Piauí
Crânio de homem pré-histórico no Museu do Homem Americano
Prezados amigos
A semana passada, vindo de Fortaleza para Brasília de carro, percorri boa parte do interior do Piauí, do meio para o sul, e fiquei admirado com as coisas que vi.
Boas estradas asfaltadas, muitas cidades cheias de vida e de dinamismo econômico, prenunciam que aquela região está se desenvolvendo muito rapidamente, embora as cidades ainda careçam de boa infraestrutura.O Piauí é uma mistura muito interessante de passado e futuro.
De Fortaleza até a divisa do Piauí, seguimos pela BR-020 e depois até
Picos, uma cidade ainda desestruturada, mas cheia de vida e de grandes negócios, a maior produtora de mel do Brasil. De lá seguimos pela BR-230, em direção à
Floriano, passando por
Oeiras, antiga capital do Estado (fundada em 1695, tornou-se capital em 1759 e foi capital até 1851), uma cidade histórica, com um patrimônio surpreendente, bem preservado pelo IPHAN.
Patrimônio histórico em Oeiras
Frontão da Igreja de Nossa Senhora da Vitória
Em Floriano, cidade natal do Marechal Floriano Peixoto, descobrimos que estávamos às margens do rio Parnaíba, já na divisa com o Maranhão. A cidade, muito movimentada e confusa, estruturada em torno de uma avenida principal que vai serpenteando desde uma parte mais alta até a praça, próximo à beira-rio, possui uma orla muito simpática, com bares e restaurantes e um pequeno porto, de onde parte um barquinho de passageiros rumo à cidade que fica do lado maranhense: Barão de Grajaú. Uma grande ponte rodoviária faz a ligação entre os dois estados.
Na beira do rio um agradável restaurante flutuante, típico da amazônia, demonstrando que já estávamos entrando em outro ambiente (sempre achei que o Maranhão é muito mais norte que nordeste). O jantar no restaurante flutuante foi bom e barato. Boa comida e cerveja gelada para relaxar do estirão desde Fortaleza.
Beira-rio em Floriano, às margens do Parnaíba e o restaurante flutuante
Claro que não resistimos a pegar o barquinho e ir a Barão de Grajaú, pagando R$1,00 por pessoa, e de repente nos vimos no meio de uma animada festa de São João, no meio de uma praça iluminada, com um daqueles parquinhos com roda gigante, tiro ao alvo, etc.
Em Floriano também encontramos alguns prédios históricos muitos bonitos em bem conservados.
À esquerda, prédio histórico em Floriano (atual sede do CRAS da cidade). À direita a animação da festa de São João em Barão de Grajaú.
No dia seguinte seguimos pela rodovia estadual PI-140, rumo a Canto do Buriti. estrada ótima, de asfalto novinho em folha. Em Canto do buriti, vimos a placa: São Raimundo Nonato. Estava 100 Km fora do nosso trajeto, mas não deu pra resistir. Há anos eu sonhava em visitar este lugar.
Pegamos ourtra estrada que parece um tapete, por uma caatinga linda e deserta, até chegar à entrada da cidade onde nos aguardava uma enorme estátua de um tatú e a placa que procurávamos, indicando o Parque Nacional da Serra da Capivara, local de descobertas arqueológicas importantíssimas, feitas pela arqueóloga Niéde Guidon e sua equipe.
Seguimos até o parque, passando por outras estátuas gigantes de exemplares da fauna local, (uma siriema e duas onças) e conseguimos contratar um guia para visitar alguns sítios arqueológicos e a famosa Pedra Furada (parecida com a de Jericoacoara, no litoral do ceará). Muito pouco para tantos sítios que o parque oferece (mais de mil), assunto para uns três dias de visita. Mas valeu a pena.
Eu estou embaixo das onças gigantes
O parque é muito organizado e limpo. É preciso pagar R$75,00 para um guia e mais R$11,00 por pessoa (estudantes pagam meia). Mas vale a pena.
Visitamos a Toca do Boqueirão, onde se encontram alguns dos desenhos mais famosos, como a Capivara, que dá nome ao parque e O Beijo". Passa-se sobre uma passarela próxima a um imenso paredão que se inclina sobre nós, onde estão os desenhos, para que se possa visualizá-los de perto.
Os desenhos são mesmo incríveis. As idades variam de 5.000 a 12.000 anos, sendo que muitas eras se superpõem, podendo haver desenhos com milhares de anos de diferença entre si, no mesmo painel.
Eles são um recado direto dos habitantes de outras eras para nós. Um grafite que alguém deixou para o futuro e que continua lá, preservado.
À esquerda, a capivara que deu nome ao parque. à direita, a cena conhecida como "o beijo". Abaixo à esquerda, painel com cores variadas e desenhos de épocas diferentes superpostos. À direita a famosa "pedra furada", obra da natureza, quando a região ainda era fundo de mar.
A próxima surpresa é o Museu do Homem Americano, situado nas proximidades da ciadade de São Raimundo Nonato, em área da UNIVASF, Universidade do Vale do São Francisco.
A entrada do museu, por uma estradinha esburacada, não promete nada, mas o museu em si é uma jóia high tech, no meio da caatinga. Todo auto explicativo, cheio de painéis eletrônicos, tem um enorme salão, onde estão um grande sofá em forma de arco e uma tela de cinema, onde as figuras desenhadas nos paredões são apresentadas em movimento e agrupadas por temas: caça, sexo, lutas, animais, seres humanos, etc. Muito bom.
À esquerda, entrada do Museu do Homem americano em São Raimundo Nonato. À direita, a cena do beijo, em animação, na grande tela no interior do museu.
O maná do Gurguéia
Saindo de São Raimundo Nonato, tivemos que retornar 110Km para Canto do Buriti, de onde retomamos nossa viagem pela rodovia PI-324 em direção a Eliseu Martins, e em seguida pela BR-135 em direção ao sul, que nos levaria até Barreiras na Bahia, e paramos para dormir numa pequena cidade chamada Colônia do Gurguéia. Mas logo que tomamos a BR-135, uma placa me chamou a atenção. Ela dizia: você está entrando no maná do Gurguéia. Procurei me lembrar do significado da palavra maná, (um alimento inesgotável de origem divina). Que coisa estranha seria aquela? Eu já havia estranhado no mapa a quantidade de cidades cujos nomes faziam referência ao tal Gurgéia (Colônia do Gurguéia, Alvorada do Gurguéia, Redenção do Gurgéia e São Gonçalo do Gurguéia). Já no pequeno hotel, revendo o mapa, verifiquei que Gurguéia é o nome de um rio que a BR-135 vai acompanhando. Pensei que a proximidade do rio pudesse dar à região a possibilidade de irrigação de plantações e que por isto seria um lugar propício ao desenvolvimento da agricultura, já que a terra ainda é barata e sol não falta por lá.
Mas o dono do restaurante em que fomos jantar me esclareceu que a riqueza da região está no enorme lençol subterrâneo existente no vale do Rio Gurguéia e na facilidade de perfurar poços de onde a água jorra, sem auxílio de bombas, a uma altura de até 50 metros.
No outro dia pudemos confirmar esta realidade, passando por vários desses poços na beira da estrada, alguns inclusive com águas termais.
Dois poços artesianos de águas termais, paralelos, jorrando água na beira da BR-135. Paga-se R$1,00, por pessoa, pelo banho numa piscina abastecida com estas águas.
Realmente estava explicado o tal Maná. O vale do Gurgéia é um verdadeiro presente de Deus e tende a se tornar uma imensa e rica região de produção agrícola, o que já se pode ver pelo intenso tráfego de caminhões e pelas grandes propriedades que estão se estabelecendo à beira da estrada.
A cidade de Bom Jesus, situada mais ou menos no meio do vale, já é considerada a maior fronteira agrícola do Brasil.
Placa na entrada de Bom jesus atesta a vitalidade econômica da região.
Assim, o Piauí nos apresenta desde o passado pré-histórico, com o acervo arqueológico mais importante do continente americano, passando pelo passado histórico de Oeiras e Floriano, até o futuro da sua região sul, onde nos próximos anos deverá ocorrer uma explosão econômica de grandes proporções.
São muitas surpresas para uma viagem só.