Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

sábado, 29 de outubro de 2011

Cidadania x Mundo Corporativo

     As manifestações que se sucedem pelo mundo rico, tem em comum a contestação do predomínio do mundo corporativo sobre o mundo dos cidadãos comuns, que não vivem para ganhar dinheiro, mas para produzir coisas, conhecimentos, vidas, e que fazem a riqueza do mundo dos negócios, com sua mão de obra, suas pesquisas científicas, suas invenções, suas criações artísticas.
    O que os indignados se perguntam, por toda parte, é porque os governos estão atrelados apenas aos interesses corporativos, deixando que eles ajam livremente e jogando a conta dos seus erros para os cidadãos?
     Marx, na sua contradição fundamental, previu dois finais para o capitalismo. Um através da revolução de operários e camponeses, dando origem às ditaduras do proletariado, que surgiriam nos países que estavam se industrializando. Era uma revolução dos pobres e famintos, contra a exploração da sua mão de obra.
     Outro foi a previsão de que nos países ricos, chegaria um momento em que as populações ricas e desenvolvidas, não aceitariam mais que a riqueza produzida ficasse nas mãos de uma minoria.
     A primeira previsão se cumpriu e teve fim, na medida em que os países socialistas enriqueceram e seus povos não aceitaram mais uma ditadura como governo. A segunda parece que está se cumprindo agora, quando populações desenvolvidas não aceitam mais terem de pagar a conta pelas aventuras empresariais de gente irresponsável e descomprometida com o bem comum.
     Parece que caminhamos para um novo tipo de democracia, onde a responsabilidade coletiva passa a ser a tônica, o que inclui além da boa governança econômica, também as questões ambientais e sociais. Falta a política refletir esse novo movimento, através de partidos políticos que expressem essa preocupação.
     Desde o fim do socialismo que nosso dia-a-dia foi invadido pela lógica corporativa, como se ela fosse a coisa mais natural do mundo.
     Os produtos oferecidos, principalmente pelas instituições financeiras, se destacam na utilização de termos típicos do mundo corporativo. Uma conta bancária diferenciada é prime, private, corporate, personnalité, estilo, uniclass, etc. Todos esses termos significam alguma forma de valorização individual do cliente, para que ele se sinta diferenciado, superior em relação aos outros seres humanos, ou seja, são uma mensagem de individualismo extremado que quer dizer; seja melhor, se preocupe apenas com você mesmo, se destaque em relação aos outros mortais, e outras bobagens do gênero, que escondem a grande sacanagem que os bancos fazem com todos nós, nos cobrando juros extorsivos pelo dinheiro que pegamos e pagando uma ninharia pelo empréstimo que fazemos a eles, quando depositamos lá o nosso dinheiro.
     Mas não são apenas os bancos. A lógica corporativa está em todo lugar. Quando abrimos o MSN, aparece uma janelinha chamada "Hoje", que só traz notícias idiotas, tipo; a vida íntima de gente famosa, receitinhas de comidas sofisticadas, os últimos lançamentos da indústria cinematográfica holywoodiana, tudo extremamente alienante.
     E as "missões" das empresas privadas, que elas fazem colocar em plaquinhas e obrigam seus funcionários a decorar. Por exemplo: Prover o cliente do melhor serviço de atendimento, com a mais alta tecnologia, otimizando custo e trazendo lucratividade para os acionistas e parceiros de negócio. 
     Quem acredita nisso? Quem acha que as empresas estão sendo sinceras quando criam essas "missões"?
     Deveriam escrever: Missão - auferir muitos lucros e enriquecer os proprietários. Afinal é para isso que se cria uma empresa privada, não é?
     O que eles pensam que nós somos, um bando de idiotas?
     Pois é, mas durante os últimos 20 anos, esta linguagem corporativa tomou conta de tudo, e quem a contestasse era um dinossauro comunista, um ultrapassado, que não aceitava a realidade da economia de mercado.
     Agora parece que o mundo está voltando a cair na real, e assim como a linguagem ideológica do socialismo ficou para trás, essa linguagem enganadora do capitalismo está caindo finalmente no descrédito da opinião pública.
     O mundo não aceita mais enganações, baseadas em mera propaganda. Os novos cidadãos do mundo querem uma economia voltada para o bem estar de toda a humanidade, sem utopias. Querem um mundo real, voltado para problemas reais, onde as pessoas possam viver em paz, terem acesso a todas as informações, a todas as tecnologias, sem miséria, sem ditaduras, sem enganações, com segurança e com governos e empresas responsáveis, que sejam fiscalizados e controlados pelos cidadãos que os sustentam.

     Não é à tôa que muitos manifestantes como estes da foto acima, em  Berlim, usam máscaras do personagem "V", do filme V de Vingança; na ficção, um sobrevivente de uma maquinação da direita britânica para implantar um regime onde as empresas sufocavam a democracia.
     Depois de tanta irresponsabilidade corporativa e de tantos sacrifícios impostos injustamente aos povos do mundo para pagar a conta, talvez seja chegada a hora de uma grande virada, num século que começou com muitas mudanças, como a derrocada da supremacia norte-americana, simbolizada na queda das torres gêmeas, com a moeda única na Europa, com a eleição de um operário no Brasil, de um índio na Bolívia, de um negro nos Estados Unidos, com a ascensão das mulheres em todas as partes do mundo, com o surgimento dos Foruns Sociais Mundiais, com o fim do G8 e o surgimento do G20, com a primavera árabe, com as redes sociais e seu grande poder de mobilização.
     Só o mundo corporativo parece não ter percebido que o seu predomínio global está chegando também ao fim. 
     Que venha a nova democracia mundial.

     Abraço a todos


    
 

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