Por Ricardo Stumpf Alves de Souza

domingo, 27 de maio de 2012

Verdades e Mentiras



     Pois é, amigos leitores, parece que o mundo está as voltas com um daqueles períodos em que todo mundo quer se dar bem às custas dos outros, fazendo cara de bonzinho, posando de moralista e mentindo descaradamente.
     Não sei se por força da minha formação metodista, credo que abandonei há muitos anos, mas cujos princípios me orientam até hoje, não sei se para bem ou para o meu próprio sofrimento, mas não consigo conviver com a mentira e o cinismo, que me deixam enojado.
     Vejam a cara daquele advogado do bicheiro Carlinhos Cachoeira, na CPI, rindo e debochando dos deputados. Márcio Thomás Bastos já foi Ministro da Justiça e agora se dedica a defender bandidos daquele quilate e réus do mensalão. E não tem vergonha de mostrar a face ao Brasil, como se estivesse fazendo a coisa mais normal do mundo ao orientar seu cliente a afrontar o Parlamento.
     Denise Rothemburg, na sua coluna publicada em vários jornais brasileiros, desce a lenha na CPI, dizendo que não vai dar em nada, por conta do cinismo de Cachoeira e das ameaças que um vereador do PMDB de Goiás foi fazer lá dentro, como se os deputados fossem os culpados disso, e poupa os verdadeiros corruptos, que estão em Goiás, principalmente, e no PMDB. Porque ela não critica os governadores Marcondes Perillo e Sérgio Cabral? Porque são de direita, como ela. A culpa é dos que não conseguem apurar os crimes e não dos criminosos.
     E a deputada Alice Portugal, que foi à televisão defender o novo modo de governar de Jaques Wagner na Bahia, que se recusa a cumprir um acordo assinado por ele mesmo com os professores, que estão em greve há mais de um mês? E dizer que eu votei nela.
     E a Veja, revista pra lá de fascista, pertencente a um grupo de racistas sul-africanos, que vende reportagens de denúncias contra políticos em nome da moral e dos bons costumes, defendendo o que ela diz ser liberdade de imprensa, e se cala diante dos assassinatos em série de jornalistas em Honduras, no regime de Porfírio Lobo, o presidente que os americanos colocaram no poder através de um golpe de Estado, para impedir que o povo hondurenho fizesse uma Assembléia Constituinte?
     E a Hillary Clinton, se dizendo horrizada com os massacres na Síria, no mesmo dia em que um daqueles drones ( avião não tripulado) americanos bombardeava um vilarejo no Paquistão e matava seis crianças? O ditador sírio e sua esposa inglesa (que se chama Asma), são campeões de cinismo. Aliás, ele tem cara de asmático mesmo. Deve ser por causa dela.
     E o primeiro ministro de Israel, dizendo-se preocupadíssimo com a possibilidade de que o Irã desenvolva armas nucleares e fazendo cara de paisagem quanto às armas nucleares que Israel tem há décadas, sem nenhum controle da Agencia Internacional de Energia Atômica?
          Vejo campanhas na TV todo dia para defender o meio ambiente, e todos dizem pra gente fechar as torneiras, mas na primeira baixa de IPI nossos ambientalistas correm às lojas pra comprar mais carros e entulhar o mundo de automóveis que vão acelerar o efeito estufa, num consumismo lascado, incentivado pelo governo para evitar a crise e salvar a economia brasileira. Daqui a pouco ninguém anda mais nas nossas cidades.
       E a Denise Lagarde, a diretora do FMI que resolveu condenar os gregos à morte, porque eles acreditaram na mentira da União Monetária como forma de estabilidade, agora diz que está preocupada com as crianças da África, como se o FMI alguma vez tivesse feito alguma coisa que não fosse pelos banqueiros nesse mundo.
     Mas no meio de tudo, ainda existem algumas vozes altaneiras, de gente que não tem medo de falar a verdade, mesmo que seja para prejudicar os seus. Nosso velho e querido senador Pedro Simon, foi à tribuna para denunciar o esquema que PT e PMDB (partido dele) estão montando para livrar os governadores de serem convocados pela CPI. O velho Simão é uma das poucas vozes que nos restam.
     Como dizem os personagens marajoaras daquela novelinha da Globo (pois é, eu assisto):
     Arre égua!
    
Rapidinhas

Lançamento em Conquista


     Dia 24 de maio, houve o lançamento do livro de minha autoria, Escola, Espaço e Discurso, como parte de um evento de iniciação científica na Fainor, Faculdade Inpendente do Nordeste, em Vitória da Conquista, na Bahia.
     O livro faz um cruzamento entre os discursos sobre a educação, construídos ao longo da história do Brasil, e os prédios escolares que resultaram dele, desde a colônia até o primeiro governo Lula. Está a venda no site http://www.biblioteca24horas.com/ e pode ser adquirido em meio eletrônico completo, por capítulos ou em papel.


A magia do dia 17


     Dia 17 de junho teremos o segundo turno das eleições na França, no Egito e uma nova eleição na Grécia. Todas as três eleições tem o potencial de moldar o século XXI. As européias pela mudança do eixo neoliberal para o do desenvolvimento sustentável, enterrando de vez as velhas políticas do FMI, e a do Egito porque vai balizar o futuro do Oriente Médio, libertando a região da influência de Israel, dos Estados Unidos e das monarquias feudais apoiadas por eles.
     O vencedor deve ser Mursi, o candidato da Irmandade Muçulmana, partido islâmico moderado que tem profunda penetração nas camadas mais pobres da sociedade, devido ao seu intenso trabalho social, desenvolvido há décadas, mesmo quando enfrentava a proibição total de suas atividades.
     Um Egito democrático tem o potencial de recuperar a força desse país, que é a maior economia da região e dono de uma cultura milenar. Assim como a China soube se levantar, também os egípcios podem conseguir fazê-lo e voltar a ser a grande nação que já foram um dia.

Situação da Cultura em Rio de Contas


     Uma imagem fala mais do que mil palavras!





D. Lucy


     Pois é, amigos leitores, acabo de perder minha mãe, D. Lucy, que faleceu neste domingo, dia 27 de maio, às 7,00 da manhã, aos 87 anos.
     Desde a morte de meu pai, há cinco anos, que ela vinha fazendo seu caminho de volta. Primeiro deixou de andar, depois começou a confundir as coisas, como se não quisesse ir mais a lugar algum, nem entender mais nada deste mundo.
     Fizemos tudo que foi possível para reanimá-la, mas ela não reagia. Não aguentou perder seu companheiro de 62 anos de vida em comum e se deixou simplesmente ir levando.
     Reformei sua casa, rodeei ela de netos e bisnetos, para que tivesse alegria e fiz o que pude para estar ao seu lado, apesar da minha vida fora de Brasília. Mas nada deteve sua marcha irremediável rumo ao desligamento desta vida.
     Lucy foi uma batalhadora incansável. Feminista, sempre incentivou as mulheres da família para que fossem independentes dos seus maridos (coisa que ela sempre foi) e se valorizassem, superando o papel de sombra dos homens e a imagem de objeto de consumo que a sociedade capitalista tenta criar em torno da figura feminina.
     Me lembro do jogo de estréia do Brasil na Copa de 94, nos Estados Unidos, em que passistas seminuas de escolas de samba, representaram o Brasil, e ela revoltada disse: porque a mulher brasileira tem de ser apresentada sempre deste jeito?
     D. Lucy foi funcionária concursada da Câmara dos Deputados, onde trabalhou por 30 anos e, lá, foi chefe das CPIs durante 15 anos, em plena ditadura militar. Até bomba tentaram colocar nos cofres que guardavam documentos sob sua responsabilidade, mas ela não se intimidava e enfrentava com igual coragem, as queixas dos deputados da Arena e do MDB, sempre em busca de conseguir vantagens que ela contestava com o regimento em mãos.
     Era figura respeitada por funcionários e parlamentares, devido ao seu trabalho árduo e absolutamente correto. Me falou que viu e soube de coisas muito sérias nas CPIs, mas quando eu pedia que ela contasse ou escrevesse sobre esses assuntos, ela desconversava. Não podia, era uma questão de ética, dizia.
     Iconoclasta, metodista anticlerical até sua meia idade, dizia que devia ter sido queimada nas fogueiras da igreja Católica pois não gostava de padres e do papa. Nunca tomou uma Coca-cola na vida. Dizia que não tomava aquilo que ela não podia saber o que continha.
     Com a maturidade se tornou Messiânica e perdeu o preconceito contra todas as igrejas. Entrava em qualquer uma, inclusive as católicas, e fazia suas orações.
     Foi uma mãe, avó e bisavó muito carinhosa e nos ajudou a todos na vida, tanto materialmente quanto moralmente, sempre ensinando o caminho correto.
     Não posso me queixar da sua partida. Fui um privilegiado em ter uma mulher forte e esclarecida como ela, no papel de mãe.
     Espero que ela agora encontre os que foram antes dela, meu pai, seu irmão e sua irmã, seus próprios pais e muitos outros.
     A vida passa tão depressa...logo nos encontraremos novamente.
     Um grande beijo minha mãe, que Deus te abençoe e guie nessa nova vida.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Rapidinhas
O trem de Cuiabá
     Interessante como a oposição muda seu foco de acordo com a situação, revelando um imenso oportunismo. Quando Cuiabá anunciou que construiria um corredor de ônibus para a Copa da Mundo, um BRT (Bus Rapid Transport), na sigla dos tecnocratas, a direita caiu de pau, dizendo que estavam gastando dinheiro à tôa com essas obras da copa, com aquela cantilena de que com essa verba daria pra construir não sei quantas escolas (como se o Brasil precisasse de mais prédios escolares) ou casas populares.
     Depois, quando o governo local resolveu mudar o projeto para um Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), que carrega muito mais gente, não polui e pode no futuro ser facilmente transformado num metrô, agora reclamam que não vai dar tempo pra ficar pronto para a Copa.
    Me parece que a decisão matogrossense é acertada, pois mira o futuro da cidade, muito além da Copa de 2014. Está, portanto, focada no interesse público e não nos interesses imediatistas da Fifa.
    Quanto às escolas, pra quem não sabe, a matrícula do ensino básico vem caindo nos últimos anos, devido à diminuição do crescimento populacional. Não precisamos de escolas novas, e sim de mais qualidade no ensino. Quanto a construir casas, o famoso déficit habitacional não passa de invenção do sinduscon (Sindicato da indústria da Construção Civil) para que o governo invista no setor, financiando as construtoras, pois o índice de imóveis fechados no Brasil é semelhante ao de famílias sem casa. O problema não está na falta de casas, mas na especulação imobiliária, promovida pelas próprias incorporadoras, que aumenta o preço dos imóveis levando à uma concentração da propriedade imobiliária.
     Não é à tôa que o DEM e o PSDB estão desaparecendo da cena política nacional, atropelados pelo trem do progresso planejado.

A Grécia lidera a rebelião contra a austeridade


     Depois do rotundo Não, que o povo grego deu aos acordos que o governo anterior da Grécia (socialistas e conservadores) fez com a Troika (Comissão Européia, Banco Central Europeu e FMI), não restou outra alternativa ao presidente grego a não ser convocar novas eleições, para o dia 17 de junho.
     O partido Syrisa, que a imprensa ocidental chama de ultra-esquerda, nada mais é do que um ajuntamento de movimentos alternativos, de novo tipo, que reflete a insatisfação do povo com a política criminosa imposta a eles, que os levou à miséria e ao desespero para salvar os bancos, responsáveis pela situação desastrosa da economia grega.
     O que o Syrisa propõe é simples: renegociar a dívida, em outros termos, sem sair do Euro. No fundo estão fazendo a mesma coisa que a Argentina fez em 2001 e que a levou a ter um dos maiores crescimentos da sua história, quando mandaram o FMI às favas.
     Os franceses também já deram seu recado nas urnas e agora os alemães inventaram um partido genial: o Partido Pirata. Nesse partido, os seus líderes não tem propostas fechadas, mas trabalham on-line levando ao parlamento as propostas que o povo faz através da internet. Democracia direta!
     Nas últimas eleições locais já alcançaram 8% do eleitorado, o que lhes garante a entrada no parlamento.
     Ninguém aguenta mais esses truques dos partidos tradicionais para transferir a riqueza dos trabalhadores para as instituições financeiras, tudo disfarçado de política econômica.
     Os gregos deram a partida, e muitas novidade vem por aí, apesar do terrorismo da mídia e da direita, que já está ameaçando os eleitores gregos com o caos, caso a esquerda vença. Mas para o povo grego o caos já foi instalado, justamente pela troika e seu modelo de austeridade.

Falta um!

     O ex-chefe militar dos sérvios da Bósnia, Ratko Mladic começou a ser julgado pelo Tribunal Penal Internacional. Também o ex-presidente da Libéria, país africano, Charles Taylor, vai ser julgado, ambos por genocídios em guerras absurdas. Acho muito bom que esses "líderes" paguem por seus crimes contra a humanidade. Mas e o ex-presidente Geoge Bush que matou mais de 200.000 civis iraquianos, com a desculpa mentirosa de procurar armas de destruição em massa, quando vai ser julgado?

Lançamento

     Dia 24 de maio, às 19,00 horas, haverá o lançamento oficial do livro Escola, Espaço e Discurso, de minha autoria, na Fainor, em Vitória da Conquista.
     Embora o livro já esteja à venda, de forma virtual, este será o primeiro lançamento em papel, com sessão de autógrafos e a presença do autor.
     Na mesma ocasião também serão lançados também os livros; Panorama para o Administrador e o Gestor Contábil na Contemporaneidade, de  Alexandre Alcantara da Silva; e Elementos Para Teoria Geral do Processo, de Benedito Mamédio, ambos professores da Fainor.
O que é isto?

     Pesquisando sobre São Gabriel da Cachoeira, cidade do extremo noroeste do Brasil, proxima à fronteira da Colômbia, me deparei com a notícia de que, em 2009, um estranho ser, metade homem, metade animal, foi morto por habitantes locais. A foto é muito impressionante e não sei se é uma montagem, por isso prefiro não publicá-la, mas coloco aqui o link para quem quiser ver o bicho, que alguns dizem ser um lobisomem e outros o lendário curupira. A imagem é muito impressionante.
     Amazônia




Aproveitando o tema amazônico, publico hoje a poesia de Manoel de Andrade, intitulada Amazônia.
Antes da pátria, eras úmida promessa…
semente primordial
árvore mãe
planta continental
arvoredo, floresta, selva palpitante.
Hoje canto tua vertical beleza
o mogno gigantesco, sua estatura secular
seu colossal diâmetro
canto essa caudalosa geografia
essa multidão de vidas que sustentas
canto o itinerário sazonal da seiva
e essa infinita linfa…
parto de infinitas criaturas.
Canto teu verde planetário
e no teu imenso respirar,
canto o nosso pão de oxigênio…
Canto a ti… Amazônia
bosque inquietante da esperança…
e eis porque denuncio esse machado cruel sobre teu peito…
essa fruta milenar, dia a dia devorada.
Antes da grande nação…já eras tu…
a nação primogênita
filha dos filhos da mata.
A infância da pátria foste tu,
sílaba aborígine, idioma tupi
cerâmica, canoa e tacape
ritual, dança e canção.
Foste tu a raiz, sangue ameríndio
o parto da nacionalidade.
Hoje canto os povos da floresta
e o desencanto dessa memória esquecida.
Falo de sobreviventes
de tribos desgarradas
de aldeias tristes
de sonhos desmatados
de segredos e tradições pirateadas
das águas lavadas na bateia do mercúrio.
Amazônia….Amazônia…
quem deterá o teu martírio
uma vida tão diversa num adverso viver…
Falo dos teus hectares de sangue
da lâmina cruel, da pira ardente
dessa cartilha de serras, rifles e archotes
dessa morte plural
na diversidade de aves e primatas
roedores, felinos e serpentes.
Falo de uma terra de cepos
de raízes degoladas
de caules retalhados
de castanheiras preservadas… a morrer de solidão.
Falo da linha negra do fogo
e desse cemitério de troncos defumados.
Falo da floresta sitiada
por uma legião de máquinas assassinas
falo de estradas e picadas clandestinas
de súbitas clareiras
desse assalto interminável… lento e invisível.
Falo de grileiros, posseiros, garimpeiros, bandoleiros
e de terras demarcadas sob a mira das pistolas.
Falo de dragas e crateras
das águas manchadas e dos rios estropiados.
Falo da vida degradada pelas pastagens da ambição.
Amazônia…Amazônia…
com que verde vestiremos nosso mapa
acuados pelo apetite voraz das motosserras,
por uma fronteira incinerante que avança insaciável.
Acuados pelo gatilho mercenário da violência
e pelo estigma oficial da impunidade.
Passo a passo e esse avizinhar-se do colapso…
quantos fóruns se abrirão para “resolver” essa tragédia!?
Crimes silenciados na cumplicidade regional dos gabinetes…
gritos sem eco nas vozes da omissão…
acenos sem resposta nos protocolos renegados…
e o poder dos maiorais contra tudo o que respira.

domingo, 13 de maio de 2012

Rapidinhas

Viva Hollande

     Enfim a velha Europa se levanta contra os absurdos praticados pela troika (Comissão Européia, Banco Central Europeu e FMI) para impor um ajuste fiscal criminoso, que premia os bancos, responsáveis pela crise, e penaliza os trabalhadores, que não tem culpa nenhuma no cartório.
     O "ajuste" grego foi tão grave que provocou uma onda de suicídios no país.
     Os dois partidos que o promoveram, e que detinham 77% dos votos, caíram para 32%. O povo deu sua resposta nas urnas.
     Mas a resposta mais significativa foi a eleição de François Hollande, na França, despertando a esquerda européia de uma letargia que já durava anos. Agora uma onda de esquerda deve varrer os governos conservadores e formar uma nova maioria, que leve a Europa para o caminho de um crescimento sustentável.
     A festa da vitória na Praça da Bastilha foi linda. Vive la France!

13 de maio

     Há 124 anos a primeira mulher a governar o Brasil (embora interinamente), assinava a lei que abolia a escravidão no Brasil, a abominável instituição, tão comum na antiguidade, e que se prolongou absurdamente no nosso país.
     Ser escravo não era apenas uma condição, em que grande parte da humanidade se via forçada a viver, era também um estigma, transmitido de geração para geração, como se a vítima também fosse culpada pelo seu infortúnio, pois aos escravizadores era preciso "justificar" para si mesmo e para a sociedade, que outro ser humano fosse tratado como animal ou como mercadoria.
     Para isso nada melhor do que escolher pessoas de etnia diferente, que pudessem ser facilmente reconhecidas como estrangeiros, e portanto "diferentes".
     Assim os árabes preferiam os nórdicos, ingleses ou finlandeses, e posteriormente (quando conseguiram domesticar o camelo para atravessar o grande deserto), os negros da África subsaariana.
     Também os próprios reinos africanos, tratavam de escravizar povos distantes, para evitar que suas vítimas fugissem de volta para suas comunidades. O escravo era, de preferência, um estrangeiro, retirado à força de suas raízes e levado para uma cultura diferente, onde se via isolado, sem família, numa terra diferente, tendo que aprender uma língua diferente, de forma a ficar completamente à mercê de seus dominadores.
     "A esse estrangeiro absoluto, busca a comunidade dominante aviltar, despersonalizar, infantilizar e despir de todas as relações grupais. E é o fato de ser um estranho, que perdeu a família, a vizinhança, os amigos, a pátria e a língua, e a quem se nega um passado e um futuro, o que permite a sua redução de pessoa a algo que pode ser possuído" (A Manilha e o Libambo - A África e a Escravidão de 1500 a 1700 - Alberto da Costa e Silva - Editora Nova Fronteira 2011).
     Até hoje, grande parte dos nossos problemas sociais são derivados da longevidade dessa terrível prática. É significativo que tantos anos depois, quando o Estado brasileiro se preocupa minimamente em compensar os descendentes das vítimas desta instituição, e no momento em que o Brasil é governado por outra mulher e o dia 13 de maio coincide com um dia das mães, ainda exista gente que tente questionar as políticas de cotas nas universidades.

Orações

     Em homenagem ao dia das mães, quero agradecer a todos aqueles que fizeram e continuam fazendo orações por minha mãe, D. Lucy, que segue lutando por sua recuperação na UTI do hospital Santa Luzia, em Brasília.
     Ela tem dado uma lição de força e coragem ao enfrentar seu tratamento para superar uma trombose no braço esquerdo e uma pneumonia, com uma consequente insuficiência respiratória.
     Contra todas as expectativas iniciais ela vem se recuperando bem, graças também a toda essa corrente de pensamentos positivos e aos cuidados da excelente equipe de médicos  e enfermeiros.
     Obrigado a todos.
 Cora Coralina
      
     E por falar em mães, deixo hoje para vocês a poesia de Cora Coralina, esta fantástica goiana que encantou o Brasil ao ser revelada já em idade avançada, com sua poesia de mulher vivida, plena de humanidade. 
     Sua poesia fala da mãe de todos nós, a Terra.

O Cântico da Terra

Eu sou a terra, eu sou a vida.
Do meu barro primeiro veio o homem.
De mim veio a mulher e veio o amor.
Veio a árvore, veio a fonte.
Vem o fruto e vem a flor.
Eu sou a fonte original de toda vida.
Sou o chão que se prende à tua casa.
Sou a telha da coberta de teu lar.
A mina constante de teu poço.
Sou a espiga generosa de teu gado
e certeza tranqüila ao teu esforço.
Sou a razão de tua vida.
De mim vieste pela mão do Criador,
e a mim tu voltarás no fim da lida.
Só em mim acharás descanso e Paz.
Eu sou a grande Mãe Universal.
Tua filha, tua noiva e desposada.
A mulher e o ventre que fecundas.
Sou a gleba, a gestação, eu sou o amor.
A ti, ó lavrador, tudo quanto é meu.
Teu arado, tua foice, teu machado.
O berço pequenino de teu filho.
O algodão de tua veste
e o pão de tua casa.
E um dia bem distante
a mim tu voltarás.
E no canteiro materno de meu seio
tranqüilo dormirás.
Plantemos a roça.
Lavremos a gleba.
Cuidemos do ninho,
do gado e da tulha.
Fartura teremos
e donos de sítio
felizes seremos.



Professores em Greve

     A greve dos professores estaduais da Bahia vai entrando numa escalada de confronto absolutamente desnecessária. A recusa do governador Jaques Wagner em negociar com a categoria é uma estratégia burra, para ser gentil. Ele, um sindicalista de origem, não soube honrar o compromisso assumido com a categoria em 2011 e agora quer vencer pela força, se negando a negociar a única coisa que precisa ser negociada: o cumprimento do acordo assinado pelo seu governo.
     A educação na Bahia já sofreu demais, já foi descaracterizada demais, ja foi relegada a segundo ou terceiro plano, por tempo demais.
     Como fazer o Estado crescer e criar uma sociedade rica e desenvolvida, sem investir na valorização da educação? Porque um professor com curso superior, tem que se conformar em ganhar tão pouco? E os discursos eleitorais sobre educação, onde foram parar?
     Infelizmente o governo Wagner está cada vez mais parecido com o de ACM, com suas propagandas entusiásticas na TV, conjugadas com o autoritarismo e o desprezo pelas instâncias organizadas do povo baiano. Onde está a mudança prometida?
     Para me solidarizar com os professores em greve, transcrevo abaixo um texto de autoria de José Luis Peixoto, um caboverdiano, que tirei do blog Café Margoso, no qual introduzi algumas modificações para adaptá-lo ao nosso português e à nossa realidade.
Esperança
     "O mundo não nasceu conosco. Essa ligeira ilusão é mais um sinal da imperfeição que nos cobre os sentidos. Chegamos num dia que não recordamos, mas que celebramos anualmente; depois, pouco a pouco, a neblina foi-se desfazendo nos objetos até que, por fim, conseguimos reconhecer-nos ao espelho. Nessa idade, não sabíamos o suficiente para percebermos que não sabíamos nada. Foi então que chegaram os professores. Traziam todo o conhecimento do mundo que nos antecedeu. Lançaram-se na tarefa de nos actualizar com o presente da nossa espécie e da nossa civilização. Essa tarefa, sabemo-lo hoje, é infinita.
     O material que é trabalhado pelos professores não pode ser quantificado. Não há números ou casas decimais com suficiente precisão para medi-lo. A falta de quantificação não é culpa dos assuntos inquantificáveis, é culpa do nosso desejo de quantificar tudo. Os professores não vendem o material que trabalham, oferecem-no. Nós, com o tempo, com os anos, com a distância entre nós e nós, somos levados a acreditar que aquilo que os professores nos deram nos pertenceu desde sempre. Mais do que acharmos que esse material é nosso, achamos que nós próprios somos esse material. Por ironia ou capricho, é nesse momento que o trabalho dos professores se efetiva. O trabalho dos professores é a generosidade.
     Basta um esforço mínimo da memória, basta um plim pequenino de gratidão para nos apercebermos do quanto devemos aos professores. Devemos-lhes muito daquilo que somos, devemos-lhes muito de tudo. Há algo de definitivo e eterno nessa missão, nesse verbo que é transmitido de geração em geração, ensinado. Com as suas pastas, os seus automóveis com cadeirinha para os filhos no banco de trás, os professores de hoje são iguais de ontem. O ato que praticam é igual ao que foi exercido por outros professores, com outros penteados, que existiram há séculos ou há décadas. O conhecimento que enche as páginas dos manuais aumentou e mudou, mas a essência daquilo que os professores fazem, mantém-se. Essência, essa palavra que os professores recordam ciclicamente, essa mesma palavra que tendemos a esquecer.
     Um ataque contra os professores é sempre um ataque contra nós próprios, contra o nosso futuro.  
     Resistindo, os professores, pela sua prática, são os guardiões da esperança. Vemo-los a dar forma e sentido à esperança de crianças e de jovens, aceitamos essa evidência, mas falhamos ao não perceber que são também eles que mantêm viva a esperança de que todos necessitamos para existir, para respirar, para estarmos vivos. Ai da sociedade que perdeu a esperança. Quem não tem esperança não está vivo. Mesmo que ainda respire, já morreu.
     Envergonhem-se aqueles que dizem ter perdido a esperança. Envergonhem-se aqueles que dizem que não vale a pena lutar. Quando as dificuldades são maiores é quando o esforço para ultrapassá-las deve ser mais intenso. Sabemos que estamos aqui, o sangue atravessa-nos o corpo. Nascemos num dia em que quase nos pareceu ter nascido o mundo inteiro. Temos a graça de uma voz, podemos usá-la para exprimir todo o entendimento do que significa estar aqui, nesta posição. Em anos de aulas teóricas, aulas práticas, no laboratório, no ginásio, em visitas de estudo, sumários escritos no quadro no início da aula, os professores ensinaram-nos que existe vida para lá das certezas rígidas, opacas, que nos queiram apresentar. Se desligarmos a televisão por um instante, chegaremos facilmente à conclusão que, como nas aulas de matemática ou de filosofia, não há problemas que disponham de uma única solução. Da mesma maneira, não há fatalidades que não possam ser questionadas. É ao fazê-lo que se pensa e se encontra soluções.
     Recusar a educação é recusar o desenvolvimento.
    Se nos conseguirem convencer a desistir de deixar um mundo melhor do que aquele que encontramos, o erro não será tanto daqueles que forem capazes de nos roubar uma aspiração tão fundamental, o erro primeiro será nosso por termos deixado que nos roubem a capacidade de sonhar, a ambição, metade da humanidade que recebemos dos nossos pais e dos nossos avós. Mas espero que não, acredito que não, não esquecemos a lição que aprendemos e que continuamos a aprender todos os dias com os professores. Tenho esperança."
José Luís Peixoto

domingo, 6 de maio de 2012

Rapidinhas

Um Brizola no Ministério
     A presidente Dilma continua mexendo no vespeiro da política, trazendo à tôna novas lideranças que sejam capazes de renovar o cenário, superando a velha prática de negociar com gente que se apropriou dos partidos para fazer barganhas em nome de interesses particulares.
     Ao ungir Brizola Neto como Ministro do Trabalho, ela o alçou à liderança do PDT, partido à que ela já pertenceu, reforçando uma sigla histórica que andava capenga depois das trapalhadas do ex-ministro Lupi e reforçando a base aliada com sangue novo.
     Depois dizem que ela não tem habilidade política. Não tem, decerto, para praticar o velho "é dando que se recebe", fonte de tanta corrupção e que foi prática nos últimos governos. Dilma exerce sua liderança com grande energia, usando seu carisma e popularidade para colocar a política nos trilhos.
     O velho Leonel deve estar orgulhoso lá em cima.

Fim de uma injustiça


     A decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a reserva Caramurú, no sul da Bahia, foi apenas uma questão de justiça. Trata-se de uma das reservas indígenas mais antigas do Brasil, formalizada em lei e demarcada pelo governo federal em 1938, e que havia sido presenteada por Antonio Carlos Magalhães a seus amigos e correligionários, na época da ditadura.
     Há décadas os índios vinham lutando para recuperá-la. Estive lá, em visita, em 1988, quando eles recuperaram as primeiras fazendas, logo após a Constituinte. Eram poucas as fazendas retomadas, as piores, onde não havia água. Mas os índios não desistiram e foram consolidando a reconquista de sua reserva, usurpada pelo "pequeno ditador" da Bahia.
     O chocante nessa história não é a arrogância de ACM, conhecida de todos, mas a maneira como a mídia trata o assunto, como se os índios estivessem roubando a terra dos fazendeiros, quando o ocorrido foi justamente o contrário. Ou seja, para o PIG (Partido da Imprensa Golpista), o direito de propriedade é apenas para os ricos. Quando a propriedade pertence a grupos minoritários, que não estão incluídos na sua lógica de mercado, ele não existe ou pode ser desrespeitado.
    Parabéns ao STF, que repôs as coisas no seu devido lugar.

Amigo é coisa pra se guardar...

 
     No lado esquerdo do peito, como dizia Milton Nascimento.      
     Em recente viagem ao Espírito Santo, reencontrei meu velho amigo Juca, que eu não via há uns 20 anos. Tudo graças a Odete, outra amiga e ex-colega de trabalho no Ministério da Educação, que o localizou para mim. Juca e eu nos conhecemos em Santiago do Chile, em 1972. Ele tinha 17 e eu 21, no tempo de Salvador Allende. Eu tinha ido para o Chile estudar arquitetura, fugindo da opressão da ditadura brasileira. Ele era filho de um exilado.
     Ficamos muito amigos e compartilhamos muitas experiências de vida durante aquele período, até que o golpe veio e me pegou viajando ao Brasil enquanto ele teve que ir exilado para a Suécia, onde fui visitá-lo.
     Depois disso nos vimos algumas vezes por aí, pela vida.
     Tempos depois, Juca sofreu acusações pesadas, quando era Deputado Estadual pelo Espírito Santo, fato que foi amplamente divulgado pela imprensa local e até nacional. No nosso reencontro, em longa conversa, se queixou de que foi vítima de fraudes e disse que foi inocentado de todas as acusações, mas que isso não saiu na imprensa. Ou seja, na hora de acusar a imprensa faz um espalhafato, mas na hora de inocentar silencia. Escândalo vende mais jornais do que reparação de injustiças, não é?
     Foi muito bom reencontrar com ele e ouvir dele mesmo as explicações para essas acusações tão graves.
     Coisa boa ter amigos deste quilate, do tipo que a gente passa décadas sem ver e não muda nada.
     Valeu a viagem à Vitória para ver esses dois.

Menelau e os Homens

    












     Recebi convite de Dênisson Padilha Filho, ex-Secretário de Cultura de Rio de Contas (pois é, Rio de Contas já teve um Secretário de Cultura), para o lançamento de seu novo livro; Menelau e os Homens, em Feira de Santana, dentro do evento; Celebração da Cultura dos Sertões, no Centro de Cultura Amélio Amorim, dia 08 de maio às 18,00 h. Vale a pena conferir.


Salif Këita

     A viagem a Cabo Verde me abriu as portas do riquíssimo universo musical africano, que não chega ao nosso "mercado", entulhado das porcarias que a Som Livre nos empurra.    
     O extraordinário músico do Mali, Salif Këita, canta com Cesária Évora a música Yamore. Ele canta primeiro na sua língua natal (que eu não identifico) e depois Cesária canta em Crioulo, o dialeto caboverdiano, derivado do português. A tradução em português da primeira parte está logo abaixo. O original segue depois. A letra fala das guerras e da esperança num mundo de paz. O link para ouvir está no final.

Yamore
Eu tenho fé, sim eu tenho fé
Que iremos viver sem medo
e confiar numa era mais risonha.
O olhar de nossas crianças
irá voltar a brilhar de inocência.
E entre suas gritarias o temporal talvez se acalme.
Na brandura e calmaria, nosso amor irá descansar
Dessa luta e resistência, para sobreviver na tormenta

Je t'aime mi amoré menebêff fie
Ene le arabylyla to much
Namafiye, namafiye guni yerela ba namafiye Niere a ná nifon
Ye namo kofue nerum silê don kile le, ina kola ahaha
Rile enela munuku mo sô
Nienama kofiye, soro falê é mo sonho mana osi koté
Nanana nekona, dê i lêlê fon
Je t'aime mi amoré menebêff fie Nê comf fop ach ari
Ene le arabylyla to much Xurin né bi feu J t'aim

Un tem fé, si un tem fê
No também viver sem medo e confians
Num era mais bisonho
Olhar de nos criança ta a tornar brilhar de inocença
E na mente CE esvitayada
Temporal talvez ta mainar
Na brandura y calmaria
Nosso amor ta vins cansando
De ser luta e resitencia
Pa sobreviver nas tormenta
Na brandura y calmaria
Nosso amor ta vins cansando
De ser luta e resitencia
Pa sobreviver nas tormenta


Je t'aime mi amoré menebêff fie Boi nhat zefiu, ermãos
Ene le arabylyla to much Boi etud nhiafieu , la paz
Xeritava pá, beru kuyê mobiliko yoi nhÊ
Ahaha rilê ene La munuku mo sô
In deburu ieu kordaine
Sank é noite a namo a cantor
Ê enela mulnuku mo sol
Yo sakenem mo sol
Un tem fé, si un tem fê
No também viver sem medo e confians
Num era mais bisonho
Olhar de nos criança ta a tornar brilhar de inocença
E na mente CE esvitayada
Temporal talvez ta mainar

http://www.youtube.com/watch?v=9VVa-GyhJek
Correntes antidemocráticas

     Pois é, amigos leitores, a gente sabe que tem de tudo na internet, mas fico impressionado com a constância dessas campanhas contra o Congresso Nacional e os políticos, colocando-os, todos, numa grande panela de corruptos e fazendo correntes com propostas para acabar com seus salários e os salários dos servidores públicos, como se fossem todos inimigos da nação.
     É claro que muitos políticos que andam por aí dão asa para esse tipo de campanha, e aí está o senador Demóstenes Torres para provar. Ele era um dos que mais falavam contra a corrupção e está envolvido até o pescoço com o tal Carlinhos Cachoeira, que resolveu invadir o Estado brasileiro, colocando-o à serviço dos seus interesses escusos.
     Nas prefeituras, então, a coisa é feia. Não há Controladoria Geral da União (e o baiano Jorge Hage é um bom controlador), que dê conta de todas as falcatruas em mais de 5.500 municípios, já que a justiça é muito lerda neste país e também muito sujeita aos corruptos.
     Mas as campanhas que eu recebo não são contra os corruptos, são contra o Congresso Nacional, como se ele fosse uma coisa inútil e devesse ser fechado.
     Semana passada recebi uma que dizia que o Congresso não iria aprovar a Lei da Ficha Limpa. Tive que avisar a pessoa que me enviou (ou melhor, reenviou), de que essa lei já havia sido aprovada há muito tempo pelo Congresso.
     Esta semana recebi outra (que já recebera antes várias vezes), dizendo que o Congresso estava prestes a extinguir o salário mínimo e o direito às férias remuneradas para todos os trabalhadores brasileiros. É claro que não existe tal projeto de lei.
     Lá vou eu de novo avisar a pessoa que me mandou de que tenha cuidado com o que repassa.
     Aquele e-mail de Roraima, dizendo que na reserva indígena de lá só podem entrar americanos e os brasileiros estão proibidos, etc e tal, é muito antigo e continua circulando. Pura invenção.
     Mas tem gente que parece não ter o que fazer e se elege a consciência do mundo via internet, achando que estão fazendo uma revolução moralizadora enchendo as caixas dos outros com mensagens alarmistas, sobre possíveis golpes, sobre comidas que fazem mal, correntes religiosas e outras bobagens. Um saco!
     São justamente esses que mais repassam esses e-mails contra o Congresso, que mal ou bem é a nossa representação política. Ruim com ele, pior sem ele. Já tivemos 21 de ditadura militar para saber disso.
     Hoje mesmo recebi um novo power-point falando sobre uma proposta de dois advogados gaúchos para reduzir as mordomias dos senadores e diminuir os salários dos servidores do Senado.
     Concordo que os senadores tem mordomias demais. Um carro para cada um, com motorista, é um luxo muito caro. Mas passagens aéreas para os seus Estados de origem são uma necessidade, assim como franquia para correspondências e telefonemas. Se eles fossem pagar dos seus próprios bolsos todas as despesas que a função de senador exige para representar seu Estado, não ia sobrar nada.
     Além disso, Senador é um cargo de prestígio, de fim de carreira para políticos, precisa ser bem pago. O que precisa mudar é a escolha dos suplentes, que não são eleitos pelo povo.
     Mas vá lá que possamos reduzir as despesas com eles. Mas rebaixar salários de servidores públicos? Porque um funcionário concursado não pode ganhar bem? Porque ninguém reclama dos salários dos juízes e dos servidores do judiciário? Só essa eterna campanha contra o poder legislativo? Porque não reclamam dos lucros exorbitantes dos bancos, com suas taxas absurdas e juros altísssimos? Só os parlamentares é que são culpados de tudo?
     Nos Estados Unidos o povo faz campanha contra os altos salários dos executivos das empresas que foram ajudadas pelo governo deles. Aqui ninguém toca no assunto. Todo mundo acha normal um jogador de futebol ganhar um milhão por mês, mas é um absurdo um funcionário do Congresso ganhar bem.
     Mas nesse power-point que recebi hoje, uma frase final levantava uma pontinha desse véu, quando dizia que era preciso moralizar o Congresso, caso contrário corríamos o risco de cair sob um regime socialista ditatorial.
     Vejam só, ressuscitaram a velha cantilena do perigo comunista  para justificarem a campanha contra o Congresso. Essa pegada é muito conhecida. É gente saudosa da ditadura, a velha direita que se esconde sob essas campanhas moralizadoras que a classe média adora e que já ajudaram a eleger Jânio Quadros, com sua vassoura que iria limpar a corrupção, e Fernando Collor, o caçador de marajás, dois políticos com passagem trágicômica pela Presidencia da República.
     Com certeza esses moralistas da internet são os que votam na direita, nos Demóstenes Torres, nos Marcondes Perilo e outros defensores do "mercado". É claro que muita gente bem intencionada vai na onda, achando que está prestando um serviço à nação. Mas é preciso ter cuidado com essas correntes antidemocráticas, cujo único objetivo é indispor o povo contra a democracia para permitir a volta de um regime de excessão, onde os corruptos, aí sim, nadam de braçada.
     O pior legado de uma ditadura é justamente a destruição dos controles democráticos sobre o poder político e econômico. Desde 1988 que esses controles vem sendo reconstruídos lentamente pela sociedade brasileira, que tem avançado muito nesse sentido. Falta fazer muito, é verdade, mas acabar com o Congresso seria um gigantesco passo para trás.