Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

sábado, 28 de janeiro de 2012

Rapidinhas
Desabamentos e responsabilidades

     Como sempre, o CREA, órgão encarregado de fiscalização de obras em todo o Brasil, aparece depois que os prédios desabaram no Rio, para explicar, com a maior cara de pau, que havia obras sem licença no prédio mais alto.
     E porque o Crea não fiscalizou?  Cobram de que cada profissional uma taxa anual e outra taxa por cada projeto, para manter uma enorme rede de fiscais por todo o Brasil, mas só vão onde sabem que existe um profissional responsável, porque lá é fácil cobrar a taxa sobre o projeto. Se tornaram um órgão meramente arrecadador, por isso mais de 90% das obras no Brasil não contam com um profissional técnico.
     Estão interessados apenas em cobrar suas taxas e não fiscalizam nada, essa é a verdade.
     Se havia obras ilegais, o Crea devia ser chamado para explicar sobre sua responsabilidade em não ter fiscalizado e não para explicar as causas do desabamento. Ainda bem que nós, arquitetos, conseguimos sair do Crea, fundando o Conselho de Arquitetura e Urbanismo, CAU.
     Além disso, ouvi um monte de bobagens sobre as possíveis causas do desabamento, pela televisão, algumas ditas inclusive por engenheiros.
     A única coisa que poderia ter causado o colapso do edifício era a remoção ou a fratura de pilares e vigas estruturais. Remover paredes, ao contrário, alivia a carga sobre a estrutura. Abrir janelas nas paredes laterais a mesma coisa.
     A obra do nono andar, pelo depoimento do pintor que se salvou no elevador, era apenas de pintura e remoção de dois banheiros. Talvez nesses banheiros houvesse alguma parte estrutural. Tem que se verificar isso.
     Mas ninguém falou sobre a obra do terceiro andar, a não ser uma senhora que trabalhava no prédio e disse que viu no dia anterior viu operários "quebrando tudo" quando a porta do elevador se abriu no andar. Pode ser que o problema estivesse aí, mas mesmo assim, pelo depoimento do engenheiro que já tinha feito obras no prédio, as estruturas eram todas externas. Portanto não havia pilares para serem quebrados no meio das salas.
     Outro depoimento, de um antigo morador, falou sobre inclinação do prédio na época da construção do metrô. Pode estar aí a causa. Se houve alguma rachadura na época, com a contínua vibração da movimentação dos trens, teoricamente poderia levar a uma fratura estrutural.
     De qualquer forma, há uma responsabilidade conjunta do condomínio, da prefeitura e do Crea, pela não fiscalização.
Próximos da lista

     Os ministros Fernando Bezerra, da Integração nacional, e Mário Negromonte, das cidades, já estão passando da hora de serem substituídos. Atos de corrupção de subordinados diretos a esses ministros os colocam sob suspeita. O desafio do líder do PMDB na Câmara, de que a presidente Dilma não teria coragem de substituir os ministros para não perder o apoio do partido, soa como um tapa na cara da mandatária da nação.
     Pra quem conhece o estilo Dilma, o desafio não deve ficar sem resposta.
     Dessa vez a faxina deve ser completa nesses ministérios.

Ventos de guerra

     Infelizmente (e novamente) o planeta se vê açoitado por ventos que prenunciam uma guerra, que desta vez pode arrastar muitos países para um conflito imprevisível. Trata-se do bloqueio que vai sendo montado em torno do Irã pelas potências ocidentais, interessadas em derrubar seu governo para colocar em seu lugar mais um governo dócil aos seus interesses, como estão acostumados a fazer.
     Usam como desculpa a questão do programa nuclear iraniano, fiscalizado de perto pela Agência Internacional de Energia Atômica (AEIA), mas fecham os olhos para o programa nuclear de Israel, que há décadas possui armas nucleares, fora de qualquer controle da agência.
     Na verdade o foco do conflito é Israel, com sua contínua ocupação sobre a Palestina, desobedecendo todas as resoluções da ONU à respeito. O compromisso dos Estados Unidos e da Europa com a defesa incondicional de Israel é a única explicação para o ataque ao Irã, já que todos os países vizinhos a este país possuem armas nucleares (Índia, Rússia, China, Paquistão), sem que isso provoque nenhuma reação ocidental.
     Como o Irã se opõe à hegemonia norte-amerciana no Oriente Médio e à política expansionista israelense sobre território palestino, eles consideram fundamental parar os iranianos agora, antes que eles consigam a bomba e se torne impossível uma invasão do país.
     O Brasil, que havia se aproximado muito do Irã no governo Lula, ultimamente vem se distanciando, principalmente em razão das políticas discriminatórias contra as mulheres, consideradas inaceitáveis pela presidente Dilma.
     Em boa hora nos afastamos, para não sermos envolvidos pela irracionalidade crescente que vai tomando conta das relações internacionais na região. Rússia e China apóiam os iranianos e devem substituir os países ocidentais nas relações econômicas com eles. Uma guerra que envolvesse a União Européia, os Estados Unidos, a Rússia e a China, seria catastrófica para todo o planeta, principalmente para os países mais próximos.
     Enquanto isso, Israel se nega a negociar fronteiras aceitáveis para a nação Palestina e insiste na ocupação, colocando mais lenha na fogueira, apoiada pelo ocidente, que talvez veja no conflito uma saída para sua crise econômica. Afinal as guerras sempre foram uma solução para crises como essas.   
     Quando o capitalismo não tem mais para onde crescer, destrói-se tudo para começar tudo outra vez. É o que eles chamam, cinicamente, de destruição criativa. 

Jericoacoara

                                                        Árvore da preguiça, no Parque Nacional, à beira-mar
    Em nova viagem exploratória pelo litoral do Ceará, desta vez pelo litoral oeste, fui conhecer a famosa praia da Jericoacoara, que fica dentro de um parque nacional à beira-mar.
     A praia, com sua pequena vila, ao lado de uma duna gigantesca,onde as pessoas se reunem para ver o por do sol, é linda. Mais do que isso, é uma das praias mais lindas que já conheci. Acho que só perde para as praias cubanas. Mas Jeri não é só isso. O Parque nacional tem outras maravilhas para revelar aos turistas, como a Lagoa Azul e a Lagoa do Paraíso, que a gente pode conhecer fazendo um passeio de bug, por trilhas previamente definidas para que as dunas não sejam ameaçadas.
    A Lagoa Azul tem uma pousada e restaurante numa ponta no meio da lagoa, à qual se chega através de uma balsa à vela. Paga-se 5 reais para a travessia ida e volta e pelo ingresso no bar. Do outro lado da ponta a surpresa: mesas de bar dentro da água incrivelmente limpa, fazem a gente se sentir num paraíso.
     A Lagoa do Paraíso se supera: ao invés de mesas, colocam redes na água: uma delícia! Além disso tem a famosa Pedra furada, uma das muitas formações rochosas à beira mar, num litoral cheio de falésias, com uma natureza muito agreste, misturando rochas e uma vegetação rasteira. Parece um deserto.    Pode-se entrar na vila de carro, mas não circular dentro dela. Um guia leva a gente pelo meio das dunas, cobrando 50 reais, num trajeto meio arriscado, mas que vale a pena. Quem preferir pode deixar o carro em Jijoca, uma vila fora do parque, e ir de jardineira (uma espécie de ônibus), pagando apenas 5 reais.     A pequena vila não tem calçamento e todo mundo anda descalço na areia. Também não tem iluminação pública e à noite os restaurantes colocam velas com pequenos protetores de vidro nas mesas. Muito bonito. Um exemplo de turismo com preservação ambiental.
     Tem tudo lá, pousadas, restaurantes, bares, lojas. Dá pra comer bem e encontra-se opções de todos os preços, desde restaurantes franceses e italianos até um delicioso pastelzinho de arraia por R$2,50.
     Mas o que mais impressiona no passeio é a infraestrutura do Ceará. Ótimas estradas, todas sinalizadas, outro aeroporto internacional sendo construído (em Jijoca de Jericoacoara), e as cidades que encontramos pelo caminho dotadas de boa infraestrutura, cheias de vida e todas elas dispondo de escolas novas, dotadas de ginásio de esportes.
     Na ida paramos em Itapipoca, e lanchamos num excelente shopping de beira de estrada (à esquerda), onde fomos muito bem atendidos e não pagamos caro. O garçom faz questão de dizer que a cidade é terra do palhaço-deputado Tiririca e da atriz Luiza Thomé.
     Dá pra entender porque a FIFA colocou 7 jogos da copa em Fortaleza: com todo esse investimento em infraestrutura e a proximidade da Europa, o Ceará logo se tornará o primeiro destino turístico do Brasil.

Os pictos e o imaginário anglo-saxão

     Se tem uma coisa que os ingleses e americanos detestam é a história dos povos bárbaros.
     Eles não suportam a idéia de que foram colonizados e civilizados pelos latinos do império Romano.
Mas a história é essa mesma. Quando Julio César invadiu a antiga Britania, os povos que habitavam as ilhas britânicas eram bárbaros, que se organizavam em tribos e viviam guerreando entre si.
     No dizer moderno, eram índios.
     Os romanos conseguiram dominar e romanizar os povos que habitavam o território que hoje corresponde a Inglaterra, mas nunca conseguiram vencer os Pictos, povos que habitavam o território da antiga Caledônia, atual Escócia.
     Os pictos estavam lá há mais de 1000 anos, quando os romanos chegaram, no século I dC e foram denominados assim pelos romanos, em função das suas pinturas corporais (Pictis)
     A pedra com inscrições à esquerda é um monumento picto. À direita uma representação deste povo.
     Os celtas chegaram muito depois e foram habitar, principalmente, o que hoje corresponde à Irlanda.
     Os celtas eram altos e brancos e praticavam a religião dos druidas. Os pictos eram mais baixos e morenos, de cabelos escuros, e tinham o hábito de pintar todo o corpo, principalmente de azul e também se cobriam com tatuagens coloridas. Alguns historiadores supõem que eles sejam originários da península ibérica, pelo seu tipo físico. Outros dizem que eles teriam vindo da Europa Central.                                
       Roma nunca conseguiu vencer os pictos e, por isso, o imperador  Adriano mandou construir uma muralha separando o território romano do território dos bárbaros. É a famosa Muralha de Adriano, que ainda está de pé em alguns locais, dividindo a Grã-Bretanha ao meio, como se vê no mapa à direita.
     Abaixo, à esquerda, uma foto de parte dessa muralha conservada até os dias de hoje 
     Mas no cinema americano, os romanos são sempre os maus e os selvagens são glorificados, como se fossem os vencedores. Eles inspiraram muitos filmes de ficção, como Conan o Bárbaro, Highlander e mesmo os guerreiros azuis de Avatar. Também inspiraram aquele joguinho chamado RPG, que por sua vez inspirou a trilogia O Senhor dos Anéis, todos glorificando os povos bárbaros.
     Mas a verdade é que os romanos nunca foram vencidos pelos ingleses, mas abandonaram a Britânia pela necessidade de sufocar revoltas em outras partes do império que lhe davam muito mais trabalho, já que os anglos e os saxões se tornaram súditos bem comportados de Roma.
     Mais do que isso, os ingleses absorveram toda a cultura romana, suas leis, sua arquitetura e até seus vícios imperiais. A língua inglesa está cheia de expressões latinas e mesmo os pictos e celtas, frequentemente faziam acordos com os romanos para cessarem as hostilidades, havendo comércio regular entre eles.
     Com o tempo celtas e pictos se misturaram, tornando-se um só povo, embora até hoje Escócia e Irlanda tenham suas tradições diferenciadas, seus territórios e, principalmente, mantenham muitas divergências com os ingleses que vivem no sul das ilhas.
     Quando o cristianismo foi introduzido nas ilhas, primeiro pelos romanos convertidos e depois por missionários junto aos outros povos, os druidas foram perseguidos e sua religião desapareceu, deixando atrás de si lendas de duendes e fadas.
     Mas nenhum filme produzido por eles conta essa história direito. Sempre se tem a impressão de que os ingleses se fizeram por si próprios, se civilizaram a eles mesmos e que os romanos foram vencidos. Mas não foi assim. Eles são fruto da colonização romana, assim como os países latinos que colonizaram
                                       nuestra América. A diferença é que Lisboa já era uma grande cidade fenícia, quando os romanos a dominaram, no tempo em que Londres e Paris eram pouco mais que vilarejos. Na verdade a velha Olissipo, que depois se tornou Olissipona no latim vulgar e derivou para Lisboa, se aliou a Julio Cesar na conquista da Península Ibérica, se tornando uma das primeiras províncias fora da Itália a ganhar a cidadania romana. Então temos razão em nos orgulhar de sermos descendentes do grande império latino, enquanto eles se envergonham de terem sido civilizados por eles.
     Por último lançaram agora um filme chamado Centurião, sobre o desaparecimento da IX Legião romana, conhecida como Hispana, que no ano 117 partiu para o território picto e nunca mais voltou. Um mistério que nunca foi esclarecido, mas que no filme vira mais uma derrota de Roma para os pictos.
     Agora me digam se não é interessante esse desprezo que eles tem pelo latinos? Não é impressionante a maneira como mascaram a história para se convencerem que são superiores e esconderem seu passado selvagem, glorificando os guerreiros azuis e demonizando o império que lhes deu sua cultura atual?
     Essa vontade de rever a história, para glorificar povos antigos, também está na origem do renascimento de seitas de bruxaria, do culto aos duendes, fadas e outras divindades do mundo pagão, tão em moda na nossa classe média esotérica desde os anos 1980. Mas a história real é outra.