Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 13 de março de 2011

Rapidinhas

Carnaval de Rio de Contas

     O carnaval de Rio de Contas foi mais uma vez estragado pela praga que se tornou o chamado som de carro, ou seja, automóveis com gigantescas caixas de som, colocando músicas horríveis que são impostas a todos que estão num raio de 500 metros. 
     Como se não bastasse ter que escutar aquilo, ainda ocorre uma disputa entre proprietários de vários carros que ligam o som ao mesmo tempo, numa poluição insuportável, que não respeita hora nem lugar. Alguém deveria fazer um estudo psicológico da necessidade que esses proprietários de veículos tem de fazer tanto ruído, mesmo sabendo que desagradam as pessoas.
     A música baiana do palco principal também continua cada vez pior. Baixo nível, melodia ruim e letras idiotizadas, além de bandas que passam a maior parte do tempo falando (levanta a mãozinha, cadê os torcedores do flamengo?, etc) ao invés de cantarem. Claro que isso não é um problema local, mas da música baiana como um todo, que experimenta um período de decadência acentuado.
     Não é à tôa que o palco das marchinhas atrai cada vez um público maior.
     Mais uma vez o monopólio da Schin, com muita gente da prefeitura faturando. Os mesmos de sempre.
     Mas apesar de tudo, a alegria da população, especialmente dos mais jovens, o cenário de cidade histórica e o desfile de máscaras, atraem cada vez mais gente. Condições existem para fazer um carnaval organizado e muito alegre, de melhor qualidade. Falta vontade política.


A Lua vem da Ásia

     Sempre gostei muito desse livro, de Campos de Carvalho, que vem a ser uma espécie de diário de um louco, mas que nos coloca diante dos absurdos da nossa civilização burguesa e consumista. Mas a peça, com Chico Diaz, consegue ser melhor.
     Normalmente me irrito com o público de Brasília, que aplaude qualquer coisa de pé, mas dessa vez me levantei com muito gosto.  
     Chico Diaz faz um monólogo de uma hora e meia, fantástico, muito bonito e emocionante. Se puderem ver, não percam.
     No teatro do Centro Cultural do Banco do Brasil, de 11 de março a 03 de abril, com direção de Moacir Chaves.  

60 anos

     Reunindo familiares e amigos em Brasília, comemorei sábado, dia 12 de março, meus 60 anos.
     Muito bom perceber que quanto mais a gente caminha, mais gente vai caminhando ao nosso lado, sejam filhos, netos ou velhos amigos.
     O importante é seguir andando e procurar realizar as coisas que a gente quer fazer, preservando os outros dos nossos erros, o que nem sempre é possível. Por isso, nesse momento de alegria peço a todos que sejam tolerantes com meus defeitos e continuem tornando a minha vida cada vez mais alegre, com suas existências, nesse caminho onde o destino nos colocou juntos, pelo menos em alguns trechos.
     Um grande abraço carinhoso a todos os amigos e amigas, à minha mãe, aos filhos e netas que dão sentido à minha existência. Espero que todos tenhamos a oportunidade de viver num Brasil cada vez melhor e num mundo com mais justiça, paz e compreensão entre os seres humanos e a natureza.

Cisne negro

     Extremamente perturbador o filme de Darren Ronofsky, com Natalie Portman.
     Uma alegoria sobre a luta entre o bem e o mal dentro da alma humana, encarnados numa bailarina que deve viver dois papéis antagônicos.
     Toda a obscuridade do espírito gótico do hemisfério norte, vivido numa sociedade profundamente marcada pela competição, representados no mundo do balé clássico e na obra de Tchaikowsky, o lago dos cisnes.
     Não deixem de ver.
   Convergências

     Em 1993, quando publiquei o livro Contracorrenteza, fiz algumas predições políticas, que aos poucos foram se realizando. A única que nunca se realizou foi a de que PT e PSDB acabariam se unindo, devido à proximidade de seus ideários.
     Pois agora, quase 20 anos depois, parece que a profecia final está a caminho de se concretizar.
     Trata-se de vários movimentos simultâneos, aparentemente confusos, mas que não passam despercebido para um observador atento.
     Pela direita temos uma estranha movimentação liderada por Gilberto Kassab, o prefeito de São Paulo, eleito pelo DEM e que está louco para abandonar a sigla e se bandear para a chamada base aliada, a grande sopinha de letras que sustenta o governo de Dilma Roussef.
     Kassab tem grandes ambições políticas, entre elas a de governar o Estado de São Paulo, e sabe que no DEM, aliado ao PSDB, cheio de emplumados, não tem chances de sair candidato. Como não pode mudar de partido sem perder o mandato por infidelidade partidária, vai usar a única janela de fuga prevista pela legislação: a fundação de outro partido.
     Todos sabem que seu partido será apenas provisório (fala-se na sigla PDB) e depois será incorporado por algum partido da base aliada, provavelmente o PSB. Então Kassab finge que cumpre a lei e a justiça finge que não vê que tudo não passa de uma manobra para burlar a lei. Tudo na base do me engana que eu gosto.
     Até aí tudo normal, dentro da legalidade brasiliana. O estranho é que Kassab é aliado do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB, que vem dando a maior força à manobra de fuga do aliado municipal para a base aliada de Dilma, teoricamente sua adversária política.
     Na base de tudo está o problema chamado José Serra. Tanto Alckmin, quanto Aécio Neves, querem se livrar de Serra e vem na manobra de Kassab uma ótima alternativa para enfraquecê-lo, já que ele controla o PSDB de São Paulo e deve se lançar candidato a prefeito em 2012, para depois tentar novamente a Presidência da República ou a candidatura ao governo do Estado de São Paulo, atrapalhando as pretensões de Aécio Neves para presidente e de Alckmin à reeleição para o governo do Estado. Complicado? Isso é só o começo!
     Do outro lado do espectro político, Dilma vê com bons olhos a saída de Kassab da oposição e sua vinda para a base aliada, tirando a hegemonia da aliança PSDB-DEM que governa São Paulo a 16 anos e de lambuja ajudando a enfraquecer Serra, que conseguiu se tornar inimigo de todos, proeza típica dele com sua habilidade inata para cultivar inimizades.
     Mas ainda não é tudo. Do lado do governo federal, a eminência parda é Antonio Palocci, o ex-trotsquista que caminhou celeremente para a direita neoliberal, como costumam fazer os trotsquistas depois que se dão conta das besteiras que fazem na juventude. Sua atuação no governo retirou rapidamente os cargos  que o PCdoB e as centrais sindicais, ocupavam no governo Lula, reduzindo sua importância e influência, como se viu no episódio do salário mínimo.
     Não é à tôa que Dilma ensaia uma aproximação com os Estados Unidos e o governo Obama, revertendo a política externa tão duramente construída no governo Lula e que projetou o Brasil internacionalmente como ator global. Em detrimento da nossa liderança regional, voltaremos à ser área de influência dos americanos, ou seja, voltaremos a ser o quintal deles, para regozijo das nossas velhas elites conservadoras, inclusive as famílias quatrocentonas de São Paulo que apóiam o PSDB, em nome das velhas tradições de submissão ao capital internacional.
     Por outro lado, Aécio Neves tenta se aproximar das centrais sindicais, tentando minar a hegemonia petista no setor, manobra considerada crucial para fazer crescer o eleitorado tucano no meio da classe trabalhadora, especialmente nas classes em ascenção com o aumento do poder aquisitivo e que começam a se ver como classe média consumidora, deixando para trás velhas tradições de luta proletária.
     Resumindo: o PSDB caminha para a centro-esquerda, tentando se livrar do estigma de representante da velha direita, enquanto o PT caminha para a direita, tentando conquistar o apoio das velhas elites, que nunca aceitaram sua hegemonia. Quando se dará o encontro triunfal? Em 2014 ou 2018? Não sabemos, mas as diferenças entre as duas agremiações tendem a desaparecer rapidamente e, na medida em que os egos inflados de FHC e Lula saem de cena, abre-se a perspectiva de um entendimento eleitoral para uma chapa unificada e para uma grande frente social-democrata no Brasil, dando abrigo a todos os políticos clientelistas e a todos os interesses obscuros que sempre dirigiram este país.
     O fecho desse processo seria a reforma eleitoral preconizada por José Dirceu, criando o voto em lista, que na prática extinguiria nosso direito de escolher nossos representantes, fazendo com que tudo se transforme num acerto interno entre eles, excluindo definitivamente o povo da cena política brasileira e jogando no lixo todas as lutas pela democracia travadas ao longo das últimas décadas.
     Mas os artífices dessa convergência, dessa criação de um verdadeiro partido único, estilo PRI mexicano, disfarçado de frente democrática ou algo do gênero, se esquecem de que o Brasil não é uma empresa, nem é um cartório eleitoral, onde eles montam suas falcatruas ao sabor dos seus interesses. Somos um povo que sabe se levantar e lutar, como já demonstramos muitas vezes.
     Mesmo em países mais atrasados, grupos que tentam se perpetuar no poder fraudando a livre vontade popular são derrubados quando o povo perde a paciência, como estamos vendo nos países árabes.
     Então, como na piada da assembléia dos ratos, só faltou combinar quem vai colocar o guizo no pescoço do gato, que nesse caso é o povo brasileiro. Se não souberem fazê-lo, correm o risco de ver outras agremiações sugirem e crescerem, ocupando o espaço vazio deixado pela esquerda analógica (como disse Emir Sader) fundando uma nova esquerda, pós-internet, ecológica, ancorada inclusive na convergência digital das grandes redes sociais e nas novas reivindicações de cidadania de um povo que não aceita mais ser reduzido à servidão.

Boa segunda-feira à todos

Ricardo Stumpf Alves de Souza