Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 9 de setembro de 2012

 
O Paiz
 
Rifando o direito do povo
 
     Interessante como é a política na Bahia. O velho coronelismo e o carlismo marcaram muito esta sociedade, que luta para se libertar de suas velhas práticas. Até dentro de partidos ditos "de esquerda", como o PT, que vem renovando a política brasileira, ainda ocorrem essas manifestações.
     A eleição de Rio de Contas, pequena cidade na Chapada Diamantina onde exerço meu direito de voto, se transformou numa batalha judicial pela tentativa da direção estadual de impor uma aliança que a cidade toda rejeita, com o atual governo municipal, marcado pela perseguição política aos cidadãos e pelo imobilismo na gestão da cidade.
     Apesar do PT da cidade ter formado contra o atual gestor, numa frente com vários outros partidos da base aliada, o Diretório Estadual insiste em apoiar o prefeito, para sustentar uma aliança que formou em outro município, a 500Km de distância, numa barganha política onde o povo de Rio de Contas pagaria a conta.
     A população local, e o Partido na cidade resistem à esta imposição absurda, que tenta colocar no balcão de negócios da politicagem, o direito de escolher seu representantes na Cãmara e na Prefeitura.
     Reproduzo abaixo, na íntegra, documento (texto e foto) que recebi do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de Rio de Contas, denunciando a ingerência ilegal do Diretório Estadual naquele município.
     A responsabilidade das afirmações contidas no documento é do Diretório Municipal do PT de Rio de Contas.
    
JONAS PAULO E O PT DE RIO DE CONTAS
Uma história de fraudes e falsificações
     O PT de Rio de Contas sempre fez parte da frente de Oposição à atual gestão questionável do prefeito Márcio de Oliveira Farias. Formou-se um bloco de oposição desde o ano de 2011, e em 2012 decidiu-se pelo apoio ao Dr Cristiano Cardoso do PDT como candidato à chapa majoritária e Wilton Silva, do PT como vice. Tudo normal, até aí. O que contaremos em diante demonstra a práxis fraudulenta e autoritária de como o senhor Jonas Paulo, presidente estadual do PT vem tratando sua própria militância nos interiores da Bahia e transformando esse partido em uma agremiação cartorial e em um balcão de negócios venais.    
     Em abril de 2012 o senhor Jonas Paulo juntamente com o senhor Alfredo Correia Neto, ex-candidato a prefeito pelo PT, em 2008, decidiram, de forma escusa, “entregar” o Partido dos Trabalhadores para o PSD, do prefeito Márcio Farias, como disseram várias vezes, e todas elas foram refutados pela maioria dos seus membros, inclusive a maioria da executiva municipal e do diretório municipal de Rio de Contas. Tentaram forjar um encontro municipal no dia 02 de junho de 2012, sem respeitar o estatuto, suprimiram membros filiados do PT, dentro do Sistema de Filiados (SISFIL). Ainda tentaram lançar um candidato à chapa majoritária dizendo que depois desistiriam em favor de outro candidato, ou seja, Márcio Farias. A reunião aconteceu num clima de grande tensão, e a executiva municipal entrou com um recurso na Comissão Executiva Estadual pedindo nulidade deste Encontro manipulado. Foi atendida, pois, sequer resolução alguma tinha tirado deste encontro.
     A decisão exarada pela Comissão Executiva Estadual na ocasião do recurso foi de remeter ao Diretório Municipal a decisão final para qual chapa apoiar. Foi realizada uma reunião dia 25 de junho de 2012  a portas fechadas, para a tomada de decisão,com 11 membros do Diretório Municipal,  com o acompanhamento de dois membros da Comissão Executiva Estadual, que vieram de Salvador especificamente para este fim. Desta reunião surgiu uma ata que comprova o que estamos falando. Havia duas propostas inicialmente, uma era para apoio ao PDT, com a vice na chapa, mais 13 candidatos a vereadores pelo PT em coligação com o PC do B, e a outra em apoio ao PSD, com o apoio a um candidato a vereador apenas. Um dos membros do DM no último minuto lançou uma terceira proposta: Neutralidade do PT nestas eleições. A primeira proposta venceu com 6 votos, ou seja, apoio ao PDT; a proposta de apoio ao PSD não teve nenhum voto, e a proposta da neutralidade teve 5 votos!!!Nem o vereador e o presidente da comissão executiva municipal votaram nesta proposta do PSD que tanto defendiam.
     A convenção já estava marcada para o dia 30 de junho, e aconteceu às 14:00 horas, com ampla participação popular, inclusive de todos os membros da Comissão Executiva Municipal, inclusive presidente Reginaldo Castro, secretário geral Carlos Correia de Oliveira e vereador Johny Abreu Silva. Foi fotografada, filmada, todos assinaram a ata lavrada, foram confirmados os candidatos a vereadores, enfim, foi uma convenção normal, com todos os seus ritos cumpridos, e esta ata teve 33 assinaturas.
     Registramos as coligações normalmente no TRE-BA, na Comarca Eleitoral de Livramento de Nossa Senhora. Tudo dentro da normalidade. Mas quando chegou dia 05 de julho, recebemos a notícia de que o Senhor Jonas Paulo tomou a decisão de “entregar” o PT ao prefeito Márcio Farias, ao PSD, condicionando esta entrega ao apoio do PSD de ITABUNA! Este documento que recebemos foi assinado pelo secretário geral do PT Estadual, conhecido como JOJÓ. Ficamos atônitos, perguntando como poderia isso ser possível , pois já tínhamos feito nossa convenção e registrado no TER. Então descobrimos que por orientação recebida, o secretário geral do PT municipal forjou uma outra ATA de uma Convenção que não existiu, assinada apenas por ele, pelo vereador Johny Abreu, e pelo presidente, Reginaldo Castro. Apenas três assinaturas!!! Mas ao termos o papel em mãos descobrimos que além de tudo, esta ATA FRAUDULENTA teve a assinatura do presidente FALSIFICADA!! E indicando como candidatos a vereador apenas dois membros, Johny Abreu e Marinilton Martins, este último nem assinou a ata. Esta ata coloca que a convenção teria sido realizada no mesmo espaço, mesmo horário que a CONVENÇÃO VERDADEIRA...
     E então entramos com um recurso na justiça eleitoral pedindo a nulidade desta ata e destas candidaturas. O senhor Jonas Paulo decidido a entregar o PT ao PSD, também entrou pedindo a anulação de nossa ATA. O promotor deu parecer favorável  e o juiz também deu sentença ratificando e mantendo nossa coligação com o PDT. Ao mesmo tempo, encaminhou à Polícia Federal  pedido de grafoscopia, para averiguar a falsificação de assinatura do presidente na ata fraudada.
     Na justiça estadual o desembargador considerou o recurso do senhor Jonas Paulo desprovido de fundamentos, acreditamos que por toda esta maracutaia que envolve a questão, e por não ter acrescentado nada de novo... O senhor Jonas Paulo, depois de tantas decisões contrárias a sua intenção, deve ter feito uma mágica, pois ontem, o desembargador Cintra, mudou completamente o que estava definido, por seus pares, e mandou o PT se entregar sem reclamações ao PSD do prefeito Márcio Farias.
Este prefeito ainda responde a um processo atualmente do Ministério Público que o denunciou por compra de votos através de doações de lotes em período proibido, com fraude em documentos e assédio e coerção de testemunhas.
Mas é este o quadro que a atual gestão do PT estadual apresenta. Desleal, desonesta, fraudulenta, venal e apoiadora de fraudulentos e desonestos pseudo-líderes políticos.


 
Rapidinhas
 
Pobre Salvador II
 
     Não voto em Salvador, mas tenho acompanhado o contraditório entre os candidatos à prefeitura da capital baiana.
     Mário Kertz parece ser o mais simpático e talvez o mais competente de todos, só não fala que é do mesmo partido do atual prefeito João Henrique, que aliás é uma espécie de fantasma que paira sobre a eleição: todo mundo critica a gestão, mas ninguém fala o nome dele. João Henrique, aliás, parece estar se vingando da cidade que só fala mal dele. Resolveu largar de mão.
     ACM Neto, esconde mais do que mostra. Suas propostas não significam nada, são apenas palavras vagas. "Vou chegar junto..." O que quer dizer isto? "Vou botar ordem na casa!" Isso me lembra o discurso da ditadura militar. O que será que ele quer dizer com isso? Que vai tirar os ambulantes que infestam as ruas da cidade? Baixar o cacete, no melhor estilo do seu avô?
     Pelegrino é um caso à parte. Apesar do apoio de Lula e Dilma, tem dificuldades pra crescer. Tudo que ele fala soa falso. Era melhor que ele não sorrisse, pois o sorriso também parece forçado. Ele é melhor sério, como o advogado que luta pelos pobres.
     Dele me lembro de ter ido à Ilhéus defender os estudantes que foram presos em 1989, quando eu liderava uma facção do PT, que fizeram um enorme protesto contra o aumento das passagens de ônibus no governo de Jabes Ribeiro. É uma lembrança boa, positiva.
     Mas não posso me esquecer de que ele foi o líder do governo na nefasta reforma da previdência que Lula fez em 2003 e que retirou direitos dos aposentados, violando inclusive o princípio constitucional dos direitos adquiridos. Ele como líder, não apenas defendeu a reforma, mas fez o serviço sujo de ameaçar com a expulsão do Partido os parlamentares que votassem contra. No balanço de prós e contras, não confio nele.
     Hamilton, do PSOL, é uma cara nova nas eleições e, pelo que eu soube, é um sujeito direito. Mas ele não faz propostas...só fica cantando ê,ê, ê, Hamilton 50... Podia dizer a que veio e o que faria no governo, afinal ele tem uns dois minutos, daria tempo.
     Marinho não significa nada. Da Luz é uma piada de mau gosto.
     Enquanto isso a cidade vai se acabando em buracos, sujeira e descaso. O Ministério Público deveria destituir o atual prefeito, por abandono das suas funções.
    
O fenômeno Freixo
     Marcelo Freixo vem crescendo nas pesquisas para prefeito do Rio de Janeiro.
     Ele ficou conhecido por combater as milícias cariocas e por ser um defensor dos direitos humanos.O personagem Freitas, do filme Tropa de Elite II, foi inspirado nele.
     Por sua luta contra as milícias, foi ameaçado de morte e teve que passar um tempo fora do Brasil com a sua família.
     Concorrendo pelo PSOL, Freixo tem pouco tempo de TV, mas conta com o apoio de artistas e intelectuais cariocas, como Chico Buarque de Holanda. Se continuar crescendo pode provocar um segundo turno e, quem sabe, uma reviravolta política na cidade que um dia já foi maravilhosa.
 
Esperança na Colômbia
 
 
     O presidente Santos, da Colômbia, confirmou  que serão abertas negociações entre o governo de seu país e as FARC, Forças Armadas revolucionárias da Colômbia, grupo guerrilheiro que atua desde a década de 1960 no país vizinho.
     Todos os países latinos exaltaram a iniciativa e até o Presidente dos EUA, mandou mensagem de congratulações a Santos. Apenas os republicanos norte-americanos e seu filhote, o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe, ficaram contra.
     Para o Brasil o fim desta guerra é muito importante, pois retira das nossas fronteiras o exército dos Estados Unidos, chamado por Uribe para ajudar a combater os guerrilheiros.
     Para o restante da América Latina também é um sinal de paz e novos tempos.
     Oxalá essas negociações sejam bem sucedidas e consigam integrar os grupos guerrilheiros na vida política colombiana, pela via constitucional.
 
Poesia da semana
 
     Reproduzo abaixo, a letra da música Revolta dos Malês, de Rafael Pondé.
     http://letras.mus.br/rafael-ponde/1049399/

 





Revolta dos Malês

Rafael Pondé

Perto do Abaeté tem um nego mandigueiro
Descendente do Malês, povo nobre e guerreiro
Faz dali o seu terreiro
Na roda de Capoeira ou orando ao Deus Allah
Veste branco às sextas-feiras
Usa xale e patuá
(seu avô era um Alufá)
Esse nego um dia fez revolta
A revolta dos Malês, foi na Bahia que se fez
A Revolta dos Malês
O canto de apear o boi
(foi o Male que trouxe)
E se você vestir um abadá
(foi o Male que trouxe)
O misticismo e a superstição
(foi o Malê que trouxe)
A moda de viola do sertão
(foi o Male que trouxe)
Tapas, Haussás, baribas
Negos e mandingas
A Revolta dos Malês foi na Bahia que se fez
A Revolta dos Malês


 
Um Rio Chamado Atlântico
A África no Brasil e o Brasil na África
 

     O que mais impressiona e surpreende o leitor deste outro livro, de Alberto da Costa e Silva, (Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro - 2011) é a percepção de quão intensa foram as relações comerciais e políticas entre Brasil e África, em séculos passados, relações estas destruídas deliberadamente pelo dominação britânica do Atlântico sul durante o século XIX.
      Ao contrário do livro anterior (A Manilha e o Libambo) a cuja resenha me dediquei nas últimas edições deste blog, Um Rio chamado Atlântico não é o resultado de uma pesquisa histórica, mas uma coletânea de artigos sobre o assunto, escrito em épocas diferentes e com o foco nas mútuas influências entre África e Brasil, perdidas da nossa memória coletiva por um século XX que nos apartou da nossa fronteira leste, o continente africano.
     Mais do que a desvendar, o livro se preocupa em restaurar ligações perdidas.
     Dentre as muitas verdades, restabelecidas pelo autor, vamos descobrindo que nossa maior ligação com a África, até o século XIX, não foi com a Luanda dos portugueses, mas com o golfo da Guiné, especialmente com Lagos na Nigéria, terra de iorubos, conhecidos no Brasil como nagôs, e cuja cultura foi a que mais resistiu às duras condições da escravidão no Brasil.
     Descobrimos que muitos príncipes vieram para o Brasil, enviados por seus inimigos, para os quais a escravidão era também uma forma de exílio, e que as sociedades secretas dos escravos os escondiam dos senhores brancos, preservando-lhes as identidades reais para protegê-los e que, muitas vezes, estas compravam suas alforrias, com suas pequenas poupanças, para mandá-los de volta, algumas vezes para que reassumissem suas funções reais.
     Descobrimos que os maracatus, onde um rei e uma rainha desfilam e são homenageados pelo povo, eram formas encobertas dos negros de render homenagem aos seus príncipes, ocultos no meio da escravaria e também que reis africanos mandavam seus filhos estudar na Bahia e que o Obá Osemwede, do Benin, e o Obá Osinlokun, de Lagos, foram os primeiros soberanos a reconhecer a independência do Brasil, formando, paradoxalmente, as últimas embaixadas de reinos africanos no nosso país, antes da partilha da África pelos europeus.
     Brazilian quarter, em lagos
     Resgatamos também o fato de que milhares de ex-escravos voltaram para a África (os retornados)e lá fundaram comunidades, mantendo alguns costumes adquiridos no Brasil. Não se integravam mais nas sociedades tribais, assim como também não tinham lugar no Brasil escravocrata, e formaram comunidades separadas, conhecidas como de brasileiros ou agudás e ergueram bairros inteiros como o Brazilian quarter na cidade de Lagos, assim como também no Togo e no antigo Daomé.
     Eles levaram para a África a arquitetura praticada no Brasil, na época, (foto acima) com a qual construíram suas residências, sobrados, igrejas cristãs e mesquitas. Ainda existem alguns exemplares dessas construções na moderna Lagos.(foto abaixo)
     Muitos descendentes desses retornados ainda falavam o português, no início do século XX e os mais velhos eram conhecidos como papais e mamães. Descobrimos também, que a famosa revolta dos malês, ocorrida na Bahia em 1835, foi um reflexo no Brasil de uma guerra santa, uma jihad islâmica, ocorrida na região do Iorubo, e comandada pelo Imame (líder espiritual) Usuman dan Fodio, cuja notícia chegou ao Brasil através dos navios negreiros, que muitas vezes traziam como cativos, prisioneiros dessas guerras e passavam a notícia aos seus compatriotas no Brasil. 
     A comunidade islâmica no Brasil, era formada por negros escravos e libertos, que mantinham sua fé oculta e professavam sua religião em segredo, já que oficialmente o Brasil imperial era um país católico e qualquer outro culto era considerado ilegal e perseguido como seita religiosa.
     Após o fim da rebelião, muitos revoltosos malés foram deportados de volta para Lagos e lá se juntaram à comunidade muçulmana local.
     Havia também muitos muçulmanos no Rio de janeiro, que se reuniam em locais privados para professar sua religião. Esses seriam descendentes do que Costa e Silva chama de diáspora baiana, formada por ex-escravos que foram da Bahia para o Rio, procurando afastar-se de seus antigos donos para começar uma vida nova. Teriam sido eles os responsáveis pela invenção do Samba, como já contam algumas resenhas da vida dos primeiros compositores do samba carioca, como Pixinguinha, todos filhos de baianas emigradas para o Rio de janeiro.
     Alberto da Costa e Silva afirma também ter visto no Senegal uma apresentação musical em que a música era idêntica ao frevo pernambucano, que ele suspeita ser, na verdade, um ritmo africano transplantado para o Brasil.
     Muito interessante é perceber que a dominação européia sobre a África foi historicamente curta: do final do século XIX a meados do XX, quando se formam as modernas nações africanas.
     Após ler Um rio chamado atlântico, me parece extremamente importante a retomada das relações do Brasil com a África, de onde veio aproximadamente a metade dos formadores da população do Brasil moderno. O colonialismo europeu nos separou das nossas raízes africanas e hoje estudamos os negros como se a história deles começasse nos navios negreiros.
      Conhecer a história das nossas relações com os povos africanos, assim como a mútua influência que Brasil e África exerceram um sobre o outro, é importante para compreender quem somos nós, quem são eles e traçar um novo rumo para as relações exteriores do nosso país.
 
     Para maiores informações sobre a influência do Brasil na África, através dos retornados, me parece interessante, também, a leitura do livro A Casa da Água, (editora Bertrand Brasil, editado originalmente em 1969) de Antonio Olinto, primeiro volume de uma trilogia sobre o tema.
 

     Maiores informações sobre este livro podem ser obtidas nos sites abaixo: