Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

quinta-feira, 15 de abril de 2010




Cultura gay?

     O Pessoal do movimento LGBT de vitória da Conquista, me pede que escreva alguma coisa sobre o tema "cultura gay", que está sendo discutido no seminário que está acontecendo naquela cidade.
     Pelo que entendi, há uma grupo querendo afirmar o que eles consideram cultura gay, que seria relacionada à arte dos transformistas, ou seja, aqueles gays que se vestem de mulher para se apresentarem em shows e boates.
     Achei estranho e fiquei pensando sobre o assunto. Tem um pessoal no movimento gay que tem mania de gueto. Querem se fechar em pequenos grupos e criar um mundinho particular, só deles, e agora querem que esse pequeno universo seja reconhecido como cultura.
     Tudo bem, que alguns grupos queiram se diferenciar na sociedade, até para serem reconhecidos.
     Os judeus se fecham na sua cultura, os ciganos também, os gaúchos inventaram o CTG (Centro de Tradições Gaúchas), que pretendem que seja a cultura gaúcha, mas na prática essas manifestações acabam sendo apenas subculturas, que participam de algo maior, que é a cultura dos povos. Dizer que a cultura judaica se resume as comemorações do Bar Mitzvah, é desconhecer a colaboração que eles deram à nossa sociedade, principalmente através dos três pilares do pensamento moderno, Marx, Freud e Einstein.
     Dizer que a cultura gaúcha se resume ao CTG é desconhecer toda uma contribuição, começando por Anita Garibaldi, a Revolução Farroupilha, que levantou a bandeira da República no Brasil, Oswaldo Aranha, Érico Veríssimo e tantos outros gaúchos que ajudaram a construir a cultura brasileira.
     Assim também dizer que a contribuição dos gays à cultura é o transformismo é desconhecer que os gays estão em toda parte, especialmente na área da cultura e da arte, até pela sua sensibilidade aguçada, que os leva a serem atores e atrizes, pintores, cantoras, poetas, escritores, arquitetos e engenheiros.
     Pois é, os engenheiros, tão machões, deveriam reconhecer num engenheiro o patrono dos gays, o nosso fantástico Santos Dumont, inventor entre outras coisas do avião e do relógio de pulso. Ele, como tantos outros, deu uma imensa contribuição à cultura brasileira e mundial ao desenvolver uma tecnologia que revolucionou a vida moderna.
     Infelizmente se suicidou, por razões desconhecidas e que a nossa historiografia teima em disfarçar, como tendo sido desgosto por ver os aviões serem usados como arma de guerra. Mas terá sido esta a razão verdadeira?
     O romance "O Ateneu", um dos primeiros romances brasileiros a tratar do tema, (outro romance pioneiro é O Bom Crioulo de Adolfo Caminha) teve em seu autor, Raul Pompéia, um destemido e sofrido comentarista da vida nos internatos e das práticas homossexuais entre os estudantes. Infelizmente Raul Pompéia também se suicidou.
     Porque tantos gays suicidas naquela época?
     Com certeza pelas pressões exercidas por uma sociedade hipócrita, ultraconservadora, marcada pela escravidão e pelo patriarcalismo.
     Dizer que a cultura gay se resume a um punhado de homens travestidos me parece querer reduzir a contribuição cultural de 10% da humanidade, o que signica algo em torno de 600 milhões de indivíduos, à um pequeno grupo de pessoas. Os gays com certeza são muito mais do que isso.
     A Inglaterra reconheceu no ano de 2009, que um cientista gay, o matemático Alan Turing, havia descoberto o código da máquina de criptografia enigma usada pelos nazistas nas suas comunicações secretas e, por isso, tinha sido uma peça chave para a vitória dos aliados. Ele também se suicidou após haver sido submetido a um tratamento forçado com hormônios.
     Esta vítima da homofobia oficial dos britânicos, porém, teve sua dignidade resgatada pelo governo do primeiro-ministro Gordon Brown, que admitiu o erro do Estado e deu-lhe a status de herói nacional.
     Pois é, queridos amigos, quantos heróis gays haverão neste mundo, quantos contribuiram e contribuem tanto em todas as áreas do conhecimento. Os gays não precisam se refugiar num gueto cultural, pois sempre estiveram na linha de frente da cultura mundial.

     Abraço a todos

     Ricardo Stumpf