Mas o apego de Roriz (que já foi governador quatro vezes) ao poder é tanto, que ele se recusa a indicar outro nome e permanece na disputa, amargando uma queda expressiva nas intenções de voto dos brazilienses.
       Assim, parece que se encerra uma era de populismo e corrupção no DF e há uma boa chance de nos livrarmos para sempre desse presentinho que José Sarney nos deu, quando nomeou Roriz governador biônico, antes da Constituinte de 1988. De lá pra cá ele criou um monte de cidades periféricas, verdadeiros currais eleitorais para se manter no poder, comprometendo todo o planejamento da Capital da República para obter benefícios políticos para ele e sua camarilha, hoje toda enrolada com a justiça.
     Chegou a hora do povo de Brasília retomar o controle da sua vida política e do seu destino.
   Libertação
    


     Prezados amigos.

     Semana passada escrevi sobre o Cena Contemporãnea, festival de teatro internacional, que ocorre em Brasília todos os anos. Dentre as cinco peças que pude assistir, comentei a Balada do Palhaço, de Plínio Marcos, cujo texto final me encantou.
     O texto trata da disputa entre idealismo e pragmatismo, tão atual nesse momento em que as utopias foram todas enterradas pelo capitalismo, em nome de uma realidade que se mostra cada vez mais absurda.
Mas ao contrário da ideologia dominante nos dias de hoje, Plínio faz a apologia do idealismo, não como uma construção utópica de coisas inantigíveis, mas como a matéria prima da verdade, como o único caminho para a libertação da humanidade da sua condição de submissão às realidades dadas como naturais.
     Enquanto o pragamtismo rasga nossos sonhos em nome de uma realidade medíocre, enquanto nossa sociedade abandona o caminho da transformação e envereda pelo da gestão de um mundo que poderia ser muito diferente, mas que nunca muda, Plínio reafirma o contrário.
     Eles nos dá um texto, que embora sem título específico (é apenas parte do texto completo), é uma verdadeira oração à vocação, à liberdade, à força criadora e transformadora que existe em cada ser humano.
     O palhaço Bobo Plin, ao abandonar o circo na última cena, escolhe seu ideal, em detrimento das promessas de ganhos feitas pelo dono do circo, sem dúvida representando o empresário com sua ideologia pragmática.
     O texto, de 1986, é de uma incrível clarividência porque antevê o que estava para acontecer na sociedade brasileira e mundial, no início da rolo compressor neoliberal dos anos 90.
     E então, amigo leitor, se você é daqueles que está na dúvida entre sua vocação e o pragamatismo de um bom emprego, leia e tire suas conclusões.

(Fala do palhaço Bobo Plin na cena final de Balada de um Palhaço)

Ó ideal

Que estás no meu céu interior
Verdade viva
Que faz da minha alma
Imortal
Para que tua tendência
Evolutiva
Seja realizada,
Para que teu nome
Se afirme pelo trabalho
Para que tua revelação
Seja manifestada a cada
Espetáculo
A cada espetáculo concede-me
A idéia criadora
Que assim como ela está
Entendida no meu coração
Seja entendida no meu corpo.


Ó ideal

Preserva-me dos reflexos
da matéria
Que eu compreenda
Que o sofrimento benfeitor
Está na origem da minha
Encarnação
Livra-me do desespero
E que teu nome seja
Santificado
Pela minha coragem
Na prova.


Ó ideal

Faze com que eu não diferencie
O fracasso do sucesso
E perdoa a minha
Dificuldade de comunicação
Assim como eu perdôo
Os que não tem ouvidos de ouvir
Nem olhos de ver

Ó ideal

Destrói meu orgulho
Que poderia afastar-me
Da tua luz-guia
Nutre meu devotamento
Porque és,
Ó ideal
A realeza, o equilíbrio, a força
De minha intuição.

Plínio Marcos
Histórias de outras vidas (28)

    Reencontro

     Corria o ano de 1996, quando eu resolvi participar da conferência da ONU de habitação, Habitat II, em Istambul, na Turquia.
     Formamos um grupo de dez arquitetos, entre amigos da Bahia e de Brasília e fomos. O pessoal de Brasília arranjou a agência de viagens, que conseguiu ótimos descontos, e ficamos 10 dias em Istambul.
     Ao entrar na cidade uma emoção me subiu ao peito e fui reconhecendo tudo, como se já tivesse vivido ali. Ao passar embaixo de uns arcos de pedra de um aqueduto antigo, o sentimento foi muito forte, embora eu não entendesse o que estava acontecendo comigo. O hotel em que ficamos ficava perto desses arcos.
     Istambul é uma cidade linda, com 12 milhões da habitantes, cortada ao meio pelo estreito de Bósforo, com suas águas limpíssimas e azuis, que divide a Europa da Ásia. Assim a cidade se espalha pelos dois continentes, que se ligam por muitas pontes e por serviços de barcas de passageiros parecidas com as do Rio de Janeiro.
     Nos primeiros dias tentei participar da conferência, mas era uma chatice, cheia de autoridades de todo o mundo dizendo coisas que eu estava cansado de saber depois de tantos anos trabalhando com habitação popular.
     Então fui ver a igreja de Santa Sofia. Emoção total!
     A antiga igreja fica no meio de um parque, no centro de um gramado com pequenas ondulações. Passei um dia inteiro só olhando por fora. Sentava de um lado e ia vendo todos os detalhes, passsava pra outro lado e ia assim bebendo as informações que meus olhos conseguiam captar, sobre sua técncica construtiva, o que era mais antigo e mais novo, o que era um acréscimo, etc.
     No segundo dia me animei a entrar. A imensa cúpula de tijolos era tão alta que eu calculei que um edifício de 22 andares caberia debaixo dela, dentro da igreja. Ladeiras laterais abobadadas (em forma de túnel) levavam a pavimentos superiores.
     Me informando sobre a construção, soube que ela foi mandada fazer por Constantino, o imperador que dividiu o Império Romano em Ocidente e Oriente, dividindo também a igreja cristã em Católica Apostólica Romana e Ortodoxa (oriental). Isso ococrreu no ano 300 da era cristã.
     Portanto, a igreja teria mais de 1700 anos se não tivesse sido destruída por um incêndio e reconstruída por volta do ano 500. Pouca diferença. A velha igreja de Santa Sofia tem aproximadamente 1500 anos e seus tijolos ainda estão lá sustentando a maravilhosa cúpula, obra fantástica da arquitetura do mundo antigo.
     Com a conquista de Constantinopla (antigo nome de Istambul) pelo muçulmanos, a igreja foi transformada em mesquita, foram então construídos os quatro minaretes que a circundam e recobertos por um espesso reboco os maravilhosos mosaicos feitos pelos romanos que representavam o imperador como Cristo e outros membros da corte como santos. Quando estive lá Hagia Sofia já não era uma mesquita, mas um museu e o reboco estava sendo removido por restauradores e os desenhos antigos estavam começando a aparecer. Incrível.
     Alguns dias depois, acordei de madrugada com a sensação de que estava ouvindo uma música muito bonita. Mas não havia nada. Acordei meu companheiro de quarto e perguntei se ele tinha ouvido alguma coisa. Ele disse que não e me mandou dormir.
     Na noite seguinte acordei com a música de novo, mas desta vez ela ainda estava lá. Acordei meu colega e ele disse que também a ouvia. Fiquei encantado com a beleza, cantada por uma voz muito suave, as quatro da manhã, parecendo vir de muito longe.
     No café da manhã, uma jornalista brasileira me disse que também ouvira a música e me explicou que era o sacerdote muçulmano fazendo a primeira chamada para rezar, numa mesquita que havia alguns quarteirões do hotel.
     Na outra manhã, já intrigado com aquilo, resolvi ir conferir. Assim que clareou, por volta das cinco horas, saí por uma estrreita rua lateral que descia em direção à mesquita, uma cópia da Santa Sofia como são todas as mesquitas.
     Lá chegando fiquei observando como as pessoas agiam para entrar: tiravam os sapatos e lavavam os pés e as mãos numa fonte que havia na entrada. Os calçados ficavam na porta e ninguém mexia neles.
     Fiz do mesmo jeito e entrei, temeroso pelos muitas coisas ruins que ouvimos sobre o islamismo no Brasil, mas encontrei uma atmosfera de paz e silencio. Grupos de mulheres se reuniam na parte superior, enquanto no centro se concentravam os homens. Todos pareciam discutir os ensinamentos do Alcoorão, a Bíblia muçulmana.
     Fiquei muito impressionado com o tapete gigante que cobria todo o piso da mesquita, sem que eu pudesse encontrar uma só emenda. Como podem fabricar aquilo? Meus olhos de arquiteto também vasculharam seu interior e se maravilharam com o lustre, um aro circular, onde se prendem pequenas lâmpadas, pendurado por finos cabos de forma que parece flutuar sobre as nossas cabeças.
     Permaneci algum tempo no interior do templo, orando e meditando junto com aqueles homens e mulheres, que não me olharam, não me perguntaram nada, me deixando completamente à vontade.
     Dentro havia mulheres com vestes tradicionais, cobrindo-se dos pés à cabeça, todas de preto, outras com roupas cinzas mostravam os braços e ainda outras vestidas normalmente, com saias ou calças compridas, blusas coloridas, mas todas elas com o lenço na cabeça. Na Turquia não se usa véu para esconder o rosto.
     Novamente aquele sentimento de familiaridade tomou conta de mim e me emocionei mais uma vez.
     Dali fomos para a Grécia e vimos muitas coisas bonitas, mas nada que mexesse comigo daquele jeito.
     Até hoje sonho com Istambul, com suas torres às margens de águas tão azuis. Quando leio sobre os terroristas islâmicos, tenho certeza de que eles não tem nada a ver com aquela paz que eu senti. São extremistas, que usam o nome de Deus para matar inocentes, na sua luta contra os Estados Unidos.
     O Islã, na sua essência, não tem nada com isso. Acho que sei disso com muita profundidade. Acho que ja vivi lá um dia, em alguma vida e amei muito aquele lugar, aquela gente, aquela religião.

Boa segunda-feira à todos

Ricardo Stumpf Alves de Souza