Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 25 de setembro de 2011

Uma nova arquitetura?
 
     
 Dentro de um seminário acadêmico sobre Correntes contemporâneas de arquitetura realizado na disciplina de projeto que ministro, numa faculdade de arquitetura, foram analisados oito temas contemporâneos, na seguinte ordem: arquitetura tradicional brasileira (ela existe?); arquitetura vernacular, movimento moderno internacional, arquitetura moderna brasileira, arquitetura pós-moderna, arquitetura high tech, arquitetura orgânica e arquitetura sustentável.
     Os trabalhos foram muito interessantes e o debate que conseguimos mais ainda, aproveitando um período em que a arquitetura mundial não tem uma tendência dominante muito forte, aceitando vários tipos de contribuições e se revelando um campo relativamente aberto a novas tendências.
     Tenho discutido muito com os alunos de graduação sobre a possibilidade de iniciarmos um novo momento na arquitetura brasileira, na medida em que vivemos também um novo momento político e econômico no Brasil, superando os maneirismos e decorativismos da febre consumista que nos atingiu, especialmente no âmbito da arquitetura de interiores.
     É natural que a nova classe média e até a nova classe rica queira consumir, e nosso mercado de consumo precisa mesmo crescer agregando novos produtos e materiais, o que nos abre um leque considerável de opções para criar coisas novas. O problema é dar uma organicidade a essas novas possibilidades, de forma a permitir que nossa arquitetura recupere a inciativa sem perder a qualidade, sem cair na tentação fácil do consumismo fútil e vulgar.
     Dentre todas as correntes analisadas, todas vigentes simultaneamente neste início de século, as mais recentes, como a orgânica e a sustentável, se destacam pelas preocupações ambientais, embora a sustentável não seja propriamente um estilo, já que a variável de sustentabilidade pode ser agregada a qualquer expressão formal. A orgânica sim surge como um estilo, voltada para as formas da natureza, embora seu surgimento esteja lá atrás no início do modernismo, com Frank Lloyd Wright nos Estados Unidos e Alvar Aalto na Finlândia, que fundaram a chamada corrente organicista do movimento moderno, representada especialmente pela famosa Casa da Cascata de Wright (acima à esquerda).
     Muitos alunos me perguntaram se Oscar Niemeyer ainda é moderno, pois pesquisando na internet, a Wikipédia (...) cita algumas de suas obras como pós-modernas  e outras até como orgânicas.
     Tenho explicado a eles que os arquitetos transitam pelos movimentos ao longo de suas vidas profissionais, mas que Niemeyer decididamente não é pós-moderno. Talvez algumas de suas obras tenham incorporado muito do organicismo, especialmente a famosa Casa das Canoas (a direita), muito integrada à natureza, mas que as curvas são uma característica sua desde o início de sua carreira, com o conjunto da Pampulha em Belo Horizonte, e que ser moderno não significa necessariamente usar linhas retas, muito identificadas com o chamado estilo internacional.
     Na verdade o modernismo, de tão duradouro, permitiu que várias gerações de modernistas se sucedessem, dando a esse movimento a possibilidade de se reinventar ao longo de décadas, sendo hoje muito mais livre de cânones do que inicialmente, podendo incluir manifestações de cor (como as de Fernando Peixoto na Bahia) e de alegria e ludicidade como em alguns projetos orgânicos, se afastando da rigidez funcionalista inicial.
      Outra constatação interessante foi feita sobre o movimento high tech, que estetizou a aplicação de materiais de alta tecnologia e usa amplamente a técnica de modelagem computadorizada para projetar volumes, que seriam impossíveis de serem desenhados com as técnicas projetivas tradicionais. Geralmente os autores desses projetos realizam grandes obras governamentais ou empresariais, se destacando as grandes torres (à esquerda), algumas já chegando perto de um quilometro de altura.
     Perguntei aos alunos porque o Brasil não está construindo alguma torre dessas, com pretensão de ser a mais alta do mundo, e fiquei satisfeito com a resposta de que esse tipo de arquitetura é, antes de tudo, uma manifestação de poder e que o Brasil não precisa disso, ao contrário, precisa de mais democracia, mais distribuição de renda e de uma arquitetura mais voltada para as necessidades da sua população.
     Depois dizem que a juventude de hoje não tem uma visão de mundo.
     É claro que as técnicas da modelagem tem que ser incorporadas à prática dos novos arquitetos, não apenas na modelagem das formas mas também das informações, usadas nos softwares conhecidos como BIM (Building Information Modeling), mas a intenção formal e a responsabilidade social e cultural serão sempre dos profissionais arquitetos, que definirão o rumo que a arquitetura brasileira vai tomar, podendo superar sua atual fase que prima pela falta geral de ousadia (com grandes excessões).
     Mas pensando sobre os resultados do nosso pequeno seminário, tive o pressentimento de que talvez uma quarta geração de arquitetos ainda muito marcada pelo modernismo mas já voltada para o orgânico (como na obra do japonês Kotaro Ide, à direita) e, certamente para  a sustentabilidade, possa nos dar uma nova safra de bons projetos, aliando a simplicidade e o despojamento modernista com a poesia das formas da natureza, usando para isso as técnicas da modelagem e incorporando alguns elementos da tradição brasileira, seja ela erudita ou vernacular, da qual faz parte a alegria do nosso povo, representada pelas nossas cores e ritmos.
    
    
    
    
    

      

Rapidinhas
    
Dilma na ONU


    Nossa presidente e deu bem na ONU, fazendo um discurso equilibrado, mas incisivo, defendendo as posições do Brasil. Aos poucos Dilma está conseguindo impor seu estilo firme e tranquilo e, talvez por isto, esteja conseguindo o respeito e o apoio de setores que tinham contradições com o jeito popular de Lula.
     Bem legal a ênfase na questão feminina, quado ela disse se sentir representando todas as mulheres do mundo, especialmente as que sofrem, as mais pobres, etc. Bom também ela ter comentado tranquilamente que sofreu torura no cárcere e fazer sua profissão de fé na justiça e na democracia.
     O apoio ao ingresso da Palestina na organização foi claro e inequívoco.
     A comparação com o discurso vacilante e populista de Obama é inevitável.
     Muito estranho ver o Brasil puxando as orelhas dos países ricos por não fazerem o "dever de casa". Confesso que não esperava viver pra ver o Brasil assumir este protagonismo.

Dois irmãos

     O Filme argentino Dois irmãos é mais uma surpresa agradável que o cinema portenho revela, depois do sucesso de O segredo de seus olhos.
     Com muita delicadeza e um ritmo tranquilo, o filme vai desenrolando a história de um casal de irmãos maduros, que tem que refazer a vida após a morte da mãe, na tranquila cidade uruguaia de Vila Laura.
     Os atores Antonio Gasalla e Graciela Borges, dirigidos por Daniel Burman, nos fazem refletir sobre a possibilidade de resolução velhos conflitos familiares e de redescobertas de vida na terceira idade.
     Vale a pena conferir.
    
     
     Por trás dos palácios...



     Interessante a reação às críticas que fiz à Brasília dos anos 60. Foi como tocar em um nervo exposto.
     Ainda está por ser contada a história da formação da sociedade conservadora que se instalou no Plano Piloto de Brasília, na década de 1960, formando sua primeira elite, e sua contradição com as cidades satélites.
     No início da cidade, a repressão aos trabalhadores foi feroz, com muitos massacres em canteiros de obras, comandados pela antiga GEB (Guarda Especial de Brasília), enquanto a nova classe média se divertia no Iate Clube.
     Poucos historiadores se dedicaram a pesquisar este período.
     Essa geração que produziu políticos como Collor, Luis Estevão, Paulo Octávio e José Roberto Arruda, dominou a cidade por muitas décadas, num ambiente que misturava provincianismo com modernidade e que ainda repercute no imaginário de seus cidadãos.
     Brasília, de projeto democrático, quase socialista, de cidade, se transformou num verdadeiro apartheid, com os pobres segregados e reprimidos em cidades dormitórios, servidas por péssimos (e caros) transportes e dotadas de indicadores urbanos muito inferiores aos do Plano Piloto, sem equipamentos de cultura e lazer.
     Como exemplo, o projeto do Centro de Cultura de Ceilândia que elaborei para o GDF em 1986, continua inacabado, 25 anos depois.
     Do projeto inicial foram construídos apenas a biblioteca e o pavilhão de cursos, faltando o teatro de arena, o cine-teatro, as quadras poliesportivas e a cobertura do forró.  
     Mesmo assim o Centro (que deveria ser cultural e desportivo), foi eleito pela população como um dos símbolos da cidade. Quem sabe o governador Agnelo Queiroz não resgata essa dívida com o povo da maior cidade satélite de Brasília.
     
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