Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

sábado, 17 de março de 2012

A Cidade Assassinada
        Era uma pequena cidade, no meio de serras lindas. Seus amanheceres e entardeceres eram inspiradores para todos que lá viviam. A quase 1000 metros de altitude, em plena Chapada Diamantina, no coração da Bahia, a cidadezinha era um oásis de paz, onde famílias centenárias viviam, criando seus filhos de portas abertas e onde a cordialidade era a marca registrada de seus habitantes.
     As cachoeiras e orquídeas eram uma marca registrada do seu ambiente natural e as pessoas chamavam o lugar de paraíso devido à paz que reinava. 
     A política do lugar, no entanto, era refém de um passado de coronelismo, mas mesmo assim tinha algo de pitoresco, e os habitantes lidavam com isso de forma jocosa, procurando tirar proveito das mentiras dos políticos, aceitando esse atraso como uma coisa que não interferia muito em suas vidas particulares, sempre pacatas.
     Suas festas eram conhecidas pela tranquilidade e originalidade, atraindo turistas e curiosos, que queriam encontrar ali algo que as cidades brasileiras já tinham irremediavelmente perdido e ficavam encantados com tudo, voltando sempre e cada vez mais a cada ano
     Até que uma alma ressentida, de um homem incapaz de realizar seus próprios desejos, resolveu se vingar da vida, destruindo toda aquela felicidade que o ofendia.
     É sabido que pessoas infelizes não gostam da felicidade alheia.  
     Resolveu então matar tudo aquilo, roubando a felicidade dos olhos dos mais velhos e destruindo a esperança nos olhos dos moços. 
     Acabou com as festas, transformando tudo num grande comércio onde só ele ganhava muito dinheiro. Começou a perseguir todos que tivessem um pequeno brilho de felicidade no olhar e a escravizar os que precisavam trabalhar na Prefeitura.
     Ficou decretado, então, que era proibido ser feliz e que todas as pessoas que tivessem idéias diferentes das dele deveriam ser expulsas ou silenciadas, para que ninguém se atrevesse novamente a sorrir.
     As pessoas, acostumadas a uma vida tranquila, não souberam como lutar contra aquela nuvem de tristeza que foi tomando conta de tudo e começaram a morrer.
     Primeiro morreu-lhes o sorriso nos lábios, depois o brilho nos olhos, e assim suas almas foram murchando, se apagando, como num terrível conto de fadas, onde a felicidade ficou presa num castelo cheio de espinhos.
     Assim a cidade foi morrendo. Os que tiveram forças para sair, se foram, deixando um vazio em seu lugar. A cada um que saía, o vazio aumentava, e aumentava também a satisfação daquele que queria matar a felicidade geral.
     Tudo começou a morrer, para que ele, o assassino da cidade, pudesse finalmente se vingar e ser feliz, dentro da sua imensa e incurável tristeza.  E apenas ele e seus escravos, que eram muito bem recompensados, desde então puderam viver, enquanto tudo o mais definhava, na tristeza e na solidão daquela serra, cada dia mais gelada.
     E até hoje a cidade vive assim, no dilema de ter de lutar contra o tirano que reduziu tudo a nada, tendo para isso que abandonar seu modo pacato de vida, ou simplesmente esperar que o tempo mude as coisas e leve embora o assassino da alegria, restaurando a luz nas suas vidas.
     Alguém sabe que cidade é essa?
    

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